Educação e trabalho: obstáculos para pessoas com deficiência no Brasil
Taxa de analfabetismo é mais elevada entre portadores de deficiência. Nova forma de questionário detecta que quase um em cada quatro brasileiros têm alguma necessidade especial
A partir de um ajuste no questionário, o Censo 2010 identificou que, no Brasil, praticamente uma em cada quatro pessoas apresenta algum grau de dificuldade para enxergar, ouvir ou se locomover. O resultado impressiona e, segundo os pesquisadores, consiste no retrato mais fiel já produzido sobre pessoas com deficiência no país. O modelo adotado é o mesmo da Organização Mundial da Saúde (OMS), que mede o grau de severidade das incapacididades através da percepção dos próprios portadores
Os dados do Censo Demográfico 2010 divulgados pelo IBGE nesta sexta-feira traçam um perfil detalhado dos portadores de deficiência no Brasil. Os números mostram o tamanho dos obstáculos enfrentados por essa grande fatia da população, equivalente a quase um em cada quatro residentes no país – de acordo com a nova forma de identificar necessidades especiais e limitações físicas. Entre as dificuldades adicionais, estão menor penetração no mercado de trabalho, rendimento menor, nível de instrução mais baixo e taxa de analfabetismo mais elevada.
A deficiência visual é a mais comum, atingindo 45,6 milhões de pessoas em 2010. Ela era a mais frequente tanto entre homens (16,0%) quanto mulheres (21,4%), seguida da deficiência motora (13,3 milhões, 5,3% para homens e 8,5% para mulheres), auditiva (9,7 milhões, 5,3% para homens e 4,9% para mulheres) e mental ou intelectual (2,6 milhões, 1,5% para homens e 1,2% para mulheres).
“A população envelheceu. As pessoas mais idosas passam a relatar mais dificuldades. Hoje, também se exige mais da visão, por exemplo. Celulares pequenos, com teclas menores, fazem com que a pessoa se declare com alguma dificuldade para enxergar”, explica Andréa Borges, pesquisadora do IBGE.
Entre os residentes no Brasil, 45.606.048 declararam ter pelo menos uma das deficiências investigadas, correspondendo a 23,9% da população brasileira – ou mais do que uma Argentina, que tinha 40,1 milhões de habitantes no mesmo ano. No Censo 2000, essa proporção era de 12,5%. Há algumas justificativas para tamanha discrepância, sendo a principal delas uma mudança na pergunta, que foi simplificada: “Como você avalia a sua capacidade de enxergar?”, por exemplo, deu lugar a “Você tem alguma dificuldade para enxergar?”.
Trabalho – Para o mercado de trabalho, a deficiência mental ou intelectual foi a que exerceu maior influência como fator limitante tanto para a população masculina quanto para a feminina. Das 44 milhões de pessoas com deficiência em idade ativa (10 anos ou mais), 53,8% (23,7 milhões) estava desocupada ou não era economicamente ativa.
A maioria das pessoas com deficiência ocupadas era empregada com carteira assinada (40,2%), uma diferença de 9 pontos percentuais em relação à população sem nenhuma das deficiências investigadas (49,2%).
Renda – As diferenças de rendimento por existência de deficiência são maiores entre os mais pobres e diminuem nas classes mais altas. O Censo 2010 observou o rendimento nominal mensal de trabalho recebido pelas pessoas de 10 anos ou mais de idade ocupadas na semana de referência, com pelo menos uma das deficiências investigadas. O resultado foi que 46,4% dessa população ganhavam até um salário mínimo ou não tinham rendimento, uma diferença de mais de nove pontos percentuais para população sem qualquer dessas deficiências (37,1%).
Educação – Parte da explicação para as desvantagens dos deficientes no mercado de trabalho é o despreparo das empresas para recebê-los, e outra vem da escola. É lá, ainda nos primeiros estágios da vida acadêmica, que as diferenças começam a se impor.
Entre a população de 15 anos ou mais com pelo menos uma das deficiências investigadas, a taxa de alfabetização foi de 81,7%, uma diferença de 8,9 pontos percentuais em relação à população total (90,6%). A região Sudeste apresentou a maior taxa de alfabetização das pessoas com deficiência (88,2%) e a região Nordeste, a menor (69,7%).
A taxa de escolarização indica que 95,2% das crianças de 6 a 14 anos com deficiência frenquentam a escola – 1,9 pontos percentuais abaixo do total da população nessa faixa etária (97,1%). A região Norte aparece a menor taxa de escolarização (93,3%), porém com a menor diferença entre crianças com (94,0%) e sem deficiência (93,3%.). A explicação é que a inclusão escolar dos deficientes na região Norte é afetada, por exemplo, pela infraestrutura de transporte. No outro extremo, a maior diferença foi observada na região Sul, 97,7% e 95,3%, respectivamente.
O maior abismo, no entanto, está no indicador do nível de instrução. Na população de 15 anos ou mais com deficiência, 61,1% não tinham instrução ou possuíam apenas o fundamental incompleto, enquanto esse percentual era de 38,2% para as pessoas dessa faixa etária que declararam não ter nenhuma das deficiências investigadas – uma diferença de 22,9 pontos percentuais. Esse hiato é menor no ensino superior completo, na mesma faixa: 6,7% (com deficiência) e 10,4% (sem deficiência).
LEIA TAMBÉM:
Acessibilidade: Maratona diária para quem usa cadeira de rodas
População católica encolhe no Brasil. Evangélicos avançam