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No lugar das grandes causas, microrrevoluções

Para Edgar Gouveia Jr, diretor do Instituto Elos, a juventude empreendedora de hoje promove mudanças expressivas ao agir a partir de sua realidade local

Por Carolina Almeida
17 mar 2012, 12h29

Edgar Gouveia Júnior, 46, urbanista brasileiro e diretor executivo da ONG Instituto Elos, ganhou destaque no meio acadêmico nos últimos anos por sua pesquisa e ativismo sobre mudanças globais. Parte essencial de seu trabalho é o envolvimento com os jovens. Com eles, o arquiteto nascido em Santos (SP) desenvolve no Brasil e em outros países diversos projetos, entre os quais o ‘Oásis’ – que consiste em criar soluções e espaços envolventes, concebidos para troca de experiências, em áreas carentes. A qualidade de sua atividade junto à juventude lhe rendeu o reconhecimento da prestigiada Universidade Harvard, nos Estados Unidos. Sobre workshop dado no local no início deste mês, o portal Havard Gazette o elogiou “por sua abordagem para o desenvolvimento de base e sua pesquisa sobre mudanças através da brincadeira”.

Gouveia Jr. defende que os jovens atuais têm uma maneira diferente, e mais eficaz, de promover mudanças. Saem de cena o sonho com uma grande revolução e a atitude confrontadora – que tanto marcaram gerações anteriores – e entram em voga o desejo de transformar a realidade próxima e o valor dado à colaboração. Ele diz que a figura do herói solitário não existe para essa geração: o que eles querem é trabalhar em equipe.

Os jovens de hoje são adeptos do que Gouveia Jr. classifica como “microrrevoluções colaborativas”, cujas características são o trabalho de curto prazo, feito nos horários livres que eles possuem; a total liberdade para encontrar soluções, com ideias que preferencialmente não envolvam dinheiro; e a diversão, se possível ao lado de amigos. Ao aliar esses três valores, diz o especialista, esses jovens são capazes de traçar um caminho de mudança que não é considerado um fardo – mas sim lazer.

Como os jovens de hoje podem contribuir para mudar o mundo?

Os jovens atuais são mais ágeis e querem resultados mais concretos. A transformação que buscam tem de ser consistente, aqui e agora. Como são mais “pé no chão”, eles não se pautam por sonhos de promover grandes revoluções sociais, políticas e econômicas. Seu foco é o mundo à sua volta. Chamamos essas mudanças de microrrevoluções. Os jovens hoje não se estimulam com o embate. Ao contrário. Eles querem traçar um caminho alternativo, sem usar a força, a guerra, o confronto. O que mais gostam e sabem fazer é o trabalho em grupo.

É isso que você chama de “guerreiro sem armas”?

Chamo de “guerreiro sem armas” o jovem que assume para si o compromisso de contribuir para transformar o mundo – de verdade e já – sem uso de armas ou da violência. Esse jovem desenvolve uma capacidade transformadora sim, mas que implica fazer isso com as pessoas.

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Como assim “com as pessoas”? Reunindo pessoas em volta de um objetivo comum?

Sim. O que defendo e percebo que vem do jovem é o desejo de não querer ser um herói solitário. Eles têm a iniciativa e a habilidade de chamar os amigos, os vizinhos e os colegas para seus projetos. É uma vontade de partilhar suas tarefas.

Como você define a atuação do jovem hoje em dia?

Costumo descrever a habilidade deles de promover mudanças por meio de três atribuições básicas: a velocidade, a gratuidade e a diversão. Eles têm prazer e são eficientes, além de econômicos, no que fazem – o que não significa que não obtenham resultado.

Nem todo jovem é tão empolgado. O que fazer para que um número maior deles torne-se mais atuante?

Como muitos não se dispõem naturalmente, a sociedade, sobretudo os jovens que são ativistas, têm de desenvolver a habilidade de fazer convites que neutralizem os principais inibidores do impulso natural para colaborar. Chamo de “inibidores” os medos de sofrer, de perder a liberdade e de falhar. O medo de sofrer não se resume à própria pessoa, mas também ao temor de fazer sofrer quem ela ama. Há também o receio de perder a liberdade ou a autonomia, que surge quando o jovem pensa: “Se eu me envolver nisso, depois não vou poder sair” ou “vai ficar muito chato se sair”. Há aqueles que só querem se envolver se puderem oferecer algo na medida, no prazo e da maneira que bem planejarem. Por fim, existe o clássico medo de falhar, isto é, de se dedicar, acreditar em algo, e tanto envolvimento não levar ao resultado desejado.

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Como eliminar, então, esses inibidores naturais da mudança?

Os desbloqueadores são simples. A proposta tem de ser rápida. Todos vivemos sob uma pressão imensa e luta-se muito para dar conta apenas da lista de tarefas do dia a dia. Aderir a uma segunda, terceira causa soa como loucura para muitos jovens. Mas se você chamá-los pra fazer algo significativo na hora do almoço, aí alguns toparão! Se for de graça, melhor ainda. Caso ele tenha liberdade para agir como quiser, aí o convite torna-se mais interessante. Se forem adicionados a esse pacote a diversão e participação dos amigos, a adesão aumenta mais um pouco. Se conseguirmos somar velocidade, autonomia e um significado, a grande maioria da humanidade vai querer contribuir.

Você tem exemplos dessas microrrevoluções?

Um exemplo foi o Jogo Oásis Santa Catarina [da época da enchente do rio Itajaí]. Destaco também os flash mobs – convocações realizadas na internet para atos-relâmpago que reúnem centenas de pessoas. E o nosso mais novo projeto, o “Play the call”, que pretende engajar 2 bilhões de pessoas nos próximos quatro anos em ações “mão na massa” para reverter o processo de destruição da biosfera.

Você considera que o saldo líquido dessas pequenas mudanças na sociedade é positivo?

Positivo é de qualquer forma. Mesmo pequenas, essas microrrevoluções transformam para melhor a vida das pessoas – e, muitas vezes, de modo definitivo. Também vejo que elas estão apontando um caminho, revelando uma tendência. Acredito que essa “onda” está chegando, se insinuando e ampliando. Minha visão é que algo bonito vem por aí se a gente trabalhar – ou melhor, brincar bem.

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Como você vê o jovem líder brasileiro, especificamente?

São muitos perfis, não enxergo um padrão claro ainda. Há o jovem brasileiro – que eu gosto de ver e acompanhar – que é cada vez mais engajado socialmente, criativo, que encontra soluções jovens e inovadoras que harmonizam com sua visão de mundo. Eles são silenciosos, estão mais interessados em fazer do que aparecer, ou se promover, e sabem equilibrar transformação do mundo com bem-estar pessoal. Eles não agem como se fosse um sacrifício, mesmo quando têm dedicação total. São agregadores e gostam de chamar os outros, de trocar informações, de colaborar.

Quais dicas gostaria de deixar para esses jovens?

Seja lá o que você faça, seja lá qual for o seu “chamado” no mundo, não lute por isso. Não se sacrifique. Brinque com isso. Adicione felicidade e permita que todos os seus amigos possam participar também. O mundo que a gente está sonhando construir já começa aqui e agora. Não só lá na frente.

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