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Um mês do exílio de Eduardo Cunha

Afastado do comando da Câmara dos Deputados pelo Judiciário, Eduardo Cunha tenta a todo custo sepultar o processo de cassação que avança no Conselho de Ética

Por Da Redação 5 jun 2016, 08h09

Desde a tarde do dia 5 de maio, quando os onze ministros do Supremo Tribunal Ferderal (STF) decidiram apeá-lo da cadeira de presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) mantém sua rotina impassível: acorda antes do sol raiar todos os dias, veste-se com terno e gravata, abotoa o broche concedido aos parlamentares em exercício e inicia sua agenda de reuniões com advogados, intervalada por telefonemas para sua poderosa rede de mosqueteiros em ação no Congresso e a participação na rádio evangélica Melodia, do Rio de Janeiro. É da residência oficial da presidência da Câmara que Cunha ainda comanda algumas das mais importantes articulações políticas ocorridas nos corredores e no plenário da Casa, conforme o interesse em jogo no dia – e eventual promessa de ajuda para salvar seu próprio mandato quando a derradeira votação do processo de cassação chegar.

“É clara a vontade dele de voltar à presidência. A gente chega e ele quer saber das coisas, do clima, do que estão dizendo sobre as ações do governo. Pergunta sobre tudo”, narra um aliado que o visitou recentemente.

Réu na Operação Lava Jato, Eduardo Cunha teve o mandato suspenso pelo Supremo por suspeita de tentar obstruir o processo contra ele no Conselho de Ética. A manutenção do mandato, aliás, é sua principal obsessão uma vez que o foro de deputado lhe assegura relativa distância do juiz federal Sérgio Moro, responsável pelas sentenças da Lava Jato. Segundo relato de seus escudeiros, que o visitam com frequência, Cunha só muda o semblante imperturbável quando uma palavra é pronunciada: prisão. Na semana passada, demonstrava ansiedade ante os rumores que ganharam força em Brasília, segundo os quais a Polícia Federal poderia bater à sua porta com um mandado de prisão expedido pelo ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no Supremo.

“Não estou agindo no conselho, e sim me defendendo de acusações visando convencer da improcedência da acusação”, afirmou Cunha ao site de VEJA.

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Do “exílio”, Eduardo Cunha viu se concretizarem os seus principais acordos políticos, como as canetadas dadas por auxiliares na Câmara dos Deputados. O seu controverso sucessor, deputado Waldir Maranhão (PP-MA), despachou atos com o objetivo de barrar o Conselho de Ética. O peemedebista também conseguiu emplacar aliados em cargos estratégicos na gestão do presidente interino Michel Temer: um dos seus principais braços-direitos, o líder do PSC, André Moura (SE), foi alçado líder do governo na Casa. Moura recebeu o aval do chamado “centrão”, grupo formado por doze partidos, dos quais os principais líderes mantêm-se fieis a Cunha – entre eles, Jovair Arantes (PTB-GO), Paulinho Pereira (SD-SP) e Rogério Rosso (PSD-DF), além do próprio André Moura.

Nos corredores do Congresso e do Planalto, por outro lado, há quem diga que o peemedebista já não tem a mesma influência de 30 dias atrás – o que se tratando da figura e da força conhecidas do peemedebista, ainda não se pode ser traduzido em rendição. Se, até pouco tempo a casa e o gabinete do peemedebista registravam um fluxo constante de aliados, o movimento, a cada dia, é menor. Longe da presidência, Cunha não consegue agradar aliados indicando-os para relatorias de projetos valiosos e para o comando de comissões. “Quando perde a caneta, perde-se a força sobre qualquer pessoa”, resume um congressista que jura seguir fiel a Cunha. Ele reconhece, no entanto, que os conselhos e estratégias do peemedebista seguem sendo adotados.

O estilo truculento também pesa para o distanciamento de parlamentares. Sem a máquina da Câmara, o presidente afastado perde apoio daqueles que não precisam mais suportar o seu destempero. Um deles foi o primeiro secretário da Câmara, Beto Mansur (PRB-SP), um de seus principais aliados até o mês passado. Conforme relatos, o peemedebista chegou a gritar com ele na frente de outros parlamentares enquanto tratava dos benefícios que manteria com o mandato suspenso – a Câmara acabou lhe concedendo todas as prerrogativas, como o salário integral, jatos da Força Aérea Brasileira (FAB) à disposição e a residência oficial.

A maioria dos deputados só aceita falar sobre Cunha na condição de anonimato por medo de retaliações caso ele consiga se safar. “Fica claro que há um enfraquecimento. Mas também é evidente que nos bastidores, como presidente afastado, ele usa todas as forças e armas que tem. O que se diz é que com o desvio do dinheiro da Petrobras, Eduardo Cunha financiou de 120 a 150 deputados. Agora ele tem uma espada na cabeça de cada um que participou desse esquema”, afirma um congressista. Outro ex-colega emenda: “Eu sempre tive uma boa relação com ele, que foi correto e me deu espaço. O ruim é que nunca joga de verdade, de peito aberto. Ele começou a me dar facada pelas costas. Minha relação era política, mas vi que na política eu não posso confiar no Eduardo”, disse.

Esperança – Ainda que a Justiça não tenha definido um prazo para Cunha poder voltar à ativa, o peemedebista ainda alimenta a expectativa de voltar ao comando da Câmara dos Deputados – a próxima eleição da Mesa Diretora é somente em fevereiro do ano que vem. Por isso, ele busca manter-se informado de cada decisão e bastidor da Casa.

Cunha ignora as pressões e resiste a renunciar ao posto, o que abriria caminho para a convocação de novas eleições, a derrubada do seu sucessor, Waldir Maranhão, e ainda seria um aceno para os julgadores de seu processo de cassação.

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Assim como fazia no processo de impeachment de Dilma Rousseff, o peemedebista tem no papel a contabilidade de votos e acredita em uma punição mais branda no colegiado. Pode ser decisivo o posicionamento da deputada tia Eron (PRB-BA). Nos bastidores, fala-se que Cunha teria prometido ao PRB um ministério em troca da absolvição. O presidente da legenda, Marcos Pereira, foi nomeado ministro da Indústria, Comércio Exterior e Serviços.

Retomada da normalidade – Após um início turbulento, a Câmara dos Deputados retoma a normalidade sob a gestão de Waldir Maranhão, que era vice-presidente de Eduardo Cunha. Depois da ridícula tentativa de anular a admissibilidade do impeachment de Dilma, Maranhão equilibra-se na cadeira presidente de maneira estratégica: para fugir de protestos, terceiriza o comando do plenário e de decisões importantes para outros membros da Mesa Diretora. Mesmo com um presidente “fantasma”, projetos prioritários do governo interino de Michel Temer estão sendo aprovados.

“A Casa vai sobrevivendo. O afastamento do Eduardo é ruim porque é ele muito dinâmico, e a Câmara funciona com muita velocidade no trato do regimento e de ações legislativas. As coisas funcionam porque nós, líderes, fizemos funcionar”, afirma o deputado Jovair Arantes, um dos mais próximos de Cunha e membro do chamado “centrão”.

“Para a gente interessa que a pauta da Câmara está andando. Qualquer tipo de envolvimento direto do governo nesse tema gera dificuldades. As coisas estão sendo tocadas, não tem por que a gente ficar em uma angústia”, afirmou o ministro Geddel Vieira Lima, responsável pela articulação política do governo. Geddel fez, na última semana, visita a Eduardo Cunha. Segundo ele, o breve encontro foi apenas um gesto de “solidariedade”.

O presidente do Conselho de Ética, José Carlos Araújo (PR-BA), agendou a votação do parecer que recomenda a perda de mandato de Cunha para a próxima terça-feira. Quem conhece Cunha, duvida.

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