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Os furos da tese de defesa do goleiro Bruno

Principal advogado do jogador, Rui Pimenta, que admitia a existência do crime, passou a afirmar que Eliza Samudio não foi assassinada. Acusados vão a júri popular nesta segunda-feira, em Contagem, Minas Gerais

Por Leslie Leitão 19 nov 2012, 07h57

Enquanto esteve no Flamengo, o goleiro Bruno Fernandes foi o autor de defesas memoráveis. Com a faixa de capitão do clube de maior torcida do Brasil, levantou a taça do Campeonato Brasileiro de 2009. Entre as apostas do futebol para o futuro do atleta, estava a de que poderia ser ele o goleiro da Copa do Mundo de 2014, quando a competição ocorrerá no Brasil. O desaparecimento da ex-amante Eliza Samudio, em junho de 2010 – enquanto a Seleção Brasileira disputava a Copa da África – mudou o que se desenhava para Bruno. A partir das 9h desta segunda-feira, ocorre o ato final do que pode ser a transformação de um ídolo do futebol brasileiro em um condenado por um crime macabro, com detalhes de crueldade e frieza que atraíram os olhos de todo o país para a região metropolitana de Belo Horizonte, onde aconteceu o crime. Bruno e os demais acusados de matar Eliza vão a júri popular em Contagem, região metropolitana de Minas Gerais. A previsão é de que as sessões se estendam por duas semanas. O site de VEJA vai acompanha todos os movimentos no Fórum de Contagem e terá, diariamente, análises sobre o embate entre o Ministério Público e os advogados de defesa no júri.

O futuro do goleiro que já foi considerado o melhor do Brasil depende, agora, de advogados que tentam livrá-lo de acusações fulminantes – algumas indefensáveis. Depois de representado pelo controverso criminalista Ércio Quaresma Firpe, afastado do caso por ser usuário de crack, e pelo renomado paranaense Claudio Dalledone Júnior, que abandonou a causa após parentes e amigos do réu se envolverem em uma tentativa de compra de habeas-corpus, Bruno terá a seu serviço no Tribunal do Júri de Contagem o advogado Rui Pimenta. A primeira missão do advogado será explicar, antes mesmo dos desencontros de versões dos acusados, as contradições das teses que apresenta para o cliente.

Pimenta foi procurado pela família do goleiro em dezembro de 2011, aconselhada pelo ex-zagueiro Paulão. O novo advogado propunha uma mudança na tese de defesa. Quaresma e Dalledone Júnior sustentavam, como havia dito Bruno, que não havia crime, e Eliza estaria viva, desaparecida por decisão dela própria. Pimenta disse, em entrevista a VEJA, gravada em áudio, que não concordava com essa versão. “Até então, a defesa tinha uma filosofia de que não tinha corpo, não tinha crime. Advogado cascata. É tudo advogado fraquinho. Não há necessidade. Quando entrei disse: Bruno, só entro se assumir esse ‘trem’, que essa mulher morreu mesmo. Eles mataram essa mulher. Você não sabe, mas eles mataram. Então não adianta continuar nisso. Não vai dar. Você vai se enrolar com eles. Ele disse: então estou entregando meu destino nas mãos do senhor”, afirmou Pimenta.

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As duas horas de entrevista de Rui Pimenta a VEJA foram gravadas na sala da casa do criminalista, em um bairro nobre de Belo Horizonte. Em seis momentos diferentes ele deixou claro que não havia mais como negar o óbvio: Eliza Samudio estava morta. (Leia a entrevista abaixo)

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Quase 11 meses após assumir a defesa do goleiro, e às vésperas do início do julgamento, Rui Pimenta desmontou a linha de defesa criada por ele mesmo. Passou a não atacar os antigos defensores (Ércio Quaresma, por exemplo, continua na defesa de Bola) e surpreendentemente, na edição do ‘Fantástico’, da Rede Globo, na semana passada, decidiu ressuscitar Eliza e passou a negar a existência do crime. “Nasceu uma história de homicídio que é ficção. Não houve esse crime. Eliza queria uma ascensão na carreira pornográfica. Existe uma teoria de que está num país do Leste europeu. E tá fazendo a vida dela lá”, afirmou, repetindo uma hipótese para a qual não apresenta fundamentos. E, em vez disso, aproveita um detalhe do currículo de Eliza Samudio: o de ter participado de filmes de sexo explícito pouco antes de conhecer Bruno.

Curiosamente, a mudança de estratégia se deu pouco depois de o ex-advogado de Bruno, Ércio Quaresma, ter afirmado que bastaria “uma piscada de olho” para o goleiro manifestar seu desejo de trocar de defensor. Na tese de Quaresma, propalada minutos depois de absolver Bola em outro julgamento de homicídio no mesmo Tribunal de Júri de Contagem, na semana passada, Bruno estaria prestes a destituir Rui Pimenta, Marcus Vinicius Pimenta Lopes e Francisco Simim – o trio que o representa atualmente.

Explicar como afirmou, em momentos diferentes, versões incompatíveis para o que ocorreu em junho de 2010 com o goleiro Bruno e os demais acusados de participar da morte de Eliza Samudio é só uma parte do problema para Rui Pimenta. Antes mesmo de ser formalmente acusado do crime, Bruno se enroscou num emaranhado de evasivas que, pouco a pouco, mostraram-se inconsistentes.

No momento em que Eliza Samudio desapareceu, havia na Justiça uma disputa pelo reconhecimento da paternidade do menino Bruninho. Bruno negava não só participação na trama, como dizia, ainda na condição de atleta do Flamengo, que não tinha contato com a moça havia muitos meses. A mentira foi desmontada com a quebra de sigilo telefônico, os depoimentos de seus primos e funcionários. Eliza, soube-se logo, estava no sítio do jogador, em Esmeraldas, onde ele dava uma festa, acreditando que havia ali um álibi. Por estar entre amigos, fazendo churrasco e jogando bola, não poderia ser um assassino. O tiro saiu pela culatra: Bruno foi apontado como mentor, pela investigação da Polícia Civil mineira, e levou junto com ele para o banco dos réus a turma do churrasco.

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Leia trechos da entrevista de Rui Pimenta a VEJA, em 2011:

Por que o senhor mudou a versão adotada pela antiga defesa do Bruno?

Até então a defesa tinha uma filosofia de que não tinha corpo, não tinha crime. Advogado cascata. É tudo advogado fraquinho. Não há necessidade. Quando entrei disse: “Bruno, só entro se assumir esse trem, que essa mulher morreu mesmo. Eles mataram essa mulher. Você não sabe, mas eles mataram. Então não adianta continuar nisso. Não vai dar. Você vai enrolar com eles. Ele disse: então estou entregando meu destino nas mãos do senhor.

O senhor vai defender a tese de crime passional?

Vou defender que ele não participou do crime da moça. Que ele não participou. O que me preocupa é a imagem dele, que vai ser julgado pelo povo. Está pagando por um crime que não cometeu. Vai ser julgado pelo povo de Contagem, mas queria que ele fosse impronunciado, porque não há prova de que ele quis ou desejou a morte de Eliza Samudio. O (crime de cárcere privado, lesão corporal e constrangimento ilegal) do Rio, sim! Ele foi condenado porque ele concorreu. Esse aí (assassinato, em Minas), não!

O senhor chegou a dizer que haveria um amor homossexual entre Bruno e Macarrão. Qual era a relação entre os dois?

Macarrão não era otário. Ficou percebendo que o Bruno queria o menino. Um herdeiro, homem. Que já não era mais aquele homem que queria que abortasse. O Macarrão foi manjando tudo. Mas tinha que fazer o que o Bruno queria. Dava pensão e dinheiro para ela comprar presente. Mas aos poucos brotou nele (Bruno) um sentimento que ele não conhecia. Em toda folga, ele vinha para o sítio e queria comprar apartamento na Pampulha para ela deixar o menino e poder vê-lo. O Bruno foi o maior otário! Nunca perguntei se eles já fizeram sexo. Por questão de ética não posso perguntar isso ao meu cliente. Não pergunto. Não pode ser escrachado, senão viro um Quaresma da vida. Mas depois que o Bruno começou a conviver com Eliza eles não tinham mais nada, só amizade e um filho juntos. O Macarrão ficou enciumado. Pensou que ela ia desbancar ele. Começou a criar problemas para ela. Não dava recados dela para ele. E ele já tinha um afeto tão grande que colocou aquilo, que não é uma tatuagem, e sim um outdoor, nas costas. ‘Bruno e Maka, amor eterno, e tal’. Isso é coisa de homossexualidade, que quem explica bem é Lacan, Freud. Já vi pai e filho fazerem tatuagem. O pai é herói, aí o filho manda fazer homenagem do pai no braço. Ou o pai que tatua o filho que morreu num acidente. Mas de homem para homem. Não dá! É uma prova de amor.

Quem decidiu matar?

O Macarrão e o Bola montaram o esquema. Tem muita nuvem nebulosa nesse caso. Mas o advogado trabalha com fatos. Bola e Macarrão tinham um esquema para acabar com ela. Ao arrepio do Bruno, que saiu da pobreza e conheceu a glória. Ele chegava para treinar e as mulheres todas queriam tirar foto com ele, andando de BMW…

E o Bruno não sabia de nada?

Entendo que o Bruno não está por dentro dessas coisas. Não sabe nem mexer no computador. O Bruno é uma moça. Ele falou para a Eliza que acertava com ela aqui (em Minas). Ficou na faixa de uns 15 mil. Ele providenciou e deu outro dinheiro para ela pagar plano de saúde para o menino. Ele deu 30 mil para o Macarrão e ele foi embora (na noite do dia 10, em que Eliza desapareceu). A Eliza não foi torturada no sítio. O Bruno não admitia sacanagem com ninguém. Ele é gente de Deus. Um meninão. O Bruno foi traído de forma violenta pelo Macarrão, junto com esse Bola. E colocaram o (Ércio) Quaresma, que era advogado do Bola há muito tempo. Pegaram o Ércio fumando crack. E essa era a cabeça que tava comandando tudo. Não tinha como dar certo. Ércio é um débil mental, digno de dó. Um sujeito advogado ficar fumando crack. Se fosse cocaína ainda era uma droga social. A gente admite isso tudo. Nunca usei, mas a gente sabe. Por isso digo: na mão dessas pessoas o Bruno é um otário.

A defesa do Ércio Quaresma tentou proteger o Bola?

Você não pode ao mesmo tempo advogar para pessoas com ações diferentes no mesmo processo. O Bola entra como assassino, o matador. Quem cometeu o crime? O Bola! E os outros concorreram de alguma forma para cometer o crime. Sim, com exceção, no meu entendimento, do Bruno. Não tenho dúvida nenhuma e vou te explicar porque. O Bola é matador profissional, mata por dinheiro. Ele é um caçador. O sujeito mata para receber dinheiro. O Édson Moreira (então diretor Divisão de Homicídios) é um grande delegado, mas cometeu um pecado capital. Quando pegou o menino para fazer o trajeto, em Vespasiano, o menino estava com medo. E quem mexe com droga sabe disso, que quem dedura, morre. Chegaram lá, o menino falou: “Foi tudo aqui”. Porque o menino sabia que se levasse ao sítio (do Bola), onde tinha marca de tudo, ele seria morto. Tanto que vasculharam e não acharam absolutamente nada (na casa). Cheio de sangue lá (no sítio de Bola). Mas ele (Jorge Luiz) poderia dizer: eu não dedurei não. Aguentei o pau mas não falei nada. E encerrou o assunto. Sabe quando a polícia chegou ao sítio? Só 32 dias depois do desaparecimento. Aí desmontaram tudo, não acharam vestígio de sangue, não acharam nada. Levaram Eliza para o sítio, mataram mesmo, do jeito que o menino falou. E lá não tinha canil, devia ter um, dois cachorros. Ela está no sítio. Acha que ele ia sair com um presunto (cadáver) no carro? Ia correr o risco de ser parado pela polícia? Não! Ela está enterrada lá.

O senhor acha que só o Bola sabe onde está o corpo?

Minha opinião pessoal é que quem estava lá sabe. (O Bola) ia levar o corpo sozinho? Deve ter falado ‘agora vocês ajudam aí. A cortar. Segura aí, carrega a pá. Ia sair com o corpo na sacola sozinho, fazer o buraco e enterrar? Se os dois estavam lá e tudo era assassino? O que o Bola fez foi assessorado até o final pelo Macarrão e pelo menino (Jorge Luiz Lisboa Rosa, primo do goleiro). O Bruno é um bobão. Negócio dele é revistinha de Pato Donald. E eles sabiam a mediocridade intelectual dele.

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