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‘Sou um tucano em busca dos ninhos cariocas’

Depois de 12 anos sem o PSDB lançar nomes para a prefeitura do Rio, Otávio Leite, o candidato do partido à prefeitura, tem a missão de tirar a sigla do anonimato

Por Cecília Ritto e João Marcello Erthal
3 set 2012, 11h26

A candidatura do deputado federal Otávio Leite recoloca o PSDB nas disputas por cargos majoritários no Rio. O partido ficou 12 anos sem lançar candidato próprio, criando áreas de sombra e apagando os contornos de seu eleitorado na cidade e no estado. Para garantir o futuro do PSDB no jogo político do Rio, Otávio precisa, antes de tudo, reencontrar os nichos tucanos cariocas. Atualmente, Otávio patina em 3% das intenções de voto, segundo o Datafolha.

A primeira iniciativa para sinalizar que o partido voltou à disputa foi expor, no horário eleitoral, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o governador Geraldo Alckmin e o senador Aécio Neves. Em termos de apoios locais, o deputado faz campanhas solitárias. O primeiro revés enfrentado pela chapa foi ainda no período pré-eleitoral, quando rivalizou com a vereadora Andrea Gouveia Vieira – que queria, ela própria, ser o nome do PSDB para disputar a prefeitura. Ele saiu vitorioso, mas perdeu um importante apoio na cidade: Andrea agora faz campanha para o candidato do PSOL.

A década em que o PSDB ficou de fora das eleições trouxe uma herança de anonimato desagradável ao deputado, que tenta se destacar através de um discurso crítico em relação aos seus concorrentes. Ainda assim, demonstra confiança para afirmar: “Quem tem mais chance de ganhar do Eduardo sou eu”. Em entrevista ao site de VEJA, Otávio Leite criticou tanto as políticas do prefeito peemedebista quanto as propostas de Marcelo Freixo, o segundo colocado nas pesquisas, a quem atribui ideias “dinossáuricas”.

Depois de tanto tempo sem candidatos tucanos numa eleição majoritária, que cenário o senhor encontra na cidade?

Esses 12 anos de ausência de candidaturas foi um prejuízo, sim. O tempo não volta. É preciso olhar para frente. Estou querendo encontrar o eleitor do PSDB. A vertente tucana, como identidade de um grupo político, existe no Rio e deve ter seus 15% como potencial. Sou um tucano em busca dos ninhos cariocas. O partido tem que ter candidato sempre. Estamos reiniciando o processo. A estratégia é descobrir onde está o eleitorado tucano. Não à toa comecei meu programa com Geraldo Alckmin, Aécio Neves, Fernando Henrique e Marcello Alencar para mandar o recado: ‘Atenção tucanos, existe um candidato do PSDB no Rio’.

Onde está esse eleitorado? O senhor detectou os ninhos tucanos?

Acho que está em uma classe média baixa, nos segmentos que produzem alguma coisa, no microempresário, no microempreendedor, nas pessoas que têm o hábito de reflexão, que acompanham a política e sabem que o Brasil ganhou novo rumo com Fernando Henrique. Esse perfil socioeconômico está em toda a cidade. Aliado a isso vem a minha história de homem público, de militante em muitas causas. Quando elejo a bandeira da deficiência como tema fundamental da campanha, consigo uma votação linear porque há deficiência em todos os bairros do Rio. Venho melhor na classe média, mas minhas votações de deputado sempre foram interessantes em áreas populares, onde não tenho obras e nem centro social.

O senhor aparece com cerca de 3% das intenções de votos nas pesquisas. Há motivos para trabalhar com a expectativa de vitória?

Quem tem mais chance de ganhar do Eduardo sou eu. O Freixo é muito radical. Em pouco tempo as pessoas perceberão o conteúdo daquelas propostas dinoussáuricas, assembleistas e estadistas demais. Houve um debate em uma livraria e o Freixo veio com um papo de que temos que conversar com a iniciativa privada para alguma Parceria Público Privada. Falei: ‘Opa, bem-vindo à social democracia’. É muito fácil fazer o discursinho do contra tudo e contra todos. Do outro lado, está o Rodrigo Maia com uma rejeição de 30%.

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O prefeito Eduardo Paes já esteve no PSDB. Como é a relação de vocês hoje?

Temos saudade do aguerrido deputado Eduardo Paes na CPI dos Correios, ajudando a desvendar a estrutura mafiosa que se instaurou no Palácio do Planalto. Mas a incoerência dele ao tentar apagar essa fase da história e se aliar ao Lula, a quem ele frontalmente combateu, é explícita. É uma práxis política completamente sem pruridos. Vale tudo. É o império do pragmatismo. Lamentavelmente, a coerência não tem a menor importância como valor na vida pública.

O senhor não teve o apoio da tucana Andrea Gouveia Vieira, uma das vereadoras mais atuantes da Câmara. Ela, inclusive, anunciou o apoio ao candidato do PSOL, Marcelo Freixo, depois de não ser a escolhida do PSDB para disputar à prefeitura. É uma perda para a sua campanha?

No fundo, é um alívio. O problema passou a ser do Freixo. Quem tem de explicar a Andrea agora é o Freixo, porque ela é um problema permanente. A Andrea perdeu em todas as instâncias partidárias e queria que fosse decretado o direito absolutista de ela ser a candidata à prefeitura. É um absurdo e uma falta de respeito às instâncias partidárias. Ela agora é um problema do Freixo por uma razão muito simples: a postura ideológica do PSOL é radicalmente antagônica à do PSDB. Freixo fala muito de alianças espúrias. Então quem tem que explicar a relação entre o socialismo dinossáurico que ele propõe e o capital de uma pessoa que é da elite do Rio de Janeiro não sou eu. É ele.

No primeiro debate na TV, a sensação foi a de que os candidatos de oposição estavam fazendo a corte entre si. Foi uma estratégia?

Freixo e Rodrigo Maia só faltaram sentar em um botequim e pedir uma cervejinha para trocar ideia. Não tive a sorte no sorteio de poder perguntar ao Paes ou ao Freixo. As pessoas precisam saber que o candidato do PSOL transferiu o título para o Rio há apenas um ano. Ele é de Niterói. Quando faz o discurso de que prefeito não é síndico, confessa não conhecer a cidade. O prefeito tem de ser sindico e conhecer a cidade. Um prefeito que não viveu suficientemente o município ficará nas mãos dos secretários e terá dificuldade de decisão.

A Cidade da Música foi inaugurada às pressas pelo ex-prefeito Cesar Maia sem todas as obras estarem concluídas. A megaestrutura ainda não funciona. Qual é a solução?

Minha proposta é fazer uma licitação internacional. O custeio da Cidade da Música para o poder público anual é previsto em algo como 35 milhões de reais. Temos que desonerar a prefeitura desses valores e conceder por completo a gestão da Cidade da Música à iniciativa privada. Os 35 milhões serão investidos na zona oeste para a construção de um centro de cultura popular. O prefeito, por picuinha política, não colocou para funcionar.

A proximidade com Cesar Maia, de quem o senhor foi vice-prefeito, trouxe mais benefícios ou prejuízos?

Tive uma convivência muito protocolar com Cesar Maia. Não participei de nenhuma decisão. Eu propus a criação da secretaria da pessoa com deficiência. Ele criou, mas não deu recursos e nem o apoio que deveria. Achei que o Eduardo pudesse dar uma turbinada. Mas ele deixou de lado por completo. Encaro minha participação no governo Maia como uma etapa na vida de um homem. Dizem que nas adversidades você aprende muito. Portanto, concluo que amadureci.

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Cesar Maia está cotado para ser o vereador mais votado nessas eleições. Pelo que o senhor conhece do trabalho dele, seria um bom legislador?

Se ele se dedicar, for disciplinado, gastar tempo com o mandato, terá uma contribuição importante a dar, sem dúvida nenhuma. Mas existe sempre o risco de ele encher o saco. Assim como ele encheu o saco no último governo dele. No final, não estava nem mais aí. Ficava na solidão de um computador trancado na sala sozinho. Ele não conversava com os secretários. O Cesar promovia almoços no gabinete dele. Eu conto nos dedos as vezes que fui. Houve um com o jornal The New York Times que começou uma hora e terminou sete horas da noite. Ele falou 95% do tempo.

Eduardo Paes levanta a bandeira do alinhamento das três esferas de poder. Como o senhor acha que seria um governo do PSDB na cidade com PMDB no estado e o PT na presidência?

Dentro de uma concepção republicana, não haveria qualquer dificuldade. A vontade das urnas tem que ser respeitada por todas as instâncias. No entanto, há dois aspectos muito preocupantes no contexto do Rio. Em primeiro lugar, o argumento de que a unidade é o que propicia êxitos e ganhos é falaciosa. Na saúde, por exemplo, não existiu evolução em termos de uma gestão organizada e racional. A badaladíssima aliança, do ponto de vista prático, não trouxe avanços na saúde e no transporte. Outro ingrediente muito nocivo é o argumento autoritário de que só com os três alinhados é possível acontecer algo de bom para o Rio. Isso é típico de uma postura totalitária, que não aceita a convivência pacifica e harmoniosa entre os diferentes.

Em que o senhor não concorda com o projeto Rio 2016?

O BRT Transbrasil, linha expressa de ônibus que ligará Deodoro ao aeroporto Santos Dumont, é questionável. Custará 1,2 bilhão de reais. É melhor gastar com segregação de linhas de trânsito e desapropriações, como será feito, ou adquirir mais composições para o trem? Mas o delírio maior do Eduardo é o Elevado da Perimetral. Todos os prefeitos quiseram derrubá-lo, mas tiveram o mínimo de bom senso em dialogar e verificar que o custo-benefício não se justifica. Essa discussão se interrompe em cinco minutos quando se examinam as condicionantes e as consequências. Gastar 1,5 bilhão de reais para derrubar o viaduto, fazer um túnel, colocar as pessoas em um congestionamento e criar uma via paralela – cuja área útil para passagem de veículos permanece a mesma – é questionável.

Se eleito, o senhor aproveitaria alguma iniciativa realizada pelos governos tucanos em São Paulo?

O que eu e Serra faremos, quando prefeitos, será implantar um programa de reciprocidade turística entre as duas cidades. Vamos organizar, no trade turístico das duas cidades, preços menores. Nos fins de semana, quando a oferta de assentos no avião é muito maior, nos esforçaremos para que as aéreas tenham preços mais reduzidos.

Em termos de programas de governo, qual saída o senhor vê para o problema do crack?

O crack não entorpece. Ele mata. Há 1% de brasileiros no crack hoje. A abordagem com a população de rua e usuários de crack tem de ser humana. Ao se constatar a incapacidade plena de discernir, compreender e raciocinar o poder público deve acolhê-la na busca da recuperação. Parece que o problema do crack surgiu há alguns meses para o atual prefeito. Ele chegou a organizar um oba-oba no Palácio da Cidade com o ministro da Justiça para anunciar 400 milhões no combate ao crack. Isso é uma mentira. Os números mostram que a prefeitura investiu 300 mil por mês no ano passado. Enquanto gastou 171 milhões em publicidade em quatro anos. Hoje, o que funciona de maneira silenciosa e com taxa de eficácia muito interessante são os grupos religiosos que atuam na recuperação de drogados. Acho que a prefeitura tem de dar todo o apoio.

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Qual é a sua posição em relação à descriminalização das drogas?

Eu sou a favor que se dê ao usuário um tratamento de saúde pública e não tratamento penal. Mas sou contra a comercialização da maconha. Trata-se de uma razão de mercado. Seria um equívoco permitir o comércio da maconha porque a repercussão que se teria na prática, na economia, teria o seguinte contorno: os plantadores de abóbora, mandioca e tomate vão preferir cultivar esses produtos ou a maconha? Você vai ter uma super plantação, super produção, super oferta e uma diminuição radical no valor da droga. Será um convite à proliferação e ao consumo da maconha.

E em relação ao casamento gay e à adoção de crianças por esses casais?

Há uma decisão clara do STF em relação a isso. A sociedade ganhou essa substância jurídica e é preciso reconhecer e respeitar. Quanto à adoção, respeito as decisões de juízes que têm permitido, mas acho que é um tema que precisa amadurecer do ponto de vista técnico e cientifico. Eu não questionaria um juiz que decidiu conceder a adoção, após examinar profundamente as personalidades dos pais, de uma criança completamente órfã, desprovida de futuro.

O senhor é favorável à descriminalização do aborto?

Sou contra a descriminalização do aborto por concepções religiosas.

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