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Festival do Rio assiste ao cordel de Alceu Valença

Cantor estreia como cineasta com ‘A Luneta do Tempo’, uma ‘ópera do cangaço’

Por Flávia Ribeiro
27 set 2014, 19h24

Quando o pai morreu, em 1999, Alceu Valença chegou à cidade natal, São Bento do Una (Pernambuco), e deu de cara com a roupa de cangaceiro que usou quando fez Lampião na novela Mandacaru, da extinta TV Manchete, que ele havia deixado lá. A partir dali, memórias começaram a possuí-lo. O verbo não é exagerado. “Eu fui tomado pelo que vivi e pelo que meus pais e avós me contaram. Por histórias de cangaço, palhaços, circo. Comecei a escrever sem parar, coisas desconexas, delírios. Acordava de madrugada, falando, e minha mulher se assustava: ‘Alceu, o que houve?’. Eu respondia: ‘Eles estão falando comigo!'”, conta o cantor, compositor e agora cineasta de 68 anos, referindo-se a seus personagens. Ele chegou a sair pelas ruas de São Bento do Una, vestido de cangaceiro, recitando o seu cordel. “No meu delírio, eu achava que todo o povo da cidade estava participando daquilo. E eles achavam que eu estava louco”, conta.

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Agora, 15 anos depois, o cordel que Alceu escrevia obsessivamente se transformou no musical A Luneta do Tempo, que teve sessão no Festival do Rio neste sábado e volta a ser exibido no dia 3 de outubro, às 20h, no Ponto Cine. A aventura cinematográfica do músico começou meses depois da morte do pai. O cantor foi a um show no Teatro Rival, no Rio, e, ao encontra-lo, o fotógrafo Walter Carvalho quis saber que bando de papéis e guardanapos eram aqueles em sua mão. Alceu explicou que eram parte da história que estava criando, parte que havia acabado de escrever em um bar próximo. Walter leu e vaticinou: “Isso aqui é cinema!”.

O cantor saiu do teatro direto para uma livraria, onde comprou diversos livros sobre cinema. Nem dormiu naquela noite, rearrumando o que já tinha escrito em forma de roteiro. Ele e Walter, que seria o diretor, inscreveram o projeto na Agência Nacional do Cinema (Ancine), mas não conseguiram captar dinheiro. Nos quatro anos seguintes, Alceu continuou a trabalhar na história. “Nesse meio tempo, o Walter foi dirigir Budapeste e o cabra da peste aqui ficou só. Assumi a direção, também.”

Alceu conta tudo isso de pé, andando de um lado para o outro e, entre uma resposta e outra, declamando partes do seu roteiro em forma de cordel. Lembra que sua infância foi intimamente ligada ao cinema, já que sua mãe inclusive montava produções caseiras de cinema de sombras. Na adolescência, diziam que ele se parecia com o astro francês Jean-Paul Belmondo, o que foi uma massagem no ego. “Eu era cheio de complexos, porque me achava feio. Mas, depois do Belmondo, nunca mais tive problemas para arrumar namorada”, ri. Mas se desligou dos filmes depois que virou músico.

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“Quando decidi dirigir A Luneta do Tempo, encontrei uma amiga do meu filho que havia estudado cinema em Los Angeles. Pedi a ela umas aulas, mas parei depois da décima. ‘Chega de aula. Eu precisava saber um pouco, mas não quero saber mais, para poder fazer algo que é só meu’, eu disse. Comecei a ver todos os filmes brasileiros no Canal Brasil. Vi Cinema, Aspirinas e Urubus e O Céu de Suely, chamei a Hermila Guedes para ser minha Maria Bonita. Vi Baixio das Bestas, chamei Irandhir Santos para ser o Lampião. Olhei pro meu filho e disse que ele ia ser o Nagib, dono do circo. O caseiro do sítio do meu pai tem outro papel, a mulher dele…”, conta Alceu, que também interpreta um papel: o do palhaço.

O filme foi rodado em dois períodos, em 2009 e 2011. A maior parte foi gravada no agreste pernambucano, com uma equipe de profissionais de Pernambuco, Rio de Janeiro, São Paulo, Bahia e Minas Gerais. “É totalmente brazuca. Acho que a gente pode fazer coisas muito mais parecidas com a gente. É um musical, mas não é Broadway. É ópera, mas não italiana. É ópera nordestina, um cordel operístico, dramático, uma tragédia na qual se pergunta o que é o Estado, o que é o poder, o que é o tempo”, diz Alceu. A previsão de lançamento em circuito é para 2015 e, junto com o filme, chegará às livrarias o livro Por trás da Luneta, do jornalista Júlio Moura, que conta os bastidores das filmagens. Com Alceu à frente, histórias saborosas não vão faltar.

Festival — Até o próximo dia 8 de outubro, o Festival do Rio vai exibir cerca de 350 filmes, de mais de 60 países. Os filmes estão divididos em 21 mostras, entre elas: Panorama, Expectativa 2014, Première Latina, Fronteiras, Midnight, Filme Doc, Geração, Itinerários Únicos e Meio Ambiente. Na Première Brasil, a principal, serão 41 longas e 28 curtas, entre documentários e ficção. Eles concorrem ao Troféu Redentor, eleito por voto popular e pelo júri oficial, composto pela atriz Malu Mader, a produtora Andrea Barata Ribeiro, o roteirista italiano Maurizio Braucci e o produtor britânico Mike Downey e presidido pelo diretor brasileiro Karim Aïnouz.

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