Com Julian Schnabel, Masp oferece alternativa à Bienal
Museu faz 1ª individual na AL do pintor e diretor, autor de filmes como ‘Basquiat’ (1996) e de obras que ressignificam materiais descartados
Certa feita, ao ser chamado para expor no Louvre, em Paris, o cubista espanhol Pablo Picasso achou divertido se ver misturado a ícones históricos como o barroco Caravaggio, um dos clássicos que povoam o templo da arte francês. O nova-iorquino Julian Schnabel, 63 anos, lembrou o caso ao ver duas de suas telas serem colocadas entre mestres como Rembrandt e Velásquez, no segundo andar do Museu de Arte de São Paulo (Masp), no fim da manhã da última terça-feira. É lá que tem início nesta quinta LA NIL – Pinturas 1988-2014, a primeira individual do artista na América Latina. Até 7 de dezembro, a mostra reúne 25 pinturas e pelo menos três longas de Schnabel, que, além de pintor proeminente no cenário contemporâneo, é o bem sucedido diretor de filmes como Basquiat (1997) e O Escafandro e a Borboleta (2006), que lhe rendeu a Palma de Ouro de direção em Cannes.
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Portrait of Amanda Nazario e Portrait of Rene Ricardo, as telas que gozam agora da companhia de Goya e Van Dyck, remetem ao estilo desses artistas que ganhavam a vida de reproduzir figuras da corte. Mas de forma irreverente: são retratos feitos em óleo e cortados por uma enorme mancha branca, como objetos encontrados ao acaso e molecamente vandalizados por Schnabel, um fã do ready made do dadaísta Marcel Duchamp (1887-1968) e do abstracionismo gráfico de Cy Twombly (1928-2011).
“Eu tive vontade de fazer manchas brancas em pinturas que vi em Veneza, anos atrás. Mas as telas pertenciam a outra pessoa, por isso tive que pintar minhas próprias telas para poder manchar”, contou Schnabel, que já expôs no país em 1994, na Bienal de Arte de São Paulo, no Ibirapuera. “Há sempre alguém que vem, intervém e reorganiza as coisas, que altera significados. Isso tem a ver com morte, mudança, vida.”
Representante do neo-expressionismo americano dos anos 1980, Schnabel, porém, está mais para as pinceladas soltas que se veem no subsolo do museu, onde está a maior parte desta mostra – os filmes serão exibidos no pequeno auditório do Masp, a partir da semana que vem – do que para os óleos acadêmicos do segundo andar. No grande hall do museu, o pincel corre solto por velas náuticas, isopores e bandeiras que, achados pelo pintor, viraram suporte para a sua tinta e para adereços como plumagens e cartões, em composições abstratas que carregam muito do alfabeto particular do artista. “Procuro materiais que têm significado pessoal para mim, objetos que façam sentido em minha própria língua.”
O caráter de intervenção também está presente nas imagens de um casal velejando, ele vestido, ela seminua, que parecem marcadas com tinta, assim como as bandeiras tingidas de maneira disforme. “Manchas criam relações emocionais com o espectador.”
Destaque ainda para as peças compostas no calor da morte de Cy Twombly, amigo e guia homenageado em obras como No Dia em que Cy Morreu (Seu Braço Direito Dobrado sob a Cabeça como um Travesseiro), que empresta trecho de um texto do colombiano Gabriel Garcia Márquez, por coincidência mais um morto presente na exposição – Schnabel está cercado deles: o pintor era muito amigo do ator Philip Seymour Hoffman, morto em fevereiro, e do roqueiro Lou Reed, que filmou há pouco no documentário Berlin.
Unir literatura e artes plásticas, com todas as manchas emocionais possíveis, era uma das marcas de Twombly que ficaram em Schnabel. E que agora podem ser vistas na mostra do Masp, uma boa alternativa à Bienal que abre neste sábado no Ibirapuera.
Serviço
O quê: Julian Schnabel – LA NIL Pinturas 1988-2014
Conteúdo: 25 obras feitas de 1988 a 2014 e filmes (programação ainda não definida)
Onde: Museu de Arte de São Paulo (Masp), av. Paulista, 1578
Quando: de 4 de setembro a 7 de dezembro. De terça a domingo e aos feriados, das 10h às 18h. Quintas, das 10h às 20h
Quanto: R$ 15. Gratuito às terças