Suspeito de receber propina, ex-diretor da CPTM elevou valor de contratos do cartel
João Roberto Zaniboni assinou aditamentos de contratos com a Alstom. Promotores da Suíça pediram, em vão, buscas na casa do ex-servidor, em 2011
Suspeito de receber propina em contas da Suíça, o ex-diretor de operações e manutenção da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) João Roberto Zaniboni assinou cinco contratos de aditamentos com as multinacionais acusadas de integrar o cartel de trens. Os acordos foram fechados pelo engenheiro entre outubro e dezembro de 2002, nos governos tucanos de Mário Covas e Geraldo Alckmin.
Os aditamentos elevaram gastos da estatal em 11,6 milhões de reais, em valores da época. Na mesma ocasião, segundo o Ministério Público da Suíça. Zaniboni recebeu “numerosos pagamentos” que somaram 836 000 dólares na conta Milmar, de sua titularidade, no Credit Suísse, em Zurique.
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Promotores e procuradores que rastreiam contratos de estatais paulistas avaliam que os extratos bancários indicam o primeiro caso concreto de corrupção na investigação sobre o alcance dos casos Alstom e Siemens – multinacionais investigadas por formação de cartel para obter a supremacia em licitações da CPTM e do Metrô, no período de 1998 a 2008.
Um dos aditamentos que Zaniboni subscreveu, em 20 de dezembro de 2002, fez subir em 4,13 milhões de reais o contrato com a Alstom para prestação de serviços de revisão geral com fornecimento de materiais de 29 trens da CPTM. O valor original do contrato, que fora fechado em 21 de agosto de 1998, saltou de 19,49 milhões de reais para 23,62 milhões de reais.
No mesmo dia em que aditou o contrato da Alstom, Zaniboni fez outros dois acordos, um com a Inepar e o outro com a Bombardier – o primeiro representou acréscimo de 3,08 milhões de reais; o segundo, de 3,13 milhões de reais.
A investigação mostra o caminho da propina até a conta de Zaniboni. A Alstom fez depósitos na França em favor de duas offshores sediadas no Uruguai, controladas pelos irmãos Arthur Teixeira Gomes e Sérgio Meira Teixeira – suspeitos de terem agido como lobistas e consultores da multinacional.
Os aportes foram realizados no período entre 22 de setembro de 1999 e 20 de dezembro de 2002. Os ativos de Zaniboni têm origem em propinas que teriam sido pagas ao engenheiro antes dos aditamentos, segundo o Ministério Público.
“Foi possível comprovar no período entre maio de 2000 e dezembro de 2000 pagamentos isolados dos indiciados Gomes Teixeira e Meira Teixeira a tal João Roberto Zaniboni que foi, entre 1999 e 2003 diretor da CPTM, uma companhia estadual de São Paulo”, diz relatório dos investigadores suíços.
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Consultor – Na semana passada, diante da força tarefa de promotores e procuradores, Zaniboni disse que o dinheiro em sua conta na Suíça tem origem em consultoria que alega ter prestado para os irmãos Teixeira. Ele não detalhou exatamente os serviços e afirmou que não possui cópias dos contratos de consultoria.
O advogado Luiz Fernando Pacheco, que defende o ex-diretor da CPTM, rechaçou a suspeita de propina. “[Zaniboni] recebeu os valores por serviços efetivamente prestados de consultoria anteriormente à posse na diretoria da CPTM”, disse. Pacheco afirma que os aditamentos autorizados pelo engenheiro “foram todos absolutamente legais e têm justificativa plausível por intercorrências no cumprimento dos contratos”. O advogado confirmou que Zaniboni não tem cópia dos acordos de consultoria. “Não teve contrato”, afirmou.
“Seja funcionário ou ex-funcionário, haverá tolerância zero”, disse o governador Geraldo Alckmin. Segundo o governador, o ex-diretor da CPTM já havia sido chamado para falar à Procuradoria-Geral do Estado, que acompanha o caso do cartel, mas não compareceu. Zaniboni não trabalha mais no governo paulista desde 2003.
Busca – Os promotores suíços pediram formalmente ao Ministério Público Federal (MPF) que realizasse buscas na residência de Zaniboni, em fevereiro de 2011. A solicitação, não atendida, ocorreu no âmbito de uma investigação criminal instaurada em Genebra, em outubro de 2008, contra Zaniboni e os irmãos Arthur Gomes Teixeira e Sérgio Teixeira, lobistas da Alstom, por suspeita de lavagem de dinheiro e corrupção.
“Consta dos resultados obtidos até agora que há uma suspeita que companhias do grupo francês Alstom em São Paulo teria corrompido, com a cumplicidade de cidadãos brasileiros, funcionários públicos, no contexto da atribuição de contratos efetuados pela CPTM”, assinalou o procurador federal suíço Stefan Lenz.
Por meio de “pedido de auxílio Judiciário Internacional em matéria penal”, Stefan Lenz requereu ao Brasil que providenciasse os interrogatórios de Zaniboni, dos lobistas Arthur e Sérgio Teixeira e ainda de José Amaro Pinto Ramos. “Solicita-se que o Ministério Público [Federal] comunique, com um aviso prévio de um mês, as datas dos interrogatórios ao Ministério Público suíço e que lhe outorgue a possibilidade de estar presente, de fazer perguntas às pessoas interrogadas e lhes apresentar os documentos apensados e probatórios para recolher seus pareceres”, escreveu o procurador.
Ele insistiu em uma inspeção na casa do ex-diretor da CPTM. “Solicita-se que se efetue particularmente no domicílio de Zaniboni uma busca e se apreenda quaisquer documentos relacionados com o presente processo.”
O pedido não foi atendido, o que surpreendeu promotores e procuradores que compõem força-tarefa para investigar cartel e corrupção no setor metroferroviário.
O procurador suíço apontou para as offshores Gantown Consulting SA e GHT Consulting SA, controladas por Arthur e Sérgio Teixeira. “As análises de fluxos efetuadas na Suíça revelaram que a partir de contas que estas duas pessoas mantêm ou mantinham na Suíça fundos foram transferidos a João Roberto Zaniboni. Há uma forte suspeita de que esses pagamentos foram efetuados em relação com a atribuição de contratos relativos a projetos de transporte pela CPTM à Alstom.”
A Alstom informou que “está prestando todos os esclarecimentos para as autoridades competentes pelas investigações”. A Siemens destaca que partiu dela a iniciativa de denunciar o cartel por meio do acordo de leniência com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
(Com Estadão Conteúdo)