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A tribo de preto que não para de crescer

Quem são e como consomem os fãs do metal, gênero do rock que, apesar do fiasco do festival Metal Open Air, encabeça um nicho que não para de crescer

Por Carol Nogueira
1 Maio 2012, 14h10

O estrondoso fracasso do festival Metal Open Air (Moa), evento que prometia trazer até o ator Charlie Sheen ao Brasil, como mestre de cerimônias, direcionou holofotes para um segmento que, embora já consolidado como vertente do rock, não costuma ocupar posição central no cenário musical: o dos metaleiros. Ou dos, como eles gostam de ser chamados, headbangers. O metal ou “rock pesado” é um nicho forte, alimentado por fãs fervorosos que viajam quilômetros para ver seus ídolos tocar e, assim como o mercado musical geral, cresce a passos largos no Brasil, puxado pela boa situação da economia. Fiéis, os devotos do metal consomem não apenas shows e discos, mas também camisetas e revistas especializadas, irrigando uma vasta rede de negócios e serviços atrelados ao gosto dos que se vestem de preto.

O produtor de shows mexicano Paulo Baron. Viu show de uma banda de metal no Brasil? Provavelmente, foi ele que trouxe
O produtor de shows mexicano Paulo Baron. Viu show de uma banda de metal no Brasil? Provavelmente, foi ele que trouxe (VEJA)

O mico do Metal Open Air

Programado para 20, 21 e 22 de abril de 2012, no Maranhão, o Metal Open Air surgiu como uma boa ideia. Seria o maior festival de rock pesado do Brasil. Entre sexta-feira e domingo, 47 bandas subiriam aos palcos do Parque Independência, em São Luís. Mas, na véspera, os problemas começaram a aparecer. A banda brasileira Hangar cancelou o show por falta de pagamento, iniciando uma série de baixas que deixaria o evento com 30 bandas a menos.

“Quando era baterista do Angra, um dos produtores desse festival nos deixou a ver navios. Por isso, pedi o contrato e o cachê antecipadamente. Não recebemos e cancelamos”, diz Aquiles Priester, do Hangar. “Ninguém leva o metal a sério no Brasil.”

O que seguiu foi um show de horrores. “Chegamos a São Luís na sexta e, apesar de o festival ter problemas de estrutura, achávamos que valeria a pena”, diz Marcello Pompeu, vocalista da banda Korzus, há 30 anos em atividade. “Quando acordamos no sábado, o dia do show, estávamos no inferno. Disseram que a organização tinha desmontado todos os equipamentos, que a segurança era fraca e as bandas e o público estavam correndo riscos. Foi um festival de desorganização.”

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O produtor Brendan Duffey, americano radicado no Brasil, esteve em São Luís para ajudar bandas como Almah e Dr. Sin com a aparelhagem de som e também sofreu. “A sorte foi que algumas bandas deixaram o equipamento para outras usarem. Havia grupo que tinha pedido 40 caixas de som e a produção só conseguiu 10”, diz. Como Priester e Pompeu, Duffey acredita que as bandas brasileiras não são respeitadas por produtores. “Às vezes, mostro os sons que gravo com brasileiros para amigos de fora, que ficam loucos. Gostaria de ver esse respeito aqui.”

As vítimas do Metal Open Air, promessa de valorização do metal que terminou como piada, culpam a falta de experiência dos produtores – Natanael Jr., da Lamparina Produções, e Felipe Negri, da Negri Concerts – pelo mico. Procurados, nenhum deles foi localizado desde o dia 21. E, até agora, nenhum dos dois divulgou como ou se os fãs terão reembolso.

Paulo Baron (foto), de 42 anos, sabe como esse mercado pode ser lucrativo. De origem mexicana, ele mora há mais de uma década no Brasil, onde é proprietário da produtora Top Link, fundada há 24 anos na Inglaterra e hoje considerada a maior empresa de eventos de rock e metal da América Latina. Só neste ano, Baron trará 113 shows ao continente. Pelo menos 70 deles passam pelo Brasil. Há dois ou três anos, essa média era de 40 – prova do crescimento do segmento. “A primeira vez que eu trouxe o Motörhead, em 2005, tive 4.000 pagantes. Em 2007, já era 6.000. Toda vez que eles vêm, o público aumenta. E, como nos Estados Unidos a situação econômica não está muito boa, eles estão vindo para cá. Nós ainda pagamos cachês altos”, conta Baron. “O cachê do grupo alemão Scorpions, por exemplo, é de 250.000 euros. Por isso, você acaba tendo ingressos de até 600 reais. Já não são todos os países que podem pagar.”

Ao que tudo indica, os metaleiros nacionais estão dispostos a gastar. O prédio de número 62 da rua 24 de maio, no centro paulistano, comprova. O endereço abriga o shopping center Grandes Galerias, mais conhecido como Galeria do Rock, que – a despeito da variada oferta de produtos piratas ao redor – recebe por dia mais de 20.000 pessoas atrás de peças originais de suas bandas favoritas. É a procura dos fãs fiéis que explica números como os do Iron Maiden e do Sepultura. A banda britânica já vendeu mais de 85 milhões de discos pelo mundo, 2,5 milhões deles no Brasil. E a banda mineira, bem recebida lá fora, contabiliza 20 milhões de cópias vendidas entre o mercado nacional e o internacional.

É também o interesse dos fãs por seus ídolos que explica a tiragem de revistas especializadas como a Roadie Crew e a Comando Rock, que se sustentam apenas de vendas, e não de anúncios. “Não temos muitos anunciantes, porque o nicho é pequeno. Só sobram shows e gravadoras para anunciar”, explica Marcos Filipe, editor da Comando Rock, que tem tiragem de 30.000 exemplares e 1.600 assinantes. Já a Roadie Crew, principal revista de metal da América Latina e rodada no Brasil, tem tiragem mensal de 35.000 exemplares e 6.000 assinantes.

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Os fãs de metal ainda contribuem com o segmento de lazer e serviços, enchendo bares como o Manifesto, há 17 anos um reduto roqueiro de São Paulo. “As pessoas veem o show, se interessam e compram CD e camiseta. Às vezes, o cara também decide montar uma banda própria e investe em instrumentos”, comenta Silvano Brancati, dono do bar, que recebe 500 pessoas por dia, de quinta a domingo. O público de Brancati, segundo ele formado por pessoas dos “16 aos 50 anos”, paga geralmente 20 reais para entrar. Mas em dias de atrações especiais, como Paul Di’Anno, ex-vocalista do Iron Maiden que tocou por lá dia 21, pode chegar a desembolsar 120 reais pelo ingresso.

O vocalista Marcello Pompeu, do Korzus
O vocalista Marcello Pompeu, do Korzus (VEJA)

Anjos de preto – O headbanger paga e se comporta. É o que garantem fãs e artistas. Aquele estereótipo negativo do metaleiro, antes visto como “violento” e “baderneiro”, está mudando, afirmam dezenas de entrevistados pelo site de VEJA. “Esse estereótipo negativo vem lá dos anos 1980, quando a cena era recente e as bandas, mais rebeldes. Mas o público hoje não é assim. A maioria nem usa drogas”, diz o produtor de shows Paulo Baron.

“Hoje, ninguém mais faz ‘bate-cabeça’, aquilo de pular um contra o outro na pista. Todos saltam feito pipoca. Tem mais briga em show de pagode que em show de metal”, diz Marcos Livi, gerente operacional da Via Funchal, casa paulistana acostumada a receber bandas metaleiras.

A acomodação do público pode ser explicada pela idade do gênero. O rock de pegada pesada surgiu nos anos 1970. A primeira geração a cultuá-lo tem hoje, portanto, pelo menos 50 anos. São aqueles simpáticos tiozinhos que lotam festivais como o Rock in Rio com a família a tiracolo – a mulher, muitas vezes encontrada em um bar ou show, e a prole, devidamente vestida de preto, é claro.

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