Assine VEJA por R$2,00/semana
Continua após publicidade

Com dólar nas alturas, brasileiros trocam exterior por destinos nacionais

Dólar turismo a mais de 4 reais afasta turistas de passeios fora do Brasil e faz com que quase 80% dos brasileiros prefiram viajar no próprio país

Por Eduardo Gonçalves e Luís Lima
5 set 2015, 12h02

A crise econômica e a disparada do dólar deixaram os brasileiros mais perto do Brasil. Se até pouco tempo atrás havia a percepção de que era mais barato ir para Miami, nos Estados Unidos, do que para o Nordeste brasileiro, por exemplo, o quadro já não é mais esse. Com o dólar turismo ultrapassando os 4,40 reais, o poder de compra do brasileiro no exterior caiu, aumentando a procura por destinos turísticos dentro da fronteira. Levantamento feito pelo Ministério do Turismo, obtido com exclusividade pelo site de VEJA, mostra que 78% dos brasileiros que desejam viajar nos próximos seis meses preferem um destino nacional a um estrangeiro. Trata-se do maior índice para o mês dos últimos cinco anos.

Gustavo e da Amanda, sua namorada, em Iporanga, no Guarujá
Gustavo e da Amanda, sua namorada, em Iporanga, no Guarujá (VEJA)

A situação do casal Gustavo Silva, de 22 anos, e Gabriela Adame, de 24, atesta esse cenário. Eles tinham planos de viajar para a África do Sul no fim do ano, mas o encarecimento da moeda americana mudou seus planos. “Quando vimos que todas as passagens e reservas seriam cotadas em dólar, decidimos buscar algo mais adequado à realidade atual”, diz Silva. No dia 25 de dezembro, eles embarcam para a Chapada Diamantina, na Bahia. “Só o preço das passagens que gastaríamos [para a África do Sul] ‘pagaria’ toda a viagem por aqui.”

De acordo com a Associação Brasileira de Agências de Viagem (Abav), o número de viagens de brasileiros ao exterior deve cair 10% neste ano em relação a 2014. A queda é significativa se for levado em conta que o indicador estava em trajetória ascendente desde 2009 – em 2014, o avanço foi de 5%. A instituição estima uma alta de 7% nas viagens domésticas.

Continua após a publicidade

Ana Paula Neri, de 51 anos, pretendia ir para a Disney, na Flórida, em julho deste ano. Ela planejava a viagem desde o início do ano, mas foi pega de surpresa pela escalada da moeda americana, que acumula alta de mais de 40% em 2015. “Começamos a cotar quanto ia sair, e vimos que a coisa estava feia, impraticável”, disse. Após colocar as contas no papel, decidiu que compensaria trocar o parque de diversões do Mickey por um resort em Imbassaí, no litoral norte baiano. Foi lá que fugiu do inverno paulista. “Fez sol todos os dias. Valeu a pena. Ficamos num hotel all inclusive [com tudo incluído]. Na Disney, íamos comer fora, fazer compras … você perde a noção de quanto vai sair com o dólar alto”, disse.

A maior procura por destinos nacionais também é vista nos buscadores de passagens e agências. Entre janeiro e agosto deste ano, houve um aumento de 14% nas buscas para viagens domésticas no buscador Skyscanner. As cinco cidades brasileiras mais procuradas no período foram São Paulo (14,78%), Rio de Janeiro (10,28%), Fortaleza (5,42%), Salvador (4,79%) e Recife (4,64%). Levantamento inédito da Decolar.com mostra que, nos oito primeiros meses do ano, as vendas de passagens e pacotes para destinos nacionais cresceram até 12%, refletindo o aumento do turismo doméstico e a queda do internacional. Na CVC, maior operadora de viagens do setor, as viagens nacionais ganharam incremento de 5% no primeiro semestre. Com isso, os destinos em território brasileiro somaram 65% da preferência dos clientes.

O ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves, diz que, embora seja preocupante, o atual cenário de crise abre alternativas de negócios para o setor. “Com o dólar tão proibitivo, há tempos não tínhamos uma chance tão importante para impor o turismo nacional como uma vertente econômica e social do país”, afirmou. Ele afirma que o estímulo ao setor gera emprego e renda, mas reconhece dois grandes obstáculos: a falta de mão de obra qualificada e a baixa divulgação.

Continua após a publicidade

Estudo feito pela Embratur, com base em dados oficiais de orçamentos públicos, mostra que o Brasil destinou apenas 60 milhões de reais para a promoção do turismo nacional em 2014. A cifra é significativamente menor do que a gasta por países próximos como México (485 milhões de dólares), Equador (95 milhões de dólares) e Colômbia (100 milhões de dólares). “Estamos mostrando ao governo a oportunidade que o turismo brasileiro merce ter neste momento. A estratégia passa por uma melhor e mais ampla divulgação, o que é, sobretudo, uma decisão política”, afirma o ministro. Segundo Alves, a estratégia pode acelerar a receita gerada pelo setor, que deve passar de 8 bilhões de dólares em 2014 para até 10 bilhões de dólares em 2015.

Crise – Não é só o câmbio que tem influenciado na decisão do brasileiro. “Outro fator importante é a crise econômica no Brasil. As pessoas estão preocupadas, o comércio está fraco, a indústria está mal, ainda há o medo de perder o emprego”, diz Leonel Rossi, diretor da Associação Brasileira de Agências de Viagens (Abav). Com o custo de vida mais elevado por causa da inflação e dos juros altos, os brasileiros estão contendo os gastos. Os primeiros a ser eliminados são os considerados não-essenciais e de alto valor agregado, como viagens.

O dólar alto também tem levado à bancarrota muitas agências de viagem, que já não vinham bem por causa da disseminação de sites de desconto na internet. Uma das maiores do setor, a Nascimento Turismo, fundada em 1961, entrou com pedido de recuperação judicial em março para honrar o pagamento dos pacotes que já haviam sido comercializados. A Time Brazil, outra veterana do segmento, chegou a paralisar suas vendas temporariamente por problemas financeiros também em março.

Continua após a publicidade

Para driblar as adversidades, as agências tem lançando mão de algumas estratégias para segurar os clientes. A mais agressiva delas é congelar o dólar – algumas chegam a fixá-lo até 2,99 reais. “É uma espécie de desconto. É para fazer um chamariz”, diz a agente de viagem Federica Zocchi. “Algumas até enganam o cliente – você aumenta o valor do pacote e abaixa o do dólar. Mas a maioria faz isso para não perder a clientela. É preferível não ter lucro e conseguir só pagar as contas do mês do que perder o cliente”, completa Rossi.

Passagens – A queda na procura por viagens internacionais só não foi maior porque o preço das passagens aéreas também caiu. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ele despencou 32,19% no acumulado de 2015 até julho. Em um ano em que a inflação acumula alta de quase 10%, esse é um dos únicos itens averiguados pelo instituto que teve baixa no preço. “Essa queda violenta compensou e ajudou a manter as vendas”, disse Rossi, da Abav.

“O primeiro semestre deste ano, por exemplo, permitiu que os consumidores tivessem acesso a inúmeras promoções para os EUA, inclusive para viagens que ainda acontecerão neste segundo semestre”, complementa o diretor da Decolar.com, Alípio Camanzano.

Continua após a publicidade

Outro dado que deixa nítido esse fenômeno é o do gasto dos turistas brasileiros no exterior calculado pelo Banco Central (BC), que somou 1,67 bilhão de dólares em julho, tradicional mês de férias. O montante representa uma queda de 30,5% em comparação com om mesmo mês de 2014. Foi o mês de julho mais fraco em cinco anos. A lógica é simples: com o dólar nas alturas, não vale a pena gastar lá fora. “Agora, as pessoas estão indo mais para passear. Não tem mais aquela coisa de trazer malas e malas dos Estados Unidos. Não compensa”, diz Federica.

Leia mais:

Gastos de brasileiros no exterior é o menor para julho desde 2010

Continua após a publicidade

CVC vende viagens internacionais com dólar a R$ 2,99

Dólar sobe 2,68% e termina a R$ 3,86, maior valor desde outubro de 2002

(Com reportagem de Teo Cury)

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.