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Estados Unidos também penam para ensinar matemática

Diante do desempenho cadente dos estudantes, o professor da Universidade de Brown propõe ensino de ciências atrelado à realidade dos alunos

Por Nathalia Goulart
14 set 2011, 16h33

Está provado por a + b que a matemática é o problema. E não só para os alunos brasileiros. Nos Estados Unidos, o desempenho dos estudantes em testes nacionais e internacionais está em queda quando o tema são números. O assunto preocupa David Mumford, professor emérido do departamento de matemática da Universidade de Brown, em Massachusetts. “Quase ninguém vê razão em aprender matemática porque ela se tornou abstrata”, diz o especialista. “Foi por meio das aplicações do dia a dia que a disciplina surgiu, atravessou os séculos e se conectou com as culturas modernas. É preciso resgatar isso.” Na percepção do americano, o ensino das demais ciências padece do mesmo mal – e carece da mesma solução. Mumford conversou com nossa reportagem sobre o assunto para a série de reportagens de VEJA sobre o impacto da educação e do ensino das ciências no desenvolvimento do país. Confira a entrevista a seguir.

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David Mumford, professor de matemática em Brown
David Mumford, professor de matemática em Brown (VEJA)

O senhor defende uma mudança no ensino da matemática. Por quê? Os especialistas que decidem a forma como devemos ensinar matemática na escola são pessoas ligadas a pesquisa e, em geral, não estão em contato com os estudantes que aprendem matemática e absorvem esses conteúdos. Aquelas pessoas pensam a matemática de uma forma muito abstrata, um processo que é pouco natural para a grande maioria. Recentemente, escrevi juntamente com um colega um artigo para o jornal The New York Times a respeito: uma professora nos contatou dizendo que estava ensinando a seus alunos do terceiro ano conceitos de divisão e multiplicação por meio de uma receita de bolo. É desse tipo de ensino que precisamos.

Assim como o Brasil, os Estados Unidos registram queda no rendimento de seus alunos em matemática. O problema é universal? Sim, é um problema de todos. Quase ninguém vê razão em aprender matemática porque ela se tornou abstrata. Vou dar um exemplo concreto. Quando as crianças aprendem aqueles problemas com x e y, elas não conseguem entender que tipo de conexão aquilo tem com a vida delas. Se, por outro lado, o professor toma como ponto de partida um problema financeiro, prático, os alunos entendem que os números e a realidade estão interligados, que existe uma conexão entre eles.

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Treinar os professores para essa transição é uma tarefa difícil? Esse é um grande desafio. Hoje, nos Estados Unidos, existe um grande esforço para aumentar a qualificação do professor de matemática. Mas essa é uma questão difícil, porque temos um quadro muito heterogêneo. Conheço professores que adoram a ideia de uma matemática mais concreta nas escolas e outros que têm aversão a essa ideia.

Qual seria o resultado dessa transformação que o senhor propõe? As pessoas parariam de olhar para a matemática como se ela fosse um alienígena. Elas estarão mais aptas a lidar com questões do século XXI. Os computadores são um exemplo disso. Para a maioria das pessoas, o computador é apenas uma caixa preta que funciona de forma mágica. Acredito que todo e qualquer estudante do ensino médio deveria aprender na escola a desenvolver programas de computador, por mais simples que sejam. Só assim, poderão compreender de forma elementar o que se passa em um computador e como as coisas não são assim tão misteriosas.

Em seu artigo no New York Times, o senhor fala de alguns conteúdos matemáticos que são desnecessários na escola. O senhor pode dar exemplos? Os polinômios, por exemplo, não têm utilidade nenhuma para 99,9% da população. Ensinar isso na escola é uma perda de tempo sem tamanho. Ao invés disso, deveríamos ensinar engenharia básica e finanças, por exemplo. Digo isso para chocar as pessoas e para que elas percebam que existem outros caminhos além daqueles apresentados pela escola. Foi por meio das aplicações do dia a dia que a matemática surgiu no passado, atravessou os séculos e se conectou com as culturas modernas. É preciso resgatar isso.

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O senhor acredita que isso também acontece nas demais disciplinas de ciências? Sim. Há alguns anos, as escolas costumavam dissecar animais durante aulas de biologia. Mas em um determinado ponto, especialistas decidiram que aquilo era antigo e ultrapassado e que as crianças deveriam aprender sobre genética e DNA. Mas elas não estavam preparadas para essa mudança, porque quando elas deixaram de dissecar animais perderam o elo mais concreto daquela biologia e passaram a trabalhar com abstrações. Elas passaram a ser obrigadas a aceitar ideias que não tinham ligação com a realidade concreta. É o mesmo que acontece com a matemática.

Quão difícil é empreender a mudança no sentido que o senhor propõe? Não tenho ilusão de que isso vá acontecer da noite para o dia. O que desejo é dar início a discussões e fazer com que todos pensem sobre esse assunto. E assim espero que dentro de dez ou vinte anos alguma mudança possa ser vista.

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