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Nem Lava Jato, nem piora da economia: ‘pedaladas fiscais’ é que podem levar ao impeachment

Manobra fiscal tida como ilegal pelo TCU mascarou a piora das contas públicas e pode custar o mandato da presidente Dilma Rousseff

Por Da Redação
17 abr 2016, 16h08

A discussão, complexa, começou restrita ao âmbito técnico, travada no Tribunal de Contas da União (TCU) com o Tesouro Nacional e o Banco Central. Mas, com o tempo, ela ganhou o debate político – e as ruas. Investigações da Operação Lava Jato, piora da economia, corrupção na Petrobras e outras mazelas à parte, são as chamadas “pedaladas fiscais” as responsáveis pela abertura do processo que pode custar à presidente Dilma Rousseff seu mandato.

“Pedalada” foi o apelido dado à opção do governo de postergar o repasse de recursos a bancos públicos e ao FGTS para, com isso, conseguir bancar, entre outras despesas, as de programas sociais. Em última instância, essas manobras contábeis mascararam a real situação das contas públicas.

Centro do furacão da crise política que paralisa a economia brasileira desde o ano passado, as pedaladas começaram a ser descobertas no início de 2014, quando a redução dos gastos de benefícios sociais chamou a atenção dos especialistas em Previdência. Eles não entendiam como as despesas com o abono salarial e seguro-desemprego caíam, mesmo num cenário em que a tendência natural das condições econômicas apontava para a direção contrária.

A desculpa oficial era sempre vaga. Arno Augustin, então secretário do Tesouro e principal mentor das pedaladas, insistia na tese de que a queda era um movimento natural. Em julho daquele ano revelou-se a existência de uma conta paralela de um banco privado com 4 bilhões de reais em créditos da União que estavam relacionados a atrasos nos repasses aos bancos para o pagamento de benefícios sociais.

O termo “pedaladas fiscais” começou a ganhar o cotidiano dos eleitores a poucos meses das eleições presidenciais. Até então, a expressão era usada quando técnicos queriam explicar que despesas dos ministérios, que deveriam ser pagas até o último dia do mês, tinham o desembolso transferido de fato para o primeiro dia do mês seguinte. Uma prática orçamentária antiga na Esplanada dos Ministérios, principalmente na virada de ano.

Outras instituições – entre elas Caixa, Banco do Brasil, BNDES e FGTS – apareceram como instrumentos das pedaladas. Como, pela legislação brasileira, um banco público não pode financiar o Tesouro, a base de sustentação para as investigações do TCU consolidou-se, a pedido do Ministério Público.

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Conivência – Responsável por apontar muitas das manobras feitas pela equipe de Arno, José Roberto Afonso, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas, diz que não se surpreendeu com o tamanho do alcance das pedaladas. Ele lembra que desde 2009 os especialistas em política fiscal e a imprensa já vinham denunciando as práticas fiscais indevidas, como o uso de receitas extraordinárias, empréstimos fora do Orçamento e despesas postergadas. Os próprios técnicos do Tesouro alertaram em um movimento de rebelião interna, sufocado por Augustin.

Antes de o TCU abrir as diligências para investigação, os fiscais do BC detectaram o problema na Caixa, no final de 2013. Mantida em sigilo, a fiscalização cobrou providências da direção do banco estatal, que por temor de punições da autoridade reguladora, pediu uma câmara de arbitragem à Advocacia-Geral da União (AGU) com o Tesouro. Por pressão do BC, que também ficou em situação desconfortável por não ter feito os registros corretos, as pedaladas começaram a ser corrigidas a partir de agosto de 2014.

A partir daí, e até a condenação das pedaladas pelo plenário do TCU, em abril do ano passado, todos os esforços da defesa da União, para sustentar a tese de que a prática era normal e já havia sido feita pelo governo FHC, não prosperaram. Com o julgamento, a oposição imediatamente começou a pedir o impeachment da presidente pelo crime de responsabilidade fiscal.

Quitação – Ao fim de 2015, por determinação do TCU, o Tesouro finalmente quitou 72,4 bilhões de reais das pedaladas que ainda estavam atrasadas. A principal consequência: rombo histórico de 115 bilhões de reais nas contas do governo.

Na etapa de comprovação das pedaladas, coube ao auditor do TCU Antonio Carlos D´Ávila, que conduziu a inspeção, o papel de protagonista ao conseguir elaborar um relatório técnico de grande consistência que serviu de base no julgamento. Ex-funcionário do BC e, portanto, com grande conhecimento sobre o tema, foi apontado com o “caçador” das pedaladas.

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Os investigados, entre eles servidores de carreira do Tesouro que podem ser responsabilizados em julgamento que ainda não terminou, veem a ação da corte de outra forma: a equipe do TCU quando foi colher provas, na verdade, já teria chegado pronta para a condenação por razões políticas. A principal queixa é de que a corte passou a dar uma interpretação nova, criminalizado a prática de imediato, sem esperar o prazo de ajustes.

Autor do pedido de impeachment, o advogado Miguel Reale concentrou sua argumentação na defesa da tese do governo de que as pedaladas fiscais eram praticadas e aceitas em gestões anteriores: “Dizer que ocorria antes é mentira”, afirma. Na linha de frente da defesa, o advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, sustentou até o fim que não houve operação de crédito nas pedaladas.

Fato é que as pedaladas foram o ato que motivou o pedido de impeachment. Deputados e senadores podem nem entender direito como as pedaladas funcionaram, mas foram elas que colocaram o mandato da presidente a um passo do fim.

(Da redação)

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