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Diretores de ‘Intocáveis’ voltam a misturar drama e humor em filme sobre imigração

Os franceses Olivier Nakache e Eric Toledano falam sobre seu novo longa, ‘Samba’, também estrelado pelo ator Omar Sy

Por Raquel Carneiro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 11 jun 2015, 17h06

“Vai ser difícil traduzir o nome deste filme para o Brasil”, brincam os diretores franceses Olivier Nakache e Eric Toledano, durante a coletiva de imprensa do Festival Varilux, em São Paulo, sobre seu novo longa, Samba. Ao contrário do que se pode imaginar, o título não está ligado ao ritmo da dança tão conhecida dos brasileiros, mas sim ao nome do protagonista Samba Cissé, um senegalês que vive na França há dez anos interpretado por Omar Sy. Este é o primeiro filme de Nakache e Toledano desde Intocáveis (2011), comédia que se tornou a produção francesa mais vista no Brasil, com mais de 1 milhão de espectadores. O longa também marca o retorno da parceria com o ator francês, descoberto pela dupla de cineastas e que agora conquista espaço em Hollywood – Sy entra em cartaz esta semana com Jurassic World, após atuar em X-Men: Dias de um Futuro Esquecido (2014). “Tivemos de deixá-lo alçar voo”, dizem os cineastas em entrevista ao site de VEJA.

Na trama, em cartaz nas cinquenta cidades que recebem o Festival Varilux de Cinema Francês, Samba é pego pela polícia como imigrante ilegal e notificado para deixar o território francês. Ele recebe a ajuda de uma ONG, que tenta advogar pela sua estadia no país. Entre as pessoas que buscam mantê-lo ali está Alice (Charlotte Gainsbourg), voluntária que tirou licença de seu trabalho após passar por uma crise de ansiedade.

Como é costume dos diretores, o tema sério é tratado com respeito e leveza, sem exageros dramáticos, muito menos leviandade. E se o título do filme não está diretamente ligado ao Brasil, outros elementos da trama estão. Fãs de música brasileira, os cineastas fizeram questão de colocar na trilha sonora canções de MPB, além da criação de um personagem árabe, que se finge de brasileiro para conquistar empregos e mulheres com mais facilidade. “Decidimos brincar com o clichê do brasileiro para os franceses”, diz Toledano.

Desde os anos 1990 os senhores fazem filmes juntos. Por que decidiram pela parceria?

Olivier Nakache – Existe uma química em nosso trabalho. Não há uma explicação exata. Simplesmente funciona. Temos o mesmo ponto de vista, as mesmas ideias, queremos falar de temas importantes, mas com a comédia. Já trabalhamos juntos há 20 anos, sem brigas, sem problemas. Então planejamos continuar.

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O ator Omar Sy é um nome constante em suas produções. Ele também faz parte da parceria?

Eric Toledano – Também conhecemos Omar nos anos 1990. Ele tinha um programa de TV, de cerca de cinco minutos, em que fazia esquetes de humor. Percebemos que ele era muito talentoso, poderoso e atraente, mas ele não se sentia assim. Convidamos Omar para um filme e ele disse que não se sentia um ator de cinema. Tentamos convencê-lo a acreditar em si mesmo. Essa ficha só caiu para ele depois de ganhar o César, o Oscar da França, em 2012 com Intocáveis. Então temos uma boa história juntos. Quando estamos nós três, o ritmo do trabalho flui, com improvisação e sintonia. Queremos fazer com que as pessoas sintam um caminhão de emoções, e Omar consegue isso.

Os diretores Olivier Nakache e Eric Toledano e o ator Omar Sy
Os diretores Olivier Nakache e Eric Toledano e o ator Omar Sy (VEJA)

Depois de Intocáveis, Omar Sy passou a fazer filmes em Hollywood. Isso vai atrapalhar a parceria com os senhores?

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Toledano – Ele é nosso embaixador. Embaixador do que sentimos e pensamos. Mas, realmente, agora teremos que mudar de representante. Esta é a vida no cinema. Fizemos muito por ele e agora ele está em Hollywood. Temos que deixá-lo alçar voo. Ele voltará a trabalhar conosco em alguns anos, mas por enquanto teremos que produzir sem ele.

Assim como no Brasil, o cinema francês é produtor de muitos títulos cômicos, que também são altamente criticados. Acreditam que a visibilidade e respeito em relação ao gênero têm mudado?

Toledano – Por muito tempo na França a comédia era tratada como não sendo cinema de verdade. Agora as coisas mudaram. Surgiram cineastas, como nós, que decidiram tratar temas profundos, verdadeiros e sérios com tom cômico. Falamos de dificuldades sociais. Mostramos a vida de um rapaz pobre, que vive na periferia, ou de um homem com deficiência, de cadeira de rodas. São temas considerados de filmes de arte. Pegamos o assunto e misturamos com a comédia, o que resulta em um novo tipo de cinema. Claro que por ser um filme engraçado, ele se torna mais fácil de chegar ao público, a aceitação é maior. Outro ponto que conquistamos é o de distribuir nossa produção em outros países. Agora temos mais respeito no cinema para a comédia na França. Temas sociais com humor tem outro efeito. O humor nos leva a um ponto de impacto muito poderoso. Pessoas que querem rir vão rir. Quem quer pensar, também vai sair satisfeito. A nossa ideia não é só fazer as pessoas rirem, é leva-las a conhecer coisas e mundos que não conheciam.

Em Samba o tema é a imigração e como pessoas de outros países sobrevivem, ilegais, na França. Por que a escolha deste assunto?

Nakache – Porque é um tema muito importante e atual na França e na Europa. Nos noticiários vemos milhares e milhares de imigrantes cruzando mares em busca de um lugar na Europa. É um tema muito sensível que traz questionamentos. O que fazemos com essas pessoas? Samba é um imigrante que vive e trabalha há dez anos na França e, de repente, é mandado embora. Em Paris vemos pessoas como ele o tempo todo. Além dele, temos a personagem da Charlote, uma pessoa que teve uma crise nervosa no emprego. Queríamos fazer uma comédia romântica social. Mas não evitamos temas complexos como a imigração.

Toledano – Nós vemos estas pessoas em Paris, mas no fundo não as enxergamos. Não sabemos nada sobre elas. Apenas sabemos que elas vivem lá, entre nós. Mas não sabemos quem elas são. Elas estão nas nossas cozinhas, lavando pratos, mas não falamos com ela. Eles trabalham sem direitos. São ilegais. Temos milhares de imigrantes ilegais na França. Queríamos jogar luz nessas pessoas. Mudar nosso olhar sobre elas. Os franceses não gostam deles, mas não os conhecem. Nosso cinema tem a intenção de aproximar as pessoas.

Os senhores são descendentes de imigrantes?

Toledano – Viemos de países colonizados pela França. Então nossas famílias não tiveram tantos problemas como os atuais imigrantes para viver na França. Mesmo assim, nos sentimos próximos do assunto, pois somos descendentes de pessoas que largaram tudo em um país e se mudaram para outro. Os pais de Olivier vieram da Argélia, os meus do Marrocos, ambos países da África.

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No filme, o personagem Wilson (Tahar Rahim) é um árabe que finge ser brasileiro. No livro que inspirou o roteiro, ele é colombiano. Por que essa mudança?

Nakache – Queríamos acrescentar um pouco de comédia ao personagem, por isso o transformamos baseados na ideia do brasileiro falso. Gostamos do estilo, da música, do imaginário da nação, do clichê do homem brasileiro. E em Paris é realmente mais fácil se encontrar trabalho se você é brasileiro, mais do que um africano ou árabe.

Toledano – Na França, o brasileiro tem fama de simpático, sedutor. São pessoas dadas como sorridentes e dançantes. Então decidimos brincar com o clichê e explicá-lo. O personagem quer mostrar o tempo todo que sabe dançar, que pega garotas, para provar que é brasileiro. Tudo isso faz parte do clichê. Também somos muito fãs de músicas do Brasil. Ouvimos Seu Jorge, Gilberto Gil, Chico Buarque. Então aproveitamos para escolher as canções de MPB que estão no trilha sonora.

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Samba é o primeiro filme dos senhores após Intocáveis. Como estas duas produções se relacionam?

Nakache – Em ambos tentamos mostrar pessoas que são distantes, mas no fundo são mais próximas do que imaginam. Criamos pontes entre realidades diferentes, de lados distintos da sociedade. Em Samba, o protagonista está na parte de baixo da sociedade, e seu par romântico no topo. São pessoas muito distantes na dimensão social. Mas se você olha de perto, verá que são iguais. Estão ambos à beira de um ataque de nervos.

O que podemos esperar do próximo filme assinado pelos senhores?

Toledano – Justamente esta questão de uma sociedade nervosa, ansiosa, em crise. Estamos todos à beira de um colapso. Pessoas se tornaram dependentes de celulares, e-mails, estamos checando estes dispositivos o tempo todo. Não vivemos um momento, preferimos tirar foto para mostrar aos outros, mas nós mesmos nunca mais olhamos para aquelas imagens. Estamos acelerados, como mostra o filme argentino Relatos Selvagens. Todas as sociedades, países ricos e pobres, estão no seu limite. E esta será a inspiração do nosso próximo filme.

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