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E o perdedor é… Lars Von Trier

Com frases nazistas, cineasta conseguiu transformar a plataforma de lançamento de seu filme no Festival de Cannes em anticlímax de sua carreira

Por João Marcello Erthal
21 Maio 2011, 09h46

John Galliano perdeu o posto na Dior. Danilo Gentili levou uma baita reprimenda da emissora que o projetou. Lars Von Trier sai pela porta dos fundos da história de Cannes

Causar alguma perplexidade com ajuda da mídia internacional é uma estratégia praticamente garantida para alavancar a visibilidade de um projeto. Quando muitas estrelas competem em pé de igualdade, como no Festival de Cannes, bagunçar o coreto parece ser uma boa opção. Antonio Banderas fez macaquices a pedido dos fotógrafos e teve seu quinhão; Peter Fonda chamou Barack Obama de “traidor de m.” e defendeu seus parágrafos mundo afora. Lars Von Trier quis fazer graça com a desgraça, e leva para casa, em vez da Palma de Ouro, o troféu “mão à palmatória”, com pedidos de desculpa ao público, banimento do festival e uma repercussão ainda fora de controle de suas piadas antissemitas.

Melancolia, título do filme de Von Trier selecionado para a competição principal, cai com perfeição para o astral entre o diretor e seus patrocinadores, num inacreditável anticlímax produzido no espaço e no momento mais prestigiados do cinema mundial. Em alguns minutos, o que era humor de mau gosto ganhou a multiplicação a jato na internet, e o diretor, como quem tenta aspirar o que já foi dito, se retratou. “Se eu ofendi alguém esta manhã com as palavras que disse na coletiva de imprensa, peço desculpas sinceras. Não sou antissemita ou racista de qualquer maneira, e muito menos nazista”, escreveu, em comunicado por e-mail diretamente à agência AFP.

Um detalhe: a foto oficial da lambança traz o cineasta de braço estendido e punho cerrado, exibindo as letras de “fuck” tatuada nos dedos. Era para ser só mau gosto, mas no contexto que se desenrolou a partir dali, a leitura da ostentação adolescente se aproxima da satânica saudação nazista, “Heil Hitler”.

Von Trier e seu staff conseguiram garantir, já nos jornais do dia seguinte, o desmentido junto da notícia principal – sua ‘simpatia’ por Hitler. Mas para explicar o caso era, àquela altura, impossível não citar o primeiro degrau da escada do cineasta rumo ao subsolo: “Durante muito tempo pensei que fosse judeu e era feliz com isso. Ai conheci Susanne Bier (a diretora dinamarquesa judia, autora de Em Um Mundo Melhor, vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro deste ano) e não fiquei tão contente. Então descobri que era nazista, que minha família era alemã. O que me deu muito prazer”, disse. Houve ainda um “entendo Hitler, até simpatizo com ele”, seguido do indisfarçável constrangimento das atrizes de seu longa-metragem, as belas Charlotte Gainsbourg e Kirsten Dunst.

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Ora, era tudo uma piada, diria o cineasta depois – admitindo a estupidez. O diretor já estava, nesse momento, no mesmo grupo de humoristas que o brasileiro Danilo Gentili, que escolheu os trens da morte nazistas para brincar com a reação do bairro de Higienópolis ao projeto de uma estação de metrô. E ao lado de gente bem menos engraçada, como o estilista John Galliano, que, sem credenciais para piadas, disse “amar Hitler”.

Galliano perdeu o posto de estilista da Maison Dior. Danilo Gentili pediu desculpas e, ainda ssim, levou uma baita reprimenda da emissora que o projetou nacionalmente – apesar de ter conseguido o que parecia almejar: muita repercussão e mais seguidores nas redes sociais. Quanto a Von Trier, é cedo para afirmar, mas tudo leva a crer que ele caminha para entrar (e sair) pela porta dos fundos na história de Cannes.

Na Argentina, Melancolia já está vetado. E antes que os pedidos de desculpas esfriassem o assento do diretor no vagão do mau-gosto a direção do festival tratou de fazer sua parte: Von Trier é persona non grata em Cannes, e mesmo que por algum milagre o júri decidisse premiar o filme, ele não levaria o prêmio.

A tragédia de maio de Von Trier em Cannes, pesada como as histórias que ele próprio leva para a tela, cairão bem em um roteiro para aqueles filmes que orbitam sobre o próprio cinema e suas figuras. Mas o mesmo script, em uma indústria que depende de investimentos pesados e patrocínios que misturam dinheiro público e de grandes corporações, pode não pegar tão bem.

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