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‘O Brasil vive uma cleptocracia’

Político do PSB, que apoiou Dilma Rousseff nas eleições, afirma que politicamente não se pode isentar Lula e Dilma do escândalo do petrolão

Por Laryssa Borges Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 17 mar 2015, 11h21

“Se o povo não bater às portas do Congresso, os políticos vão se safar”

Em 2014, às vésperas do acirrado segundo turno entre Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB), o senador João Capiberibe (PSB-AP), que acabara de deixar a coordenação da campanha da socialista Marina Silva, enfrentou o partido e decidiu apoiar a petista na disputa pelo Palácio do Planalto. Quase cinco meses e uma infinidade de denúncias de corrupção depois, o congressista, histórico rival do clã Sarney, afirma publicamente que nem Dilma nem o ex-presidente Lula podem se eximir da responsabilidade no escândalo que assola a Petrobras. Mais: cobra o afastamento imediato dos presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ambos investigados pelo propinoduto na estatal, e diz que a sociedade deve exigir do Congresso a punição dos corruptos que roubaram dinheiro da petroleira. “Estamos vivendo uma cleptocracia”, resume.Leia a entrevista ao site de VEJA.

O senhor defende que Renan Calheiros e Eduardo Cunha se afastem das presidências da Câmara e do Senado. Por quê? A investigação não significa condenação, mas atinge referências importantes da pessoas e chefes de Poder, componentes de comissões que tem a ver com fiscalização, com CPI, Conselho de Ética e a direção do Senado e da Câmara. Mesmo não sendo uma condenação, ela cria constrangimentos. Para evitar que esse constrangimento se disseminasse entre os parlamentares, Renan Calheiros e Eduardo Cunha deveriam se licenciar durante as investigações. O afastamento dos dois seria uma demonstração de que eles, em nenhum momento, usariam essas funções importantes, a segunda e a terceira na linha sucessória, como escudo para se proteger da investigação.

O senhor fala em afastamento para evitar constrangimentos. Mas a impressão que passa não é a de que os políticos fingem que são vítimas e que nada está acontecendo de fato? É uma atitude autista do parlamento não perceber que a crise não foi gerada de fora para a dentro. Parece que não caiu a ficha do Congresso. São 13 senadores sob investigação e 22 deputados federais. Concretamente, a crise é uma crise do parlamento e a instituição do parlamento está sob suspeita. Precisamos afastar essa suspeita para que o Congresso dê respostas à sociedade.

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É factível que algum deles se licencie? Depende da evolução das investigações. Se aparecerem novos elementos contra Renan ou Eduardo Cunha, fica insustentável. O que me parece muito grave é esse autismo do Congresso, essa tentativa de dizer que aqui não passa nada ou de que aqui não há crise. Não tem como separar essa crise do Congresso. Os executivos da Petrobras tinham uma associação com empreiteiras e políticos. Os empreiteiros que estão na cadeia e eles perceberam que lá atrás no mensalão os empresários acabaram cumprindo pena em regime fechado e por isso passaram a fazer as delações premiadas. Eles vão ser punidos mas vão levar os sócios todos do sistema criminoso.

A investigação sobre o esquema de corrupção na Petrobras poderia chegar ao ex-presidente Lula ou à presidente Dilma? Acho que não. Até agora concretamente não há nada a se configurar participação de Lula ou de Dilma, mas politicamente os dois foram atingidos. Os dois vão pagar um preço altíssimo por isso. Eles têm, sim, responsabilidade política. No mínimo eles tinham obrigação de estar de olhos abertos e de perceber o que estava acontecendo e tratar de impedir. Politicamente não dá para isentá-los. A responsabilidade política é dos dois. O desgaste que a presidente está sofrendo e a desconfiança da sociedade em relação à sua condução política, isso vai levar um tempo longo para superar. O Lula pode pagar com a biografia dele, manchada com essa suspeita. E isso não é pouco. Mas criminalmente, não vejo nenhum indício ainda de envolvimento dos dois.

O ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco disse que o esquema de corrupção na Petrobras se institucionalizou no governo Lula. A corrupção é congênita da formação do Estado brasileiro. Estamos vivendo uma cleptocracia. Temos um Estado patrimonialista e clientelista ao extremo. Evoluímos com a independência do Ministério Público e da Polícia Federal e com a ação do Judiciário, mas ainda temos um Estado dominado pela cleptocracia infelizmente. Fico às vezes me beliscando e perguntando ‘será que é verdade que os magnatas da construção civil estão mesmo na cadeia?’.

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O senhor foi vice-coordenador de campanha de Marina Silva. Agora na lista da Lava Jato, aparecem Eduardo Campos e Fernando Bezerra Coelho, os dois do PSB. Para mim é uma grande surpresa. Desconheço qualquer participação deles, mas também não tenho menor controle da condução partidária. Confio que as investigações vão se aprofundar. Fernando Bezerra ele está dizendo que não tem nada a ver com essa história eu acredito, mas se o Ministério Público provar o contrário, tem que pagar pelos seus atos.

O Conselho de Ética do Senado tem um histórico de não levar processos adiante. O senhor acha que os 13 senadores citados devem enfrentar processos de cassação? Depende muito da sociedade. Se o povo bater às portas do Congresso, aí todo mundo atua. Se não bater, vai ficar no autismo de hoje. Na medida em que haja fatos consistentes e provas, acho que todos os 13 senadores vão passar pelo Conselho de Ética. Se o povo não aparecer na porta do Congresso para pressionar e exigir atitude, o silêncio e o corporativismo prevalecem, e os políticos vão se safar. Quando a pressão vem de fora para dentro, todos nós somos obrigados a tomar uma atitude.

Diante da revelação da lista dos políticos investigados na Lava Jato, alguns senadores começam a se articular para barrar a recondução do procurador-geral Rodrigo Janot. Falam até na possibilidade de uma CPI do Ministério Público. É uma coisa que nos envergonha. Não podemos responder um caso de polícia tentando politizar isso e dizendo que o procurador está agindo como vingança, como falou o Sarney. A orquestração para desqualificar a ação do procurador-geral vem de todos os alvos da investigação, mas parece que foi combinado. Sarney diz que é vingança porque o Senado recusou a aprovação do irmão do governador do Maranhão Flávio Dino, Nicolao Dino, para o Conselho Nacional do Ministério Público. Os tentáculos do Sarney ainda estão plantados na República. Renan e Eduardo Cunha dizem que o Palácio do Planalto articulou para enfraquecer o Congresso. Tudo é uma estratégia para politizar o que não pode ser politizado.

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E a tendência é que as críticas ao Ministério Público se ampliem ainda mais. Parece uma briga de compadres. Acusar o procurador-geral de vingança reduz muito o poder dessa instituição valorizada pela democracia. Parece uma República de compadres. O depoimento do Eduardo Cunha à CPI da Petrobras, quando foi ovacionado mesmo investigado na Lava Jato, por exemplo, parece que a Câmara não tem nada a ver com isso. Olha o tamanho do divórcio com as inquietações sociais, com as inquietações da sociedade. Câmara e Senado se falam na hora de desqualificar o Ministério Público, mas na hora de atender os clamores da sociedade, aí ficam de costa um para o outro.

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