No Complexo da Maré, ocupação não é garantia de paz
Batalhão criado dentro da favela e às margens da Linha Vermelha não funciona para combater o tráfico e tem, entre suas atribuições, o policiamento de grande parte da Zona Norte
A área que militares das Forças Armadas e policiais federais vão ocupar nos próximos dias, no Rio de Janeiro, foi vítima do tráfico de drogas e de um inimigo tão ou mais perigoso: o populismo aplicado à segurança pública. Pouco se fala sobre o tema no momento, mas o Complexo da Maré tem, em uma área entre as favelas e a Linha Vermelha, um batalhão da Polícia Militar, com cerca de 600 PMs. Sim, há um batalhão na área que tropas federais vão ocupar para, depois de alguns meses, entregar a uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) – que, aliás, deve ser instalada no prédio que serve ao 22º BPM (Maré).
As medidas demagógicas que ajudam a agravar os problemas de segurança pública vêm de muito tempo, mas têm um ponto de virada curioso: em 2002, diante de uma das muitas crises de segurança no Estado do Rio, o então governador, Anthony Garotinho, decidiu resolver o problema com uma canetada e uma medida de impacto. Transferiu o que era o batalhão de Benfica para as margens da Linha Vermelha, mudando também o nome da unidade. A impressão, para quem não mora por ali, é de que de uma hora para outra surgia um contingente da PM dedicado a evitar arrastões e tiroteios nas vias expressas. Como as únicas mudanças foram de endereço e nomenclatura, nada se alterou em relação à segurança, e os policiais do 22º BPM continuam, até hoje, patrulhando bairros de uma grande área na Zona Norte – entre eles Benfica, Bonsucesso e Ramos, onde há traficantes e milicianos -, acessos à Avenida Brasil e a Ilha do Fundão, campus da UFRJ.
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Em resumo, há um batalhão instalado dentro da favela que não se dedica à favela – ou pelo menos não tem esta como uma de suas prioridades. Garotinho se foi – e tenta voltar – mas o problema criado na época se agravou. Além de não resolverem o problema da população da Maré, estimada em cerca de 130.000 moradores – 120.000 deles vivendo no complexo de favelas -, o batalhão renomeado passou a funcionar em uma área perigosa também para os policiais.
Os PMs daquela unidade sabem que não estão seguros. Em 2010, quando foi organizada a tomada do Complexo do Alemão com auxílio de blindados da Marinha, o 22º BPM serviu de base para o gabinete de crise da PM. Numa caminhada rente aos muros do batalhão, o então comandante da PM, coronel Mário Sérgio Duarte, precisou se abrigar dos tiros disparados por bandidos do local, num ato de afronta.
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Reforços – Uma reunião na tarde desta terça-feira, no Quartel General da Polícia Militar, traçou os planos da corporação para a operação conjunta com as Forças Armadas, prevista para ocorrer a partir de 7 de abril. A PM do Rio está, ao mesmo tempo, na condição de parte do problema e de estrela do planejamento. Ninguém conhece a região da Maré e os criminosos como os PMs. Mas ao mesmo tempo a operação só ocorre porque a PM, sozinha, não conseguiu conter a situação.
Há um esforço oficial para não vincular o reforço federal aos ataques sofridos pelos PMs nas favelas de Manguinhos, no Complexo do Alemão e na Rocinha. Mas é exatamente este o problema no momento. Na noite de segunda-feira, uma viatura da PM foi atingida por disparos, supostamente feitos por traficantes. Não houve feridos. Na favela Nova Holanda, no Complexo da Maré, houve um tiroteio horas depois de o governador Sérgio Cabral e o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, anunciarem a decisão de emitir um decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) para ocupar as favelas.
Armas e drogas – Nesta terça-feira, policiais do 22º BPM apreenderam drogas e armas durante uma operação na favela Nova Holanda. De acordo com a assessoria da PM, foram apreendidos 50 quilos de maconha, 20 quilos de cocaína, cinco litros de cheirinho da loló, 400 pedras de crack, quatro pistolas, quatro granadas, duas máquinas de contar dinheiro e 50 reais. O material estava escondido entre paredes e muros da favela.