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Em menos de 24 horas, Dilma recua de Constituinte

Presidente desistiu da Constituinte, altamente contestada juridicamente, após reunião com representantes da Ordem dos Advogados do Brasil. Segundo ministro da Justiça, Dilma havia falado "genericamente" sobre proposta

Por Gabriel Castro, de Brasília
25 jun 2013, 14h41

Apresentada como um dos pilares do pacto nacional para aplacar a onda de protestos que convulsionam o país, a proposta da presidente Dilma Rousseff de uma Constituinte para promover a reforma política no país durou menos de 24 horas.

O recuo do governo foi anunciado pelo presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcus Vinícius Furtado, ao deixar uma reunião nesta terça-feira com Dilma, o vice-presidente da República, Michel Temer, e o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, no Palácio do Planalto. Minutos depois, coube ao próprio Cardozo, visivelmente embaraçado, tentar explicar o fiasco: “A presidente da República falou em processo constituinte específico; ela não defendeu uma tese. Há várias maneiras de fazer um processo constituinte específico. Uma delas seria a convocação de uma Assembleia Constituinte, como muitos defendem. A outra forma seria, através de um plebiscito, colocar questões que balizassem o processo constituinte específico feito pelo Congresso. A presidente falou genericamente”.

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O que é um plebiscito?

O plebiscito significa uma consulta sobre uma questão geral. Você apresenta uma questão – a redução da maioridade penal, por exemplo – e a população deve dizer se é favor ou contra. Depois, o legislador, com base nesse resultado, faz uma lei detalhando como ela vai funcionar. Isso é diferente do referendo. Nele , a população aprova uma lei após ela ter sido definida pelo Legislativo. Sua eficácia fica condicionada ao resultado do referendo.

Quem pode chamar?

Não cabe ao presidente autorizar um plebiscito, isso é atribuição do Congresso. Mas é um problema meramente formal. A presidente pode fazer isso por meio de sua bancada no Congresso, que proporia um decreto legislativo.

FONTE: Elival da Silva Ramos, professor titular de direito constitucional da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e atual procurador-geral do estado de São Paulo

De acordo com Cardozo, que tenta encontrar uma “saída honrosa” para o recuo, a presidente agora prefere uma consulta popular direta, que não exija mudanças na Constituição, sobre mudanças no sistema político-eleitoral. As críticas à ideia original e a complexidade do tema levaram o Planalto a se alinhar com uma proposta mais simples, sugerida pela própria OAB. Às 14h55, o Planalto divulgou uma nota reiterando “a relevância de uma ampla consulta popular por meio de um plebiscito”.

Desde que foi alardeada pela presidente, pegando de surpresa governadores e prefeitos que aguardavam o início de uma reunião em Brasília, a ideia da Constituinte foi bombardeada por juristas, políticos da base e da oposição, e, reservadamente, considerada inviável por integrantes do Supremo Tribunal Federal (STF). Pelo menos quatro magistrados do STF procuraram líderes do governo e da oposição para alertar sobre os riscos da proposta. Um dos ministros mais engajados enfatizou que o anúncio da chefe do Executivo era um “golpe contra a democracia”. Nesta terça, Dilma se reunirá com o presidente da Suprema Corte, Joaquim Barbosa, e do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB-AL).

A proposta de Dilma foi lançada no momento mais crítico do seu governo e é altamente contestada no aspecto técnico: a Constituição brasileira é explícita ao vetar a possibilidade de convocação de uma Constituinte com finalidade específica. A iniciativa esconde a incapacidade do PT, que administra o país há mais de uma década com a maior base parlamentar desde a redemocratização, de realizar uma reforma política às claras, pelo caminho do Legislativo – talvez, porque, aos petistas, os únicos interesses reais sejam o financiamento público de campanha e o voto em listas, que só beneficiariam à cúpula do partido no propósito de se perpetuar no poder. Também demonstra a inequívoca tentação bolivariana do PT de governar diretamente com o povo, passando por cima das instituições democráticas. Afinal, o plebiscito sempre foi visto com desconfiança pelo direito justamente porque os governos que lançaram mão desse recurso resultaram em gestões populistas e autoritárias – não por acaso, a Constituição Federal reservou essa competência ao Congresso Nacional de maneira exclusiva.

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Reforma política – A receptividade do governo à proposta da OAB envolve o mérito das questões defendidas pela entidade, o que inclui o financiamento público de campanha. Como efeito colateral à adoção desse modelo de reforma, qualquer tema que envolva mudança constitucional – como a coincidência de mandatos ou a adoção do voto distrital para vereador e deputado – estaria descartada de antemão. O governo vê nisso um aspecto positivo, por acreditar que a simplificação do debate pode acelerar a implementação das mudanças.

O ministro da Justiça elogiou a proposta da OAB: “A nossa avaliação é que essa proposta está inteiramente adequada com as premissas que embasaram a intervenção da presidente da República ontem”, disse Cardozo.

Um ponto é tratado como inegociável pelo governo: a realização da consulta popular. Mas, agora, em vez de decidir sobre a convocação de uma Constituinte, os eleitores apreciaram diretamente se aprovam os temas propostos na reforma política. “Achamos fundamental que a reforma política passe por um processo de ampla discussão na sociedade. o plebiscito tem um papel muito importante para que essa reforma ocorra”, afirmou Cardozo.

OAB – Antes de Cardozo anunciar a mudança de postura, o presidente da OAB já havia afirmado à imprensa que a presidente desistira da Assembleia Constituinte. Marcus Vinícius Furtado disse ter alertado Dilma sobre os perigos da proposta: “Faz parte da teoria do direito constitucional que qualquer constituinte pode dizer sobre o que ela vai regulamentar, e a convocação poderia significar graves riscos à democracia brasileira, às garantias do cidadão – inclusive às liberdades de expressão e manifestação. Levamos toda esta preocupação da sociedade civil brasileira à senhora presidente da República”, afirmou Furtado.

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