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Investigadores apontam operador de propinas de Eduardo Campos

Por meio de laranjas, testas de ferro e empresas de fachada, João Carlos Lyra movimentou 600 milhões de reais em um esquema de lavagem de dinheiro

Por Felipe Frazão 22 jun 2016, 21h04

Até pouco tempo, João Carlos Lyra Pessoa de Melo Filho, de 40 anos, se apresentava como um próspero empresário de Pernambuco e “dono” do jatinho Cessna PR-AFA, que caiu em 13 agosto de 2014 em Santos (SP), no acidente que matou o então candidato à Presidência da República Eduardo Campos (PSB), ex-governador de Pernambuco. A queda do jato levou a Polícia Federal e o Ministério Público a investigarem a compra da aeronave, sabe-se hoje, feita por meio de empresas de fachada. A Operação Turbulência foi deflagrada nesta terça-feira e revelou mais sobre João Carlos Lyra. Para as autoridades, ele era um operador de propinas de Eduardo Campos.

“Restou clara a atuação do investigado João Carlos Lyra na condição de operador financeiro de numerários recebidos clandestinamente para abastecer ou pagar dívidas decorrentes da campanha eleitoral do falecido ex-governador Eduardo Campos”, afirma a representação entregue à Justiça Federal.

VEJA teve acesso ao inquérito que revela uma movimentação de 600 milhões de reais comandada por Lyra – ele e mais três operadores foram presos preventivamente; um quinto está foragido. A Polícia Federal e o Ministério Público começaram a desvendar os possíveis beneficiários dos crimes de lavagem de dinheiro perpetrados pela organização criminosa. Os líderes do esquema e uma série de laranjas e testas de ferro faziam o dinheiro circular por empresas fantasmas ou de fachada, de forma a escamotear a origem dos recursos. Para tanto, ficavam, em alguns casos, com 2% dos valores.

No relatório entregue à Justiça, a Polícia Federal atesta que Lyra foi indicado por funcionários da empreiteira Camargo Correa, no âmbito da Operação Lava Jato, como um carregador de dinheiro de Campos, na campanha de 2010. As apurações correm no âmbito do Supremo Tribunal Federal. Nelas, Lyra chegou a ser citado pelo doleiro Alberto Youssef como “agiota de Recife”. Segundo o Ministério Público e a Polícia Federal, ele recebeu como propina 2,8 milhões de reais pela operação.

“Destaque-se que há provas cabais (documentos de transferência ou depósitos bancários) de que, somente com esse esquema criminoso, João Carlos teria sido beneficiado em sua conta pessoal com 2.850.000 reais. Ele também foi reconhecido pelos ex-empregados da Camargo Correa, Gilmar Pereira Campos e Wilson da Costa, como sendo a pessoa encarregada de entregar a propina devida por aquela empreiteira ao ex-governador Eduardo Campos e ao senador Fernando Bezerra Coelho em virtude das obras da Refinaria Abreu e Lima, realizadas no estado de Pernambuco”, diz a PF.

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rasgado Lyra
rasgado Lyra (VEJA)

No inquérito, também consta que, apesar de ter se apresentado formalmente como único comprador do jatinho PR-AFA, então pertencente à empresa AF Andrade, Lyra não formalizou o negócio. Para tal transação, ele usou empresas fantasmas como a Geovane Pescados Eireli, Câmara & Vasconcelos Locação e Terraplanagem Ltda. e CRM Materiais de Construção Ltda.

A Operação Turbulência também encontrou vínculos com a investigação da PF no âmbito do Supremo Tribunal Federal sobre uma possível doação não declarada – caixa dois de 20 milhões de reais – à campanha de Eduardo Campos ao governo estadual em 2010. O dinheiro seria oriundo do sobrepreço de contratos bilionários com a Petrobras para a construção e operação da Refinaria de Abreu e Lima (RNEST). O caso corre no Supremo por causa da suspeita de que o senador Fernando Bezerra Coelho (PSB), ex-ministro da Integração Nacional no governo Dilma Rousseff e ex-secretário de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco, possa ter solicitado a propina a Campos.

“Diante de tudo o que restou apurado até o momento nos autos do Inquérito 4005 STF, conclui-se que, além do mecanismo de ocultação da origem criminosa (no caso, do sobrepreço em contratos da RNEST) utilizado pela Camargo Correa, dos numerários destinados provavelmente ao pagamento de dívidas de campanha do então governador Eduardo Campos à reeleição – simulação de contrato com empresa aberta em nome de “laranjas” e saques em espécie realizados por procurador desta -, a utilização de interposta pessoa pelos destinatários da propina revela a atuação da organização criminosa sob investigação neste caderno apuratório, através do investigado João Carlos Lyra, no evidente intuito de desvincular o dinheiro ilícito de sua origem criminosa”, afirma a PF.

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Além disso, conforme os investigadores, a Câmara & Vasconcelos, empresa de terraplanagem dona de uma das 25 contas usadas para movimentar o dinheiro, recebeu em 2014 um repasse de 18,8 milhões de reais da OAS, também investigada na Lava Jato. A empresa, de fachada, alegou que se tratava de um repasse para obras como subcontratada na empreitada de Transposição do Rio São Francisco – obra supervisionada por Bezerra Coelho quando ministro. Mas a PF acha que o dinheiro pode ter sido usado na compra do avião que levava Campos.

“Nada obsta que se rememore que a Câmara & Vasconcelos Ltda. recebeu quase R$ 19 milhões de reais da Construtora OAS SA, empreiteira envolvida não apenas no esquema criminoso de desvio de verbas públicas e pagamento de propinas apurado no bojo da Operação Lava Jato, mas também investigada por desvio de recursos públicos na execução das obras de transposição do Rio São Francisco, efetuadas, dentre outros estados, em Pernambuco, o qual era governado, na época, por Eduardo Campos.”

Embora tenham obtido provas emprestadas da Lava Jato, os investigadores da Operação Turbulência acreditam que têm na mira um esquema diverso daquele que a força-tarefa de Curitiba e a Procuradoria-Geral da República apuram e muito mais amplo do que os pontos de contato que já vieram à tona. A Turbulência investiga os meandros do esquema de lavagem de dinheiro e organização criminosa que funcionava em Pernambuco, com ramificações em Goiás, e não avança sobre alvos com foro privilegiado. Estão no alvo da PF cinco operadores e 25 empresas e pessoas donas de contas usadas para movimentar cerca de 600 milhões de reais desde 2010. A Justiça Federal já reconheceu a competência da polícia pernambucana para continuar no caso.

A família de Eduardo Campos ainda não se pronunciou sobre a investigação. O senador Fernando Bezerra Coelho disse que “repudia” a vinculação de seu nome à Operação Turbulência e que “não teve funções financeiras” nas campanhas de Campos em 2010 e 2014. O PSB nacional afirmou em nota que tem plena confiança na conduta de Campos. “O partido apoia a apuração das investigações e reafirma a certeza de que, ao final, não restarão quaisquer dúvidas de que a campanha de Eduardo Campos não cometeu nenhum ato ilícito.” A reportagem não conseguiu contato com a defesa de Lyra.

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