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Segurança da indústria do petróleo terá que se reinventar para a exploração do pré-sal

Para especialista, tolerância com vazamentos e pequenos acidentes não pode se repetir. Engenheiro da USP afirma que estudos não garantem 100% de conhecimento sobre a área dos poços

Por João Marcello Erthal e Cecília Ritto
19 mar 2012, 17h07

“A pergunta que o mercado e a comunidade internacional se fazem é: como o Brasil pretende proteger o mar, para explorar os 4 milhões de barris do pré-sal”, afirma Ronaldo Seroa da Mota

O segundo vazamento descoberto no Campo de Frade, na Bacia de Campos, põe em xeque muito mais que a operação da Chevron e a exploração naquele pedaço da costa brasileira. A forma como são gerenciados os riscos ao longo do litoral, às vésperas do início da exploração da camada do pré-sal, são, para o economista Ronaldo Seroa da Mota, coordenador de Estudos Ambientais do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), o X da questão para esse setor da economia. A sequência de acidentes recentes – desde novembro, quando ocorreu o primeiro desastre da Chevron, o Brasil registrou pequenos vazamentos todos os meses – não deixa dúvida, para o especialista, de que o padrão de segurança atual não atende ao mínimo necessário para a camada do pré-sal.

“A pergunta que o mercado e a comunidade internacional se fazem é: como o Brasil pretende proteger o mar, para explorar os milhões de barris do pré-sal”, afirma Seroa da Mota. “Se há algo de bom no caso dos vazamentos da Chevron, acredito que seja a oportunidade de colocar em xeque o sistema regulatório da plataforma marítima. Mesmo que os vazamentos de agora sejam pontos fora da curva, sinalizam que podemos ter um desastre de grandes proporções sem um marco regulatório ambiental efetivo”, defende.

Estabelecer um patamar seguro da exploração offshore vai muito além do dimensionamento do aparato de segurança. Para extrair petróleo de reservatórios situados quilômetros abaixo do solo, o país e as empresas que vão operar na camada do pré-sal terão que se adequar a um nível de controle de risco ainda inexistente. “Isso implica em um conceito completamente diferente do que é segurança na exploração offshore. A comparação que podemos fazer é com os níveis de segurança da aviação civil, que recorre a vários sistemas de backup, redundância e um erro estatístico zero. A mudança é necessária porque, no caso do pré-sal, não há como atingir de forma rápida, nem identificar facilmente as origens de um possível acidente. Ou seja: não dá para considerar que, em caso de vazamento, a empresa faz um trabalho de dispersão e considera que parte do óleo será absorvido pela natureza. Nas dimensões do pré-sal, isso não é mais aceitável”, explica o economista.

O vazamento informado publicamente pela Chevron no último dia 15 foi descoberto no dia 4. A suspeita, no momento, é de que uma fissura em uma região próxima ao poço onde ocorreu o primeiro problema, no Campo de Frade, seja a origem do afloramento do óleo. Baseado em uma fonte que acompanha o caso, a edição desta segunda-feira do jornal O Globo aponta para a existência de um afundamento do solo e de fissuras na rocha em um raio de 3,5 quilômetros no entorno da plataforma. A reportagem indica a possibilidade de ocorrer uma série de vazamentos no local.

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Ricardo Azevedo, professor do departamento de Engenharia de Minas e de Petróleo da USP, afirma que os estudos feitos pelas empresas antes de iniciar a perfuração, por mais complexos que sejam, não dão garantias totais no momento de furar a rocha. Há pesquisas realizadas sobre o solo da Bacia de Campos que já chegaram a custar 70 milhões de dólares em casos extremos. “É preciso ter o máximo possível de informações, mas não dá para ter 100% delas. São camadas de rocha, uma sobre a outra. É impossível recolher amostras de todos os pontos”, explica Azevedo. A Chevron informou que decidiu suspender a exploração no Campo de Frade por precaução, por tratar-se de “uma área complexa”. A empresa pretende conhecer melhor o terreno, de onde já retira 61.500 barris de petróleo por dia.

As rochas perfuradas na exploração do petróleo foram formadas por deposição de matéria e podem ter quilômetros de extensão. O estudo feito pelas empresas recolhe amostras dessa rocha para estimar como ela é. A dificuldade está no fato de que ela pode ser estável em um ponto e apresentar fraturas e instabilidade em outro. “A fratura na rocha pode provocar migração de fluidos, redistribuição de pressões. Se a rocha tiver direção preferencial de ‘fraturamento’ (onde ela é mais frágil), pode continuar se fraturando naquela direção por longos trechos”, diz Azevedo.

Quando se faz uma perfuração, são injetados fluidos de perfuração que têm por finalidade manter a estabilidade do poço. A pressão desses fluidos é outra questão complexa. Se for colocada uma pressão muito baixa, o fluido da rocha pode entrar no poço. No caso inverso, de pressão mais alta, a rocha pode rachar. “Você não sabe exatamente o que vai encontrar. Às vezes a rocha é mais mole, mais dura, mais fraturada, mais ou menos resistente à pressão”, diz Azevedo.

A Chevron tem até a próxima terça-feira para apresentar ao Ibama informações detalhadas sobre as ações mitigadoras do impacto ambiental. Na quarta-feira, Marinha, Ibama e ANP se reunirão para avaliar o material entregue pela empresa.

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