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O melhor CSI do mundo

O português Duarte Nuno Vieira ganhou no ano passado o prêmio mais importante do mundo para os peritos criminais

Por Pedro Dias Leite 5 jul 2015, 11h40

O professor Duarte Nuno Vieira é o melhor perito criminal do mundo. No ano passado, recebeu a Douglas Lucas Medal, o prêmio mais prestigioso da medicina legal e das ciências forenses, concedido apenas uma vez a cada três anos – juntou-se a cientistas como Alec Jeffreys, que descobriu a utilização do DNA para investigações policiais. Vieira ocupa a presidência do Conselho Europeu de Medicina Legal e do Conselho Forense Consultivo do Tribunal Penal Internacional. Ele virá ao Brasil nas próximas semanas, como assessor especial das Nações Unidas, para investigar o estado das prisões no Brasil. Leia a seguir a entrevista que concedeu a VEJA, por telefone.

O que imaginamos que só exista nas séries de TV, mas já tem aplicação na vida real em investigações criminais? Uma das áreas mais novas é a palinologia, uma parte da botânica que se dedica ao estudo dos pólens. A partir do pólen encontrado nas vias respiratórias de um indivíduo que aparece morto num parque, por exemplo, podemos saber se ele foi morto naquele local ou colocado lá. Se dentro das vias não tiver o pólen daqui, significa que não respirou ali, e portanto não foi morto lá. Também já conseguimos rastrear os trajetos de algumas drogas a partir dos pólens que vêm incorporados ao produto – onde ela foi cortada, embalada, por onde passou. É uma grande arma no combate às rotas do narcotráfico. E isso vale para tudo, até para descobrir por onde passou uma obra de arte roubada, por exemplo. Mas há muitos outros avanços. Tudo aquilo que existe de desenvolvimento tecnológico tem repercussão na área policial médico-forense, que nada mais é do que a aplicação de conhecimentos científicos para a resolução de problemas jurídicos. Isso vale para a química, a antropologia, a medicina.

E no campo das autópsias, uma das áreas mais antigas da investigação forense? Há avanços? Com o advento das ressonâncias magnéticas, há a chamada “virtópsia”, isto é, a autópsia virtual. Mesmo sem abrir o cadáver, é possível ver o que há lá dentro. E as imagens ainda ficam gravadas, o que ajuda no processo judicial. É uma prática muito útil em países onde, por questões religiosas, as autópsias suscitam mais dificuldade, como no Oriente Médio e em algumas partes da Ásia.

Ainda é possível limpar a arma com um pano, como nos filmes, para apagar as digitais? Hoje já é possível recuperar as digitais mesmo quando houve limpeza, algo impensável há alguns anos atrás. Mesmo assim, se as coisas forem muito bem feitas, ainda dá para eliminar completamente esses vestígios. Ou então contaminar a cena do crime de tal forma que seja impossível, por exemplo, identificar os vestígios de DNA.

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Então existe um crime perfeito, impossível de ser solucionado? Não sei se existe, mas estou convencido de que possa existir. Quem for um profundo conhecedor das técnicas consegue de fato dificultar muito a investigação.

Há algum caso? Sim, na Suíça, houve um caso, em que inclusive atuei como perito. Era um investigador francês, que trabalhava no campo da genética, suspeito de matar a madrasta. Como conhecia muito do tema, ele espalhou produtos químicos que não permitiram fazer uma identificação do DNA do criminoso.

E ele foi condenado? Primeiro foi absolvido, mas o procurador-geral da Suíça recorreu e ele acabou condenado a dezoito anos. Conseguimos provar que ele próprio foi o responsável disfarçar a cena do crime, o que só alguém com os conhecimentos dele poderia ter feito, que aquilo não era acidental.

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Então o senhor diria que hoje já é possível descobrir quase tudo? Infelizmente, não. As séries de televisão, do estilo do CSI, trouxeram essa imagem de que dá para descobrir tudo, mas nem sempre é assim. Mesmo com os melhores meios, nem sempre se consegue chegar a resultados concretos. As ciências têm limites.

Além da infalibilidade, em que mais a vida real difere do CSI? Para começar, lá há sempre equipamentos para tudo, e tudo é muito rápido, em duas ou três horas. A prática forense não é assim. Se um indivíduo foi intoxicado e não sei a causa, não vou investigar milhares de tóxicos, isso sairia uma fortuna. Começo a procurar pelos quatro tipos mais frequentes de intoxicação no país. Se der negativo, passo para o grupo seguinte de tóxicos, e assim por diante. Às vezes, uma investigação pode durar meses.

E há uma data a partir da qual é impossível recuperar o material genético, por exemplo? Não, cada caso é um caso. Mas há um princípio nas ciências forenses: o tempo que passa é a verdade que foge. Quanto mais tempo passa, pior. Mas em alguns casos pode-se chegar a uma conclusão muitos anos depois. Uma mancha de sangue se mantém durante anos em uma peça de algodão. É só ver o que aconteceu com o Clinton — muitos anos depois o vestido de Mônica Lewinski estava lá guardado, e lá estava o DNA dele. É possível investigar crimes até séculos depois.

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