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Pibinho do Brasil não é culpa da crise externa, dizem analistas

Enquanto o Brasil reduz sua presença, exportadores de matérias-primas sustentaram avanços, mesmo com o fim do 'boom das commodities'

Por Luís Lima 27 mar 2015, 10h28

Não é de hoje que o governo da presidente Dilma Rousseff atribui a causas externas o motivo da desaceleração econômica brasileira. De fato, o impulso econômico da China diminuiu e o ‘boom das commodities’, visto nos primeiros anos da década, se encerrou. No entanto, mesmo com adversidades externas, outros exportadores de matérias-primas, como Austrália, África do Sul, Indonésia, Chile e Rússia, conseguiram sustentar taxas de crescimento bastantes superiores à brasileira em 2014. Mesmo guardadas as devidas proporções a respeito do tipo de commodity que cada país produz e o peso que cada uma delas tem na economia, analistas consultados pelo site de VEJA são unânimes: as razões para o enfraquecimento econômico doméstico não podem ser atribuídas a uma conjuntura internacional. É, afinal, culpa do próprio Brasil.

É verdade que os preços das commodities despencaram. Mas estão longe do patamar de 10 anos atrás. Ou seja, não se trata de uma situação caótica. O índice de commodities CRB da Reuters, que reúne uma cesta de 19 produtos, recuou mais de 40% desde maio de 2011, quando começou a ceder. É ruim, mas ainda superior ao verificado no período da crise financeira internacional, em 2008. No caso do Brasil, que vende principalmente grãos, o fim da ‘era de ouro’ das matérias-primas o atingiu em cheio: a cotação da tonelada da soja para exportação, por exemplo, está no menor nível desde 2010. Já o minério de ferro, outro produto importante da pauta de exportação brasileira, é vendido nos níveis mais baixos desde 2009 no mercado à vista chinês. Por falar em China, principal destino das exportações brasileiras em 2014, o gigante asiático deve crescer, no melhor cenário, 7% este ano – muito abaixo dos 10% que se tornaram constantes anos atrás.

Esses fatores, contudo, não isentam o Brasil da culpa. O país não fez a lição de casa, que é aumentar a capacidade produtiva e a competitividade. “Tivemos um esgotamento do modelo de expansão do consumo via estímulo da demanda. A combinação entre o fatigado mercado doméstico e a retração do comércio mundial inibiu a capacidade de crescimento do país”, explicou o professor de economia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Antonio Corrêa de Lacerda. Ele acrescenta que o país possui uma economia bastante fechada, em que as exportações respondem por apenas 10% do Produto Interno Bruto (PIB), o que reforça a constatação de que as causas da desaceleração econômica brasileira são internas. O discurso é endossado por José Augusto de Castro, da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). “O desarranjo econômico atual é culpa nossa. Nos encantamos com os preços atrativos das commodities nos últimos anos e achamos que isso fosse durar para sempre”, afirmou.

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Entre as desvantagens do Brasil em relação a outros exportadores de commodities estão o elevado custo logístico, a complexa burocracia e o sistema tributário, que desestimula a produção de itens de maior valor agregado. “Nós crescíamos antes independentemente do desempenho do mercado externo. Os preços das commodities ajudaram, mas não resolvaram problemas econômicos estruturais, como falta de competitividade, eficiência e a burocracia excessiva”, diz Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior e sócio da consultoria BarralMJorge. “No caso do Brasil, os fatores internos são sempre mais importantes. O mercado externo, extremamente demandante, ajudou a balança de pagamentos nos últimos anos, mas a atual crise enfrentada pelo país não é uma consequência de uma reversão deste cenário”, afirma.

Mesmo na área externa, alguns deslizes cometidos são de autoria do próprio país. Enquanto o Brasil perde participação em mercados estratégicos, como União Europeia, China, e Argentina, outros partem para a expansão. O caso da Argentina é gritante. Nos últimos três anos, as exportações brasileiras para o país vizinho acumulam queda superior a 35%. A queda se deve, em especial às medidas protecionistas adotadas, à desaceleração local e ao fato de o Brasil exportar para aquele país principalmente produtos manufaturados. “Uma vez que projetamos nova retração do PIB argentino neste ano e seu acesso ao mercado internacional de capitais continuará restrito, é razoável esperar que as relações comerciais entre o Brasil e a Argentina continuem desfavoráveis”, escreveu o economista-chefe do Bradesco, Octavio de Barros, em relatório enviado a investidores. Enquanto isso, a China ‘abocanha’ parte do vácuo deixado pelo Brasil, oferecendo linhas de crédito atrativas aos ‘hermanos’.

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Em relação aos Estados Unidos, principal economia do mundo, apenas com Armando Monteiro, atual ministro do Desenvolvimento, é que se tem buscado uma reaproximação – desde 2003 não havia uma missão chefiada pelo governo brasileiro ao país. Reflexo da falta de estratégia do Brasil na área externa foi o resultado negativo na balança comercial de 2014, com déficit (exportações menos importações) de 3,93 bilhões de dólares, o primeiro desde 2000. “Dos quinze maiores exportadores do mundo, treze exportam, sobretudo, produtos manufaturados. São países que fizeram reformas, para coexistir a venda de commodities com manufaturas. Já o Brasil não fez nada: reforma tributária, ampliação de investimentos em infraestrutura, dentre outras coisas. Somos eternamente cigarra – e não formiga”, comparou Castro, da AEB.

Os analistas não veem uma saída fácil nem instantânea para que o Brasil retome uma trajetória de crescimento. Isso proque as medidas que o país precisa implementar são estruturais e têm efeitos apenas no longo prazo. Com isso, este ano e o ano que vem ainda devem ser “problemáticos” no âmbito econômico. “A supresa que temos não é a crise em si, mas a dificuldade que o governo está tendo em geri-la. Dificuldades na articulação com o Congresso criam um clima de desconfiança entre os agentes do mercado, sem falar dos desdobramentos da Operação Lava Jato, que não ajudam em nada”, afirma François Santos, sócio do escritório brasileiro da A.T. Kearney.

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PIB_exporta (VEJA)

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