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Nos seus 100 primeiros dias no Planalto, Dilma deveria encaminhar a reforma tributária

Espera-se que a presidente eleita empenhe o capital político do início do mandato na transformação de um sistema de impostos que é injusto e representa um entrave ao desenvolvimento do país

Por Beatriz Ferrari, Domitila Becker, Bruno Abbud
31 out 2010, 20h10

Nos Estados Unidos, é tradição fazer o balanço dos 100 primeiros dias de um governo. O período é considerado ideal para que o novo presidente encaminhe sua agenda de projetos e reformas – pois carrega intacto o cacife obtido nas urnas. No Brasil, após a abertura democrática, os presidentes eleitos seguiram a cartilha e usaram esses pouco mais de três meses para por em prática medidas polêmicas – ou mesmo impopulares. Fernando Collor de Mello, seguindo a onda dos pacotes econômicos anti-inflação dos anos 80, lançou o Plano Collor, que confiscou as cadernetas de poupança com mais de 50.000 cruzeiros (aproximadamente 17.000 reais em valores de hoje). Fernando Henrique Cardoso aproveitou o prestígio que havia angariado como comandante do Plano Real para apresentar ao Congresso propostas de emenda constitucional que aceleravam a abertura da economia, sob forte oposição dos servidores públicos e de alguns setores nacionalistas que eram contra as privatizações. Lula apresentou cortes no orçamento e se reuniu com governadores para pedir apoio às propostas de reformas previdenciária e tributária, encaminhadas ao Congresso posteriormente. Ambas avançaram em seu governo – mas Lula não chegou a concluí-las. As reformas tributária e previdenciária são justamente as mais necessárias para que o Brasil cresça sem entraves nos próximos anos. Elas são também as que enfrentam mais obstáculos para concretizar-se. Historicamente, a questão previdenciária só ganha os holofotes em períodos de crise, a exemplo do que está acontecendo atualmente em vários países na Europa. No Brasil, o tema só entrou em pauta em 1999 e 2003, anos economicamente complicados. A conjuntura econômica atual favorável fornece argumentos contrários à reforma. Mas essa lógica é prejudicial no longo prazo. O crescimento nunca é ininterrupto. É preciso aproveitar o ciclo de expansão e implementar medidas para que o Brasil possa arcar com as despesas vultosas de uma população idosa no futuro, bastante dependente do estado. O problema é que reformar a previdência significa criar regras de acesso mais rígidas e benefícios menores, e nenhum parlamentar quer ficar marcado como defensor dessas “perdas” para a população. A reforma tributária também impõe um alto custo político à sua implementação. Lula foi o quarto governante derrotado pela enorme resistência em reformar o sistema de impostos e contribuições estabelecido pela Constituição de 1988. O maior entrave é, de longe, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), principal fonte de receita dos estados. Receosos de perder arrecadação, os governadores fazem pressão contra as tentativas de simplificação ou redução das alíquotas. Assim, a reforma não avança e a complexa estrutura tributária brasileira continua sendo pesada, pouco transparente e injusta. Eleita neste domingo, Dilma Rousseff faria bem em apostar seu capital político em pelo menos uma dessas grandes reformas. E tributária é a mais urgente. Uma das cargas de impostos mais altas do mundo – 33% do PIB – causa danos à competitividade dos exportadores brasileiros, prejudicados pela morosidade da Receita para devolver os créditos tributários a que têm direito. A guerra fiscal e a tributação em cascata provocam distorções nos preços, além de complicar a vida das empresas, que gastam fortunas com planejamento tributário para entender suas obrigações com o Fisco. Os impostos sobre consumo, que representam 47% de toda a arrecadação, além de invisíveis são injustos, uma vez que a estrutura não leva em conta a capacidade contributiva dos cidadãos. Dilma já sinalizou disposição para avançar nessa seara. Não falou em redução da carga, mas em simplificação. A “reforma das reformas” é “prioridade” para a petista, embora ela não tenha dado muitos detalhes de como trabalhará a questão. Mas como essa proposta depende mais do Congresso do que da presidente, a concretização fica refém de sua capacidade de conquistar o apoio dos parlamentares. Relação com o Congresso – Dilma governará com maioria no Congresso. Os partidos de sua coligação (PT/PMDB/PDT/PRB/PTN/PSC/PR/PTC/PSB/PCdoB) elegeram 311 deputados, de um total de 513, e 48 senadores, de 81. Isso sem contar os parlamentares do PP, que não se coligou oficialmente, mas sempre fez parte da base de apoio de Lula. Contará, também, com o respaldo do vice, Michel Temer (PMDB-SP), articulador de longa data e três vezes presidente da Câmara. Mas terá de administrar a relação com o PMDB e saciar o apetite da legenda por postos no novo governo. E a petista não tem o mesmo cacife do padrinho Luiz Inácio Lula da Silva para acomodar a todos. “Isso pode gerar revolta da base por mais espaço dentro do governo. Ela terá que conviver com um processo constante e desgastante de negociação com os partidos coligados”, prevê o cientista político Leonardo Barreto, pesquisador da Universidade de Brasília (UnB). Como os cargos que ela pode distribuir entre os aliados são limitados, precisará ter jogo de cintura para garantir apoio e governabilidade.

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