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Economia ensaia retomada, mas queda do dólar mantém alerta ligado

Setores como têxtil, calçados, químico e madeireiro aproveitam câmbio competitivo para exportar mais; recuo recente da moeda, no entanto, evidencia recuperação tímida

Por Luís Lima 3 jul 2016, 08h40

Há uma notícia boa e uma nem tanto sobre os indicadores recentes de atividade da economia brasileira. A boa: mesmo sob uma recessão severa, alguns setores mostraram traços de reação nos primeiros meses do ano e até aumentaram sua produção. A nem tanto: os sinais de vida emitidos por esses segmentos têm relação estreita com a alta do dólar, que estimulou as exportações, o que puxou a receita para cima. Ainda não é uma recuperação alimentada por melhora da demanda interna ou do nível de investimento, portanto, mas da variação cambial – e o dólar, nas últimas semanas, começou a cair, o que deixa ligado o alerta sobre a capacidade de sustentação dessa melhora.

Seja como for, para uma economia cujos indicadores de atividade só apontaram para baixo ao longo de meses, enxergar vida na aridez não deixa de ser uma ponta de esperança. Um desses segmentos é o calçadista. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) compilados pelo Ipea, a produção das fabricantes de calçados avançou 1,5% no primeiro trimestre de 2016 – e isso depois de passar o ano passado todo amargando sucessivas baixas. Outros dois setores que deram sinais de reação no mesmo período são o têxtil e o de produtos de madeira, com altas na produção de 3,2% e 5,4%, respectivamente.

Sinal (tímido) de reação
Sinal (tímido) de reação (VEJA)

De acordo com o Ipea, dentro dos tipos de indústrias, os chamados bens intermediários, que produzem insumos para outros setores industriais, também apresentaram indícios de melhora. Derivados do petróleo e de biocombustíveis, de químicos e de borracha e materiais plásticos estão na lista dos que se beneficiaram com o aumento das exportações – embora isso não tenha necessariamente se refletido em mais produção. O dólar mais alto puxou para cima as exportações desses setores e as importações, para baixo, o que melhorou sua balança comercial (ver tabela).

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“A recessão e o dólar mais caro aumentaram a ociosidade no mercado interno, o que motiva esses setores a vender lá fora”, diz José Ronaldo de Castro, coordenador do estudo. Em 2015, o dólar teve alta acumulada de quase 50%, o que ajuda a entender esse comportamento. No primeiro semestre, o saldo da balança comercial foi de 23,63 bilhões de dólares, o mais forte para esse período desde 1989.

A grife de calçados e acessórios Jorge Bischoff é uma das empresas que têm usado as vendas externas para dar fôlego novo à linha de produção. A empresa, que já exporta a 60 países, agora não só venderá ao mercado externo como abrirá sua primeira loja própria no exterior. A unidade ficará em Miami, nos Estados Unidos, e será inaugurada em novembro, em um projeto avaliado em 1 milhão de dólares. “Com o fator câmbio, estamos mais competitivos e também mais ousados para acelerar o crescimento de vendas no mercado internacional”, disse ao site de VEJA Jorge Bischoff, dono da marca que leva seu nome.

O italiano Pierpaolo Chicco, diretor da associação que promove a maior feira de calçados do mundo, a theMicam, atesta a competitividade dos produtos brasileiros. “Na Europa, em média, as empresas do setor calçadista pagam 35% em tributos, em relação a apenas 8% do Brasil”, diz.

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Previsões – Aqui e ali, as projeções para a economia têm melhorado. A consultoria MB Associados, por exemplo, revisou de 0,6% para 2% a previsão de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em 2017. Para este ano, a estimativa de queda passou de 4,1% para 3,3%. O Banco Fibra, por sua vez, alterou de 1% para 2,1% a projeção de alta da atividade no ano que vem.

Na edição mais recente do relatório Focus, do Banco Central (BC), que ouve semanalmente uma centena de economistas, a previsão para 2016 é de retração do PIB de 3,44% – a estimativa apurada uma semana antes era de 3,60%. Em relatório distribuído na última quinta-feira, o Bradesco afirmou que vê uma “recuperação econômica no segundo semestre” sustentada pela melhora na confiança dos setores de serviços e no comércio. Segundo dados da Fundação Getúlio Vargas (FGV) divulgados na última semana, o indicador sobre o comércio atingiu em junho o maior nível desde maio de 2005; o de serviços ficou no maior patamar em um ano.

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Reversão – Ainda que haja alguns lampejos de esperança, muitos analistas e representantes da indústria não acreditam que o ponto de virada da economia já tenha chegado. O câmbio é o motivo da ressalva. Isso porque o forte resultado da balança comercial no primeiro semestre foi herança de um dólar a 3,80 reais – bem superior ao atual patamar, de menos de 3,30 reais. Em junho, a moeda americana caiu 11,05%, sua maior baixa desde abril de 2003. A cotação da última quinta-feira, de 3,21 reais, foi a mais baixa desde 21 de julho do ano passado.

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“Os dados mais positivos devem-se basicamente à alta do dólar. É discutível se estamos no caminho de uma retomada.”, diz Mário Bernardini, diretor de competitividade da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq). “Só reduzir despesas não é suficiente”, complementa ele, referindo-se a medidas recentes do governo federal. “É preciso, em paralelo, estimular o crescimento”, sugere.

Mesmo setores que apareceram entre os destaques dos primeiros meses do ano mostram certo ceticismo. Fernando Figueiredo, presidente da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), avalia que o dólar contribuiu para elevar a balança comercial da indústria, mas a cautela ainda prevalece. “O volume físico das exportações não tem sido suficiente para aumentar a produção”, diz o dirigente.

A análise de Figueiredo é sintomática – e não apenas a que ele faz sobre seu setor. Se alguns nichos industriais engordaram suas vendas com base em um dólar mais atrativo, isso nem sempre isso significou mais produção. Segundo o IBGE, de um conjunto de 26 atividades industriais, apenas duas (alimentos e celulose, papel e produtos de papel) produziram mais no acumulado dos últimos doze meses. Entre as que melhoraram sua receita com base na alta do dólar, produtos de madeira, químicos e borracha e material plástico tiveram quedas na produção de 0,04%, 0,27% e 0,41%, respectivamente.

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Conclusão: sim, há sinais de melhoras em alguns setores – mas o momento de começar a estourar fogos ainda não chegou.

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