Azevêdo terá o mandato mais difícil da história da OMC
Especialistas ouvidos pelo site de VEJA explicam quais os desafios que o brasileiro vai enfrentar em seu comando
O resultado ainda nem foi oficialmente divulgado pela Organização Mundial do Comércio (OMC) e o embaixador Roberto Azevêdo, eleito para o cargo de diretor-geral do órgão nesta terça-feira, já recebeu muitas felicitações pela conquista. O prestígio de ter um brasileiro eleito numa disputa acirrada mostrou que o país tem um bom trânsito global, especialmente nos países africanos, asiáticos e latino-americanos – seus principais aliados. A eleição de Azevêdo, que venceu o mexicano Herminio Blanco, também mostrou, de acordo com especialistas ouvidos pelo site de VEJA, que os olhos do mundo estão voltados para a força dos países emergentes.
Mas, passada a euforia da vitória, Azevêdo, diplomata de carreira, comandará a partir de setembro, quando termina o mandato do francês Pascal Lamy, os anos mais difíceis para a organização desde sua criação oficial em 1995. “Estes serão os anos mais complicados que a OMC vai enfrentar para seguir com suas negociações, depois de inúmeros acordos bilaterais e novas regras que estão sendo negociadas fora do âmbito da OMC. O desafio será ‘multilateralizar’ essas regras”, disse ao site de VEJA o embaixador Rubens Antonio Barbosa.
Além da retomada da Rodada Doha, paralisada com o estouro da crise mundial em 2008, a OMC também sofre de perda de credibilidade em um dos seus pilares: a negociação global.
Para Barbosa, dificilmente será alcançado um pacto global de comércio, o sonhado multilateralismo que Azevêdo utilizou como plataforma eleitoral. “Sou cético com relação a retomada da Rodada Doha. Os EUA e a Europa continuam resistentes, a crise criou um ambiente ainda mais adverso e os países estão mais protecionistas”, explicou o embaixador.
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É importante lembrar, porém, que o brasileiro não terá poder para propor sozinho mudanças nas relações comerciais. Seu novo cargo permite negociar, agendar encontros, persuadir os membros e liderar as discussões para que os 159 membros cheguem a um acordo. Apesar de sua característica conciliadora – como diversos aliados o descreveram durante os quatro meses de campanha – alinhar interesses entre os países com discrepâncias significativas de recursos financeiros e poder de barganha é muito complicado.
Por isso, tanto Barbosa como Heni Ozi Cukier, professor do curso de Relações Internacionais da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), concordam em um ponto: Azevêdo terá de buscar objetivos menos ambiciosos. Na atuação situação da economia mundial e da próprio organização, o quixotismo precisa dar lugar ao pragmatismo. “O certo é ele escolher temas que deseja trabalhar e diminuir o escopo do que quer alcançar com eles”, aconselha Cukier. Uma iniciativa alinhada que já está em curso dentro das portas da OMC é um acordo de serviços que 40 países já se interessaram – curiosamente o Brasil não faz parte do grupo. Os detalhes desse acordo devem ser apresentados em dezembro, na reunião ministerial do órgão em Bali, Indonésia, primeiro evento formal do mandato de Azevêdo.