Diretor do FMI sugere que Brasil reduza meta fiscal
Em entrevista a Dow Jones, Paulo Nogueira Batista disse que fundamentos econômicos do país permitem um afrouxamento da meta
O diretor-executivo do Fundo Monetário Internacional (FMI), Paulo Nogueira Batista, surpreendeu o mercado, nesta segunda-feira, ao afirmar que o governo brasileiro deve considerar reduzir sua meta de superávit primário em face das menores taxas de juros e fraco crescimento da economia.
Ao lado de uma equipe do FMI, Batista planeja vir ao Brasil antes do fim do mês para consultas econômicas de rotina. “As taxas de juros no Brasil têm caído consideravelmente. Isso ajuda a recuperação econômica e as finanças do governo”, disse ele, de Washington, em entrevista a Dow Jones. “O superávit primário necessário para estabilizar a dívida pública está menor do que costumava ser.”
A taxa básica de juros do Brasil, a Selic, está atualmente na mínima histórica de 7,25%, como resultado de uma estratégia de redução de juros iniciada em agosto de 2011, quando os juros estavam em 12,5%. Apesar da taxa mais baixa, o governo manteve sua meta de superávit primário em 3,1% do Produto Interno Bruto (PIB). O país, no entanto, tem tido problemas para alcançar essa meta nos últimos anos – sobretudo devido à queda da arrecadação de impostos. Por isso, tem lançado mão da chamada ‘contabilidade criativa’ – ou seja, artifícios contábeis nem sempre ortodoxos para fazer com que a meta, ao menos, pareça cumprida.
O subterfúgio mais preocupante foi usado, pela primeira vez, na última semana de 2012, quando o governo resgatou 12,4 bilhões de reais do Fundo Soberano do Brasil (FSB) para conseguir cumprir o superávit. Além dele, foram feitas transferências ao Tesouro em dezembro, vindas de instituições financeiras públicas. As autoridades brasileiras admitiram que o país não poderia alcançar a meta sem essas medidas devido à receita menor que a esperada e aos bilhões de dólares em benefícios fiscais designados a estimular o lento crescimento econômico.
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‘Não é bem assim’ – Questionado sobre seu aval à ‘contabilidade criativa’, Nogueira Batista desconversou, dizendo que sua sugestão não está relacionada às manobras contábeis do governo, que não foram analisadas por ele em profundidade. “Eu teria que analisar isso melhor. O que estou dizendo não tem a ver com isso, e sim com a orientação real da política fiscal”, disse, acrescentando que essas visões expressam sua opinião pessoal e não necessariamente as do FMI como um todo. Uma redução da meta de superávit primário ajudaria a pavimentar o caminho para uma recuperação econômica mais ampla, disse ele, sem sugerir qual deveria ser a nova meta.
Segundo a maior parte dos economistas, o Brasil cresceu a uma taxa anualizada de cerca de 3% no último trimestre de 2012, depois de expandir menos de 1% nos trimestres anteriores. “Ainda assim, essa não é uma recuperação clara e forte”, disse Nogueira Batista, citando analistas que preveem aumento do PIB de 3% a 4% neste ano. “Crescer 3% é somente razoável. Não é algo grande para o Brasil, mas com tudo que ocorreu em 2011 e 2012, é um bom crescimento inicial.”
A economia brasileira cresceu tímidos 2,7% em 2011 e cerca de 1% no ano passado, sendo que, em 2010, o nível havia sido de robustos 7,5%. A lenta recuperação econômica é provavelmente resultado de uma economia internacional mais complicada que o esperado, segundo Nogueira Batista. A taxa de investimentos no país é menor que 20% do PIB e tem caído ultimamente, apesar dos esforços do governo para estimular investimentos do setor privado.
“No setor público, não acredito que haja falta de capital para financiar investimentos, mas sim dificuldades na implementação desses investimentos”, disse ele, citando restrições administrativas e legais. Ele acrescentou que, no setor privado, o problema envolve uma combinação de fatores, incluindo incertezas sobre a economia global e dúvidas sobre o ritmo da recuperação doméstica.
(Com Estadão Conteúdo)