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No Rio, a tradição é a polícia derrubar a polícia

Por João Marcello Erthal e Cecília Ritto
30 set 2011, 10h08

A maior ameaça ao comandante de uma instituição que combate o crime deveria, em tese, ser o bandido, a criminalidade, o assombro da população com as ações violentas. Todas elas estão presentes no Rio de Janeiro, em diferentes graus e em diferentes regiões. Mas tradicionalmente o que aciona o botão “ejetar” das cadeiras de comando nas polícias militar e civil não vem de fora. Mário Sérgio Duarte, o coronel filósofo que pediu exoneração no fim da noite de quarta-feira, conseguiu sucessivas reduções na taxa de homicídios e nos índices de violência do Rio, mas não resistiu ao inimigo interno: um oficial acusado de comandar a quadrilha de PMs suspeita de matar a juíza Patrícia Lourival Acioli.

O último chefe de Polícia Civil, delegado Allan Turnowski, caiu na semana seguinte à prisão de um grupo de policiais sob seu comando. Eles eram acusados de envolvimento com traficantes e vazamento de informações sobre ações contra quadrilhas. O inquérito aberto para apurar um suposto vazamento atribuído a Turnowski foi arquivado.

A cadeira do comandante-geral da PM balançou além do suportável na terça-feira, quando foi preso o tenente-coronel Cláudio Luiz Silva de Oliveira. Era ele o comandante do batalhão de São Gonçalo quando Patrícia Acioli foi assassinada. Ela era a juíza da 4ª Vara Criminal da cidade, e tinha sobre a mesa uma série de processos contra policiais comandados por Oliveira, acusados de crimes como corrupção e assassinato.

Os méritos de Mário Sérgio não bastaram para sustentá-lo no comando. A exoneração foi a pedido, mas razoavelmente prevista no compromisso entregue ao comandante-geral da PM e ao chefe de Polícia Civil na gestão de José Mariano Beltrame à frente da Secretaria de Segurança. Beltrame, assim como o governador Sérgio Cabral, afirmam e reafirmam que há total liberdade para os chefes da segurança escolherem seus subordinados. E, obviamente, cobram por isso. O tenente-coronal Oliveira foi escolhido para o batalhão de São Gonçalo por Mário Sérgio. O mais grave, no entanto, veio depois. No momento em que já era investigado por suspeita de envolvimento na morte de Patrícia Acioli, Oliveira foi levado de um comando para outro: deixou o 7º BPM (São Gonçalo) e assumiu o 22º (Maré).

Na coletiva em que anunciou o coronel Erir Ribeiro Costa Filho como novo comandante da PM, Beltrame fez elogios a Mário Sérgio. “Quero aproveitar a oportunidade e deixar mais uma vez o meu agradecimento ao coronel Mario Sérgio, um homem honrado. Tão honrado a ponto de reconhecer a situação que criou e perceber, obviamente, que o plano de segurança está muito acima das pessoas, do comando e de qualquer lugar”, afirmou.

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É justamente nesse sentido que Jaqueline Muniz, doutora em estudos de polícia, acredita estar o mérito de Mário Sérgio Duarte. Para ela, o ex-comandante chamou a responsabilidade para si e não empurrou a terceiros a culpa pelo erro. “Ele demonstrou que a polícia permanece e que ocupar cargos é temporário”, afirma. Jaqueline classifica a atitude de Mário Sérgio como corajosa, ousada e responsável. “Não me lembro de uma postura dessas no Rio, com esse grau de transparência e seriedade profissional. Muitas vezes a mosca do poder morde a pessoa, e o indivíduo fica encastelado, desgastando a corporação e a sua própria imagem”, explica Jaqueline.

Um dia antes de o ex-comandante pedir para sair do cargo, Beltrame havia dito que Mário Sérgio gozava de sua confiança. A decisão de deixar o comando da PM leva a crer que partiu do próprio Mário Sérgio o senso de responsabilidade de deixar a sua função. “A mensagem que ele passa para a tropa é seriíssima. Para alguém que vem do Bope é muito coerente: ‘Todos nós (policiais) somos co-responsáveis com o que ocorre nas ruas do Rio de Janeiro'”, diz Jaqueline. É uma forma de o ex-comandante dar o exemplo não só para os subordinados, mas também para os gestores públicos de uma forma geral- que, quase sempre, tentam se manter no cargo mesmo quando isso parece insustentável.

Mário Sérgio Duarte pode ter sido vítima de sua cautela, evitando afastar de cargos de comando o suspeito, antes de ter provas contra ele. Mas diante de um crime bárbaro, contra a juíza e contra a democracia – afinal, Patrícia foi morta por ser atuante em sua função de combater o crime – ser cauteloso teve o mesmo efeito de ser omisso. O depoimento de um cabo acusado de atirar contra a juíza pôs o tenente-coronel Oliveira no topo da quadrilha que matou a juíza, e para a opinião pública ficou a imagem de que o comando protegeu um bandido.

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