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Gustavo Fruet: “Não se faz política em linha reta”

Ex-oposicionista deixou o PSDB e se elegeu prefeito de Curitiba com o apoio do PT. Ele diz que as críticas não levaram em conta a realidade política local

Por Gabriel Castro, de Curitiba
30 out 2012, 07h50

“Seria muito simples se fosse um partido só de gente boa e outro só de gente má. A vida política é um pouco mais complexa.”

Há dois anos, Gustavo Fruet riria se alguém dissesse que ele se tornaria prefeito de Curitiba tendo o PT como principal apoiador. Mas o improvável aconteceu: sem espaço no PSDB, o até então aguerrido oposicionista ingressou no PDT, deu as mãos para os petistas do Paraná e venceu as eleições deste domingo. Ele admite que a decisão não foi fácil, mas critica a gestão do PSDB no plano local. Algoz do PT na época da CPI dos Correios, que investigou o mensalão, Fruet tenta limitar o alcance das declarações que deu no passado sobre o partido. Agora, ele diz que se referia apenas a alguns dirigentes da sigla – e faz menções veladas ao nome de José Dirceu. No dia seguinte à vitória, o novo prefeito de Curitiba falou ao site de VEJA.

O senhor ajudou a investigar o mensalão e, em 2010, quando foi candidato ao Senado, disse que o PT estava envolvido em “tráfico de influência, ameaças à imprensa, quebra de sigilo, roubalheira envolvendo gente amiga da Presidência, dinheiro na gaveta, na mala, na cueca“. E afirmou que a oposição estava enfraquecida porque “o poder está nas mãos de um só partido que quer dominar a tudo e a todos”. O que mudou? Olha, essa foi uma aliança de convergência programática local. Não é para negar a história. E eu sempre disse que não se constrói um projeto sem contradição numa eleição majoritária. Eu fiz o enfrentamento de fatos e ainda hoje eu acho que estava certo. O STF está de alguma maneira convalidando isso.

E as menções ao PT? Eu disse na época da CPI: o que aconteceu foi importante até para preservar a história da formação do PT. Seria muito simples se fosse um partido só de gente boa e outro só de gente má. Não é assim. A vida política é um pouco mais complexa.

Mas o senhor é quem disse que o PT tem um projeto de ser partido único. Havia gente com esse projeto.

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O senhor falou do PT, como um todo. Havia pessoas que queriam comandar o partido e queriam isso. Quem eram os dirigentes? Quem está sendo julgado agora pelo STF? Não se pode ficar no fanatismo, não reconhecer que possa haver outros olhares sobre o mesmo processo. Tanto que houve uma mudança. A presidente Dilma se tornou chefe da Casa Civil quando caiu um homem do governo [José Dirceu, cujo nome Fruet não cita]. Nós fizemos um julgamento político. O judicial está feito agora pelo Supremo. E isso provocou uma mudança no PT. Para efeito de especulação: o que teria acontecido se não houvesse aquele denúncia envolvendo Maurício Marinho ou se o Roberto Jefferson não tivesse feito aquela declaração? Vamos tentar congelar o tempo e pensar dois anos a mais a partir daquele movimento. Aí poderia se confirmar aquela minha afirmação.

Mas, agora, o senhor usou até um panfleto com um depoimento do ex-presidente Lula declarando apoio à sua candidatura. Isso não cria constrangimento? O PT é que fez o panfleto. O presidente Lula não se manifestou em Curitiba, nem a presidente Dilma, e acho até que houve um veto dos adversários. No primeiro e no segundo turnos eles pediram para Lula e Dilma não darem uma declarações. Eu nunca pedi nada: só no final da eleição, em função dos ataques, solicitei um posicionamento firme do PT. E um detalhe: essa não foi uma eleição nacionalizada, é uma eleição local. E eu paguei um preço por isso. Senão hoje estaria afastado, não teria participado desse processo. E a gente é cobrado a tomar atitude. Se a gente assume uma posição é um risco, mas se a gente não se posiciona passa a imagem de covardia e omissão. É tão sério quanto.

O Gustavo de 2010 entenderia o Gustavo de 2012? Eu sou muito autocrítico também, até meio exagerado. Só não uso chibata. Mas minha mãe sabe como eu sofro. Não pense que a gente faz política sem dor. Não é esse lado glamouroso. Eu tive que tomar decisões importantes, e nenhuma delas foi fácil. Eu fui eleito deputado federal no lugar do meu pai, que faleceu faltando 20 dias para a eleição. Quando eu fiz o rompimento com o Roberto Requião e com o Beto Richa, eu poderia confortavelmente ficar no governo. Mas abri mão. Isso é um fator de resistência. Eu fui o único candidato que não tinha cargo público. Não tinha ninguém em prefeitura, estado, União. Não voltei de Brasília com concessão de rádio e TV. E agora vou ser cobrado por tomar posição para ser julgado pelo voto popular? Às vezes acho que é um grau de cobrança excepcional. Que desvio de conduta eu tive? Não acharam nada para me desqualificar. Podem não gostar do meu cabelo, do meu voto, da minha posição, mas não podem falar de desvio de conduta. Exploraram isso ao extremo na eleição. Fora do Paraná, para mim foi uma batalha quase perdida. Eu fui duramente criticado. Eu não iria ficar respondendo, não tinha nem estrutura para isso. Mas o mesmo combate que eu tive em Brasília eu tive aqui em Curitiba. Se eu estivesse no PSDB, ou aliado a esse grupo da Câmara Municipal, eu estaria sendo cobrado: “Puxa, o Gustavo bateu lá em Brasília mas agora aqui é conivente com seus aliados”. Não se faz política em linha reta. E não falo de desvio de conduta, mas nesse enfrentamento. Estou vendo as pessoas da imprensa nacional falarem do “fator surpresa”. É surpresa para quem não acompanha a realidade local, para o Ibope, mas quem acompanha o dia-a-dia sabe desse enfrentamento com os políticos locais. Guardadas as proporções, são métodos muito semelhantes.

Então a mudança de partido e de posicionamento político era inevitável? Inevitável. Até pelo resultado. Senão não estaríamos aqui. Mas isso não significa necessariamente mudança de posicionamento político. Eu sempre reafirmei as minhas posições. Cada um é guardião da sua história, das suas convicções. Nunca neguei a importância do trabalho que foi realizado no Congresso Nacional. Mas, diante da realidade local, a mudança partidária era inevitável. Há uma distância entre o que a gente imagina ser a política partidária nacional e a política nos municípios. Esses dois anos que eu fiquei afastado de Brasília serviram como processo de reeducação. Localmente, partidos, na regra geral, funcionam como cartórios, com comissões provisórias, e normalmente o comando é de grupos que sempre estão no governo. Ou seja: eu fiz o caminho inverso: abri mão do conforto de estar no governo do estado e na prefeitura para recomeçar a minha trajetória. E me debati contra aqueles que sempre foram governo em Curitiba e a, cada mudança, acabam mudando para os partidos do governo de plantão. De certa forma, era isso o que ocorria com o PSDB da capital. Mas não adianta ficar lamentando. Na época, qual era a alternativa que eu tinha? Convenção? Não tinha. Reclamar para quem? Que instância partidária toma uma decisão democrática num processo desses, com comissão provisória? Não tem. A outra opção era assumir o risco e buscar um novo caminho. Foi o que eu fiz.

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Já que precisava sair do PSDB para buscar espaço, por que não entrar no DEM ou no PPS, que são de oposição? Cogitei, mas DEM e PPS já estavam com o prefeito Luciano Ducci, que é do PSB. Eu sempre falei isso: eles me apontavam uma contradição com a política nacional, mas toda essa estrutura de oposição no Congresso apoiava o candidato do PSB, que é da base do governo. Nós chegamos no limite da paranoia. Quase tive que fazer análise para enfrentar o final da campanha. Claro que estou brincando, mas é que eu fui muito criticado – e entendo – por ter tido uma postura de enfrentamento no Congresso, em especial nas CPIs. Mas em momento algum eu fiz uma disputa institucional contra qualquer partido. Por circunstâncias eu fui levado a participar dessas CPIs, e entendo que cumpri com serenidade e responsabilidade esse trabalho. No Supremo Tribunal Federal, o próprio ministro Joaquim Barbosa fez várias referências ao trabalho que tivemos no Congresso.

Não é possível fazer política de outro jeito? Existe o fanático e o cínico; e não podemos ser nem um, nem outro. Cínicos são aqueles que não têm compromisso nenhum com o município: o que vale é ganhar. Eles são coerentes: estão sempre no governo. A história do PSDB de Curitiba é essa. E o fanático é aquele que não tem nenhum compromisso com o resultado, acha que só ele tem razão. Aí não tem sentido fazer política. Melhor é pegar o título de Dom Quixote e ir para casa.

O quadro partidário não está muito confuso para o eleitor compreender as forças em jogo? Está. E essa eleição diluiu ainda mais. Não houve uma concentração. O PT ainda mantém uma identidade nacional. Curitiba, pelas avaliações que fazemos, tem um público que ideologicamente rejeita e um que admira muito PT. Os outros partidos estão perdendo isso. Eu sempre disse que não é bom o PSDB e a oposição se enfraquecerem. Em 2010, foi a primeira vez na história que oposição não elegeu parlamentares sequer para poder instalar uma CPI. Isso não é bom para o governo, não é bom para a democracia.

O senhor é de esquerda, direita ou centro? Centro-esquerda. Sempre fui. E acho que esse é um tema que serve muito mais para pesquisa e para carimbo. É o mesmo que perguntar time de futebol e religião. Não vejo muita validade hoje em dia. No Legislativo a gente tem alguns projetos que permitem posição ideológica e doutrinária. Mas no Executivo, quem ficar discutindo isso não governa. Vai dizer para a pessoa que quer uma vaga na creche se ela é de esquerda ou direita. Você apanha. Não dá para brincar com isso.

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Como o eleitor pode confiar que o senhor não dará uma nova guinada? No dia da vitória deixei claro que eu tenho noção da responsabilidade da missão a ser assumida agora. É muito sério, isso. O meu adversário sou eu mesmo. Eu vou ser julgado daqui a quatro anos pelo resultado da gestão, não pelo resultado da eleição.

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