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Polimentos à joia inacabada de Gaudi

No próximo domingo, o papa Bento 16 vai consagrar como Basílica o Templo Expiatori de La Sagrada Família. Resta saber quando ele será concluído, e se os espanhóis, afinal, querem concluí-la

Por The International Herald Tribune
3 nov 2010, 19h21

Na época de sua morte, Gaudí tinha terminado menos de um quarto de seu projeto. O trabalho está agora além da metade do caminho, apesar de o futuro guardar alguns desafios, como a torre principal, de 170 metros de altura

No próximo domingo, o papa Bento 16 vai consagrar como basílica o mais famoso monumento de Barcelona, o Templo Expiatori de la Sagrada Família. Para além da importância religiosa do evento, a visita do papa vai mostrar as últimas características arquitetônicas e artísticas da Sagrada Família, que permaneceu uma obra em progresso desde que seu brilhante arquiteto, o catalão Antoni Gaudí, morreu atropelado por um bonde em 1926.

A chegada do papa foi precedida por uma atividade frenética, com cerca de 300 trabalhadores lutando para garantir que a Sagrada Família – especialmente sua nave e seu altar – estaria pronta para permitir a celebração de uma missa para 7 mil pessoas.

Esse trabalho de construção, no entanto, está ocorrendo em meio a um longo debate sobre se a Sagrada Família está distante demais da visão artística de seu criador. Alguns também argumentam que o apelo turístico do templo – estima-se que receba até 2,5 milhões de visitantes por ano – reside justamente no fato de que ela é uma das maiores obras de arte inacabadas do mundo.

“Estamos correndo o risco de fazer um pastiche do conceito de Gaudí”, disse Narcis Serra, ex-prefeito de Barcelona. “Para tentar acabar esse templo hoje não se seguem mais os planos exatos de seu criador. Do ponto de vista de respeito ao seu trabalho, teria sido muito melhor parar no ponto em que não tínhamos mais certeza de que era exatamente o que ele queria.”

Mas Jordi Bonet, o arquiteto de 85 anos responsável pela construção da Sagrada Família há quase três décadas, lidera um coro talvez mais poderoso que insiste que Gaudi nunca ansiou que um projeto tão monumental fosse completado exatamente como ele havia previsto. Bonet ressalta que Gaudí deixou um certo grau de liberdade artística para os que trabalharam ao lado dele. “Quase toda catedral tem sido o trabalho de muitos homens e muitos séculos”, disse Bonet. “Mesmo quando ele estava no comando, havia 40 escultores trabalhando para Gaudí, e claro que ele os inspirava, intervinha e comentava sobre o resultado – mas manteve o trabalho de vários escultores diferentes.”

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Os próprios comentários de Gaudí também dão credibilidade à ideia de que ele não era nenhum maníaco pelo controle nem determinado a cumprir o calendário da construção. Ele planejou 18 torres para a Sagrada Família, por exemplo, mas disse: “Decidi deixá-las marcadas apenas para que outra geração possa colaborar no templo, como é visto repetidas vezes na história das catedrais. O trabalho da Sagrada Família avança lentamente porque o mestre deste trabalho não tem nenhuma pressa.”

Gaudí foi um católico fervoroso e nos últimos anos têm sido considerado um candidato à santidade. “O homem sem religião é um homem com falhas espirituais, um homem mutilado”, disse ele. Bonet, que também é profundamente versado na liturgia católica, é filho de um arquiteto que trabalhou com Gaudí. Seu pai e Gaudí desenvolveram o que Bonet chama de “uma boa amizade”. Bonet foi introduzido à Sagrada Família aos 7 anos de idade, quando participou de uma missa de primeira comunhão em sua cripta.

Gaudí estava mais preocupado com representações artísticas da natureza do que com religião e queria que o interior da Sagrada Família fosse como “uma floresta”. Seu interesse no mundo natural é o que atrai tantos visitantes a Barcelona.

“Quarenta anos atrás, as pessoas da cidade ignoravam e por vezes rejeitavam o trabalho de Gaudí”, disse Jordi Pere Figuerola Rotger, curador do Museu Diocesano de Barcelona, que abriga cerca de mil documentos assinados por Gaudí. “Aqueles que realmente fizeram a Sagrada Família famosa foram os turistas japoneses, e não por qualquer motivo religioso, mas por causa de sua fascinação pela natureza.”

Na época de sua morte, Gaudí tinha terminado menos de um quarto de seu projeto. O trabalho está agora além da metade do caminho, apesar de o futuro guardar alguns desafios, como a torre principal, de 170 metros de altura.

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Recentemente, Bonet dedicou grande parte de sua atenção para a área do altar, que o papa usará e onde as outras instruções detalhadas de Gaudí – deixadas em textos, desenhos e diversos surpreendentes modelos em gesso – estão apenas em forma de esboços. Entre as contribuições de Bonet estão gravações numa coluna e um altar, ainda em embalagem plástica na semana passada, que ele decidiu fazer em pórfiro, uma pedra de cor vermelho-púrpura. “Tudo o que tinha de Gaudí para o altar era um desenho e medições, mas sinto que é suficiente para chamar a este de interpretação fiel”, disse Bonet.

O próprio papel artístico de Bonet na conclusão da Sagrada Família, no entanto, é bem menos polémico do que o de Josep Maria Subirachs, um artista catalão que começou a trabalhar em uma das fachadas da Sagrada Família em 1980.

Josep Ramoneda, escritor e diretor do Centro de Cultura Contemporânea de Barcelona, descreveu a contribuição feita por Subirachs à Sagrada Família como “lamentável”. E acrescentou: “Isso não tem absolutamente nada a ver com Gaudí.”

Sobre quando a Sagrada Família será concluída, Bonet divide a paciência de Gaudí. Ele disse que os avanços tecnológicos têm facilitado o trabalho de construção, mas disse que o fim da obra ainda é difícil de prever. “Não sei”, disse ele, “mas talvez em menos de um século.”

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