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Reduto boêmio de São Paulo sofre com a falta d’água

Na Vila Madalena, copos de vidro deram lugar aos de plástico. Restaurantes chegaram a fechar por falta de abastecimento. Sabesp nega racionamento

Por Andressa Lelli
4 ago 2014, 11h14

Copos de vidro, muitos deles artesanais, com estampa, sem estampa, de diversos formatos e cores estão sendo devolvidos às prateleiras e substituídos por um tipo padrão: o copo de plástico. Isso já virou rotina em bares da Vila Madalena, reduto boêmio na Zona Oeste da capital paulista, que abriga alguns dos bares mais badalados da cidade. É o resultado de cortes de fornecimento de água no bairro durante a madrugada – que os moradores da região chamam de racionamento disfarçado.

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Segundo moradores e comerciantes da Vila Madalena ouvidos pelo site de VEJA, a água começa a escassear das torneiras durante a madrugada, o que os obriga a se desdobrarem para chegar ao dia seguinte com água na caixa até a volta do fornecimento. Por isso, os bares decidiram recorrer a alternativas para que não fosse preciso fechar as portas.

Na última quarta-feira, a cafeteria Coffee Lab não tinha água e teve de permanecer fechada. Em sua página no Facebook, a proprietária, Isabela Raposeiras, reclamou que a Sabesp (empresa de abastecimento do Estado) não avisou sobre a falta d´água. “No water. No warning from Sabesp. Vamos aproveitar o dia para fazer treinamentos”, escreveu. A interrupção do fornecimento também afetou o Restaurante Alternativa Casa do Natural, que não pôde servir pratos de comida aos clientes, o bar Piratininga e o Empanadas Bar.

Os donos dos estabelecimentos também reclamam do horário que as torneiras secam: no período de maior rotatividade de clientes. “Esse problema já ocorre há um mês e fica ainda mais complicado aos fins de semana, quando o movimento é maior”, diz Alex Oliveira, gerente do bar Quitandinha. Ele disse que o bar já é adepto dos copos de plástico a partir da meia-noite. Contudo, clientes como o publicitário Bruno Carrillo, de 24 anos, reclamam da troca. “Mesmo que economize água, acho mais prejudicial ao meio ambiente o uso do copo plástico”, diz.

O gerente do Quitandinha reclamou que as campanhas essenciais só começaram porque a água minguou e explicou que o desconto dado pela Sabesp não serve para estabelecimentos comerciais como os bares. “Aqui, a água é realmente necessária porque precisamos fazer comida. Não tenho como economizar”, afirma. Outros estabelecimentos, como os bares Posto 6, Seu Domingos, Dona Nina, Salve Jorge e José Menino também estão mudando os hábitos para tentar lidar com a situação.

O bar Coutinho optou por não limpar o salão todos os dias, como era de costume. “Passamos pano com um produto forte no salão todos os dias e deixamos para lavar com água duas vezes na semana”, disse o gerente Fernando Azadinho. A Vila Madalena, que já era conhecida pelos paulistanos, ganhou ainda mais evidência na época de Copa do Mundo, quando foi transformada em ponto de encontro em dias de jogos. Nas ruas não se vê mais aquela multidão que havia na Copa. Nem a água aparece mais por lá.

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Falta lá também – E não é apenas o comércio que sofre com os cortes pontuais: moradores de diversas regiões da cidade reclamam da situação – e já adotam medidas para driblar a falta d’água. Na Zona Norte da cidade, são comuns os casos de moradores que acumulam roupas e louça para lavar de uma só vez. Dessa forma, preservam água para garantir as necessidades básicas. “No Imirim falta água desde maio, quando começou a captação do volume morto. O fornecimento diário é escasso e não tem água à noite”, disse o produtor de TV Vinícius Leonelli, de 27 anos, que estava em uma mesa do bar Coutinho acompanhado de um amigo. Leonelli comentou também que reutiliza a água da máquina de lavar roupas para lavar o quintal e desliga o registro à noite.

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A mesma situação ocorre no Ipiranga, bairro da Zona Sul de São Paulo, na casa do estudante Marco Luiz Netto, de 19 anos, que à noite toma banho de três minutos para não acabar com a água que sobra na caixa ao fim do dia – além de deixar para lavar toda a louça e roupa na manhã seguinte, quando volta o fornecimento.

Em Santo André, o quadro não é diferente. Os cortes ocorrem todos os dias desde o fim de 2013, segundo o morador do bairro Jardim Las Vegas Allan Bezerra, de 31 anos. A concessionária responsável pela região é o Serviço Municipal de Saneamento Ambiental de Santo André (SEMASA), porém a água distribuída é comprada da Sabesp. Bezerra disse que há dias em que ele fica sem água por doze horas e o caso mais crítico foi quando teve de tomar banho na casa de parentes e comprar água na padaria para tomar remédio. “Ultimamente a água estava com um cheiro muito forte de piscina com cloro, não dava para cozinhar com ela nem consumi-la”, afirmou.

Racionamento? – Já a Sabesp afirma que não há racionamento. Comunicou, no entanto, que reduz a pressão na rede à noite visando reduzir as perdas de água por vazamentos e afirmou que essa redução não priva consumidores em nenhuma região de São Paulo de receberem água. Diz, ainda, que a falta d’água pode se dar em razão das dimensões da caixa do estabelecimento ou da residência, que pode ser menor do que o exigido pela ABNT.

Em contrapartida, o Instituto Brasileiro de Defesa ao Consumidor (Idec) enviou uma carta à Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo (Arsesp) relatando a evidência do racionamento e solicitando um posicionamento urgente à população. “A campanha do Idec recebeu, até o momento, 494 relatos – uma média de catorze reclamações por dia -, ou seja, está evidente que o racionamento está ocorrendo”, afirma a advogada do Idec, Claudia Almeida.

Na semana passada, o governo paulista foi notificado da recomendação do Ministério Público Federal (MPF) para que seja implantado o racionamento de água nas regiões abastecidas pelo Sistema Cantareira. A partir da notificação, começou a correr o prazo de dez dias para que o Palácio dos Bandeirantes e a Sabesp apresentem um plano para colocar a medida em prática imediatamente. A Sabesp alega que o abastecimento de toda região está assegurado até a chegada do próximo período de chuvas, prevista para outubro. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, afirmou no sábado que “não pretende mudar nenhuma estratégia” relacionada ao abastecimento de água do Estado. “A população tem aderido e ajudado muito através do uso racional da água. Noventa por cento da população reduziu o consumo de água”, disse. “Seria uma atitude até irresponsável fazer racionamento, pois poderíamos perder toda a economia obtida.”

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