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Mesada do tráfico arranha a imagem das UPPs

Governo do Rio trata o envolvimento de 30 policiais com corrupção como caso isolado, mas repetição de problemas nas unidades põe em risco credibilidade dos novos policiais - uma das armas do programa

Por Cecília Ritto Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 12 set 2011, 18h33

Os problemas não ocorrem só em Santa Teresa. No Alemão, onde ainda não há UPP, o tráfico está operando, como já admitiu o Exército. No domingo à noite, traficantes do Morro dos Macacos, em Vila Isabel, zona norte, trocaram tiros. A favela é considerada pacificada, e entra na lista de episódios pontuais crescentes que o governo tenta tratar isoladamente

Contido o conflito entre moradores e militares do Exército no Complexo do Alemão, as autoridades de segurança do governo do Rio começam a semana com outra crise envolvendo a política de pacificação de favelas. A publicação de uma reportagem pelo jornal carioca O DIA, no domingo, obrigou a Polícia Militar a afastar o comando de uma das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), sob suspeita de envolvimento em um esquema de propina paga por traficantes de morros da região de Santa Teresa, o charmoso bairro turístico na região central da cidade.

As propinas, segundo O DIA, variavam de 400 reais a 2.000 reais, distribuídas de acordo com as patentes e o grau de influência dentro da UPP. Dessa forma, o tráfico mantinha suas atividades e conseguia, nos plantões dos envolvidos, atuar com liberdade ainda maior. Um detalhe que reforça essa tese foi o ataque a três policiais militares em junho. Os três estavam fora do esquema de propina e ficaram feridos por uma granada, lançada no momento em que patrulhavam o morro do Fallet. Um dos policiais teve a perna direita amputada.

A denúncia de que o comando e boa parte dos policiais de uma UPP estão envolvidos em corrupção atinge em cheio um dos pilares do programa de pacificação do governo do Rio, que serviu para reeleger o governador Sérgio Cabral em primeiro turno em 2010. Formou-se no Rio a convicção – exagerada, no mínimo – de que, por serem formadas por policiais recém-saídos da academia, as UPPs estão menos vulneráveis à corrupção do que as unidades tradicionais da PM. As crenças radicais nos dois sentidos estão erradas. É ingênuo acreditar que policiais novos, ou com uma formação diferente, estão imunes à propina. Mas é também equivocado achar que a descoberta de corrupção faz cair por terra todos os avanços das UPPs. Basta passar pelas favelas com e sem unidades pacificadoras para entender a diferença. E há no Rio também uma prova desses avanços que não integra o grupo de variáveis que podem ser controladas pelo estado: a UPP chega e os imóveis ao redor se valorizam, as atividades econômicas do ‘asfalto’ ganham força.

O que difere os policiais das UPPs do resto do contingente, por enquanto, é o tempo de casa – são quase todos saídos diretamente da academia – e o tipo de treinamento. O conceito é formar os novos policiais mais como prestadores de serviço para a população do que como guerreiros, que empunham fuzis, matam e morrem nas favelas. Para que surja uma nova polícia, de fato, será preciso mais que isso. Um dos pontos frágeis da política de pacificação é o mesmo de todo o restante da PM: baixos salários. “Sempre defendo melhores salários. O governo vem fazendo esforço nesse sentido. Mas por causa disso não vamos fazer ou vamos colocar a cabeça embaixo da mesa?”, indagou o secretário de Segurança do Rio, José Mariano Beltrame, defendendo as opções da política de segurança que ele conduz há quase cinco anos no Rio.

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Beltrame veio a público pedir que não sejam esquecidas as conquistas das UPPs até aqui. “Por favor, não vamos esquecer o que já se obteve e nem as centenas de milhares de pessoas que dormem melhor nesses lugares. As questões estão sendo apuradas pontualmente”, afirmou. É possível que o caso da UPP do Fallet/Fogueteiro seja resolvido com uma investigação “pontual”, como disse o secretário. Mas é mais prudente que as autoridades de segurança não se fechem na ilusão de que o ocorrido nesta UPP foi um caso isolado.

A UPP do Fallet/Fogueteiro foi inaugurada há apenas seis meses. Se comprovadas as acusações, a montagem de um esquema de corrupção em larga escala ocorreu em tempo recorde, envolvendo os comandantes. E aí há, de fato, um problema para o programa. Nessas duas favelas persiste também o tráfico com uma intensidade maior que nas demais localidades que já receberam unidades de polícia no novo formato. “Nunca vendi ilusão e não venderei. Nós temos ainda possibilidade de enfrentar alguns problemas, mas é absolutamente necessário e imprescindível que se continue. Cada ação dessas a gente age e prossegue”, disse Beltrame, que costuma ser realista em relação às perspectivas das UPPs. Ele admite, por exemplo, que tirar os fuzis das mãos dos traficantes não é sinônimo de acabar com o tráfico. Beltrame terá de medir, agora, o quanto é possível considerar uma localidade “pacificada” com a permanência dos negócios do tráfico.

Para não evitar que o principal programa de Sérgio Cabral se transforme em um problema para o governo, na quinta e na sexta-feira passadas, houve um seminário entre capitães e tenentes para discutir os caminhos das unidades pacificadoras. O documento chegará à secretaria até a terça-feira. O governador também se apressou para defender as UPPs. “De jeito nenhum isso macula a imagem do projeto, pois o fato foi investigado pela corregedoria e os culpados foram punidos”, afirmou.

Os problemas não ocorrem só em Santa Teresa. No Alemão, onde ainda não há UPP, o tráfico está operando, como já admitiu o Exército. No domingo à noite, traficantes do Morro dos Macacos, em Vila Isabel, zona norte, trocaram tiros. A favela é considerada pacificada, e entra na lista de episódios pontuais crescentes que o governo tenta tratar isoladamente. No caso dos Macacos, chegaram a ser feitos disparos contra a base da unidade pacificadora.

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Beltrame nega com veemência qualquer possibilidade de crise e lembra um fato notório no processo de reconquista dos territórios. “No próprio Morro dos Macacos, há dois anos, um helicóptero foi derrubado por armas de guerra. Não podemos esquecer os resultados positivos sobre o crime. E acho que os resultados são imensamente maiores que o índice de crimes que acontecem e que porventura venham a acontecer”, disse o secretário.

O problema em Santa Teresa, até o momento, foi o maior desde a criação das UPPs. Em pleno domingo, o comandante-geral da corporação, coronal Mário Sérgio Duarte, anunciou, ao lado do comandante das UPPs, coronel Robson Rodrigues, a exoneração do capitão Elton Costa e do tenente Rafael Medeiros – que, até então, eram respectivamente comandante e subcomandante da UPP encarregada dos morros da Coroa, Fallet e Fogueteiro. A reportagem do diário carioca baseou-se em uma investigação da Corregedoria da PM que tem como alvo 30 policiais. O rastilho de pólvora para se chegar ao grupo foi a prisão, na última terça-feira, de um sargento e dois soltados daquela UPP, com 13,4 mil reais de origem não comprovada dentro de um carro.

Na noite desta segunda-feira, o governo do Rio anunciou o nome do capitão Sérgio Stoll, de 28 anos, como o novo comandante da UPP das favelas da Coroa, Fallet e Fogueteiro. Já no morro dos Macacos o patrulhamento foi reforçado. Após os disparos feitos pelos traficantes, há policiais em todos os acessos da região.

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