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Comissão da Verdade diz que Marinha ocultou mortes e defende revisão da Lei da Anistia

Colegiado apresentou nesta terça-feira relatório com resumo das informações sobre o primeiro ano de atuação

Por Laryssa Borges Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 21 Maio 2013, 13h45

Criada para investigar violações de direitos humanos no período de 1946 e 1988, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) divulgou nesta terça-feira documentos secretos e ultrassecretos que comprovam que a Marinha produziu relatórios sobre a morte de guerrilheiros e de pessoas contrárias ao regime militar. Em 12.000 páginas, o Centro de Informações da Marinha (Cenimar) mostra em detalhes informações sobre as mortes de onze pessoas no Rio de Janeiro, São Paulo, Recife e na Guerrilha do Araguaia. De posse dos dados, omitidos ao longo dos anos pelas Forças Armadas, ganha corpo dentro da comissão o entendimento de que a Lei da Anistia, editada em 1979, precisa ser revista.

Em dezembro de 2010, a Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) condenou o governo brasileiro por não ter trabalhado pela localização dos restos mortais dos desaparecidos políticos da Guerrilha do Araguaia e por não ter punido os responsáveis. A sentença de condenação, que também inclui a aplicação de multas, extrapola, porém, o caso do Araguaia. O colegiado também decidiu que a Lei da Anistia não poderia servir como argumento para impedir a investigação e a punição de responsáveis por violações aos direitos humanos. Hoje, a Corte monitora as providências tomadas pelo governo brasileiro. A instalação da CNV e a entrada em vigor da Lei de Acesso à Informação, por exemplo, são consideradas apenas “instrumentos colaterais”.

“Os crimes de lesam a humanidade são imprescritíveis”, defendeu a coordenadora da comissão, Rosa Cardoso. “As autoanistias, diante do direito internacional, não valem. Vamos ter, sim, de recomendar que esses casos sejam judicializados pelo direito interno”, completou.

O impasse na discussão sobre a possível revisão da Lei da Anistia no Brasil esbarra, porém, no fato de o Supremo Tribunal Federal (STF) ter decidido em plenário, em abril de 2010, que não é possível rever a legislação que garantiu o perdão dado aos representantes do estado acusados de praticar atos de tortura durante o regime militar. Dois recursos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), no entanto, ainda estão pendentes de votação no plenário do STF.

Marinha – No balanço do primeiro ano de trabalho da CNV, um levantamento parcial do colegiado aponta que a Marinha brasileira tinha conhecimento, no ano de 1972, da morte de onze desaparecidos políticos – Antonio Carlos Monteiro Teixeira, Antonio dos Três Reis de Oliveira, Ciro Flávio Salazar de Oliveira, Ezequias Bezerra da Rocha, Felix Escobar, Helenira Rezende, Isis Dias de Oliveira, Joel Vasconcelos dos Santos, José Gomes Teixeira, Kleber Lemos da Silva e Rubens Paiva.

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Em 1993, em ofício encaminhado ao então ministro da Justiça, Maurício Correa, a Marinha apresentou diversas versões sobre o destino dos desaparecidos, alegando ora que estavam foragidos, ora que os paradeiros eram desconhecidos. “As Forças Armadas mancharam suas honras com essas práticas”, resumiu a psicanalista Maria Rita Kehl, que integra a comissão.

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Após o episódio envolvendo o ex-ministro Maurício Correa, relatado nesta terça-feira pela Comissão da Verdade, o Ministério da Defesa encaminhou formalmente ao colegiado, no ano passado, a informação, constatada inverídica pelos integrantes da comissão, de que Exército, Marinha e Aeronáutica não tinham mais documentos do período militar em seus acervos. Conforme o Aviso 195, encaminhado à Casa Civil em 2010 pelo então ministro Nelson Jobim, os arquivos das Forças Armadas já haviam sido destruídos.

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“A Marinha ocultou deliberadamente informações e documentos do estado brasileiro. Ocultou da Presidência da República, do Ministério da Justiça e da Câmara dos Deputados”, informou Heloisa Starling, pesquisadora do departamento de História da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e assessora da Comissão da Verdade.

“De todos os serviços secretos militares, o da Marinha é o mais fechado. A cultura do segredo é levada às ultimas consequências. O Cenimar foi um dos organismos mais ferozes no interior da estrutura de repressão da ditadura. Havia um prontuário de pessoas mortas que a Marinha brasileira sabia que estavam mortas”, completou Heloisa.

Tortura – De acordo com as conclusões da Comissão da Verdade, sessões de tortura no Brasil se tornaram prática corriqueira em interrogatórios. “A tortura é a base da matriz de repressão da ditadura. A tortura está na origem da ditadura, antes do início da luta armada”, disse Heloisa Starling. Até o momento, a comissão apontou mapas de centros de detenção e tortura no Brasil entre 1964 e 1965 nos estados do Rio Grande do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia, Pernambuco e Goiás.

Conforme levantamento da comissão, foram utilizados nove tipos de tortura: pau de arara (barra de ferro atravessada entre os punhos amarrados e a dobra do joelho, pelos quais o torturado é suspenso de ponta-cabeça e cerca de 30 centímetros do solo); afogamento, banho chinês (tipo de afogamento com introdução forçada da cabeça do torturado em um barril de água ou óleo), choque elétrico, churrasquinho (papel retorcido colocado no ânus do torturado), geladeira (o torturado permanece nu em uma sala pequena que o impede de ficar de pé, e a temperatura oscila entre o frio extremo e o calor insuportável), soro da verdade (injeção de drogas psicoativas que reduziam barreiras inibitórias e facilitava revelações em depoimentos), telefone (golpes simultâneos na lateral da cabeça para afetar os tímpanos) e torturas psicológicas.

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