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A última da UnB: cobrança de propina dentro do câmpus

Funcionário responsável por fiscalizar contratos teria cobrado 100 000 reais para liberar pagamento de empresa. Provas estão com o Ministério Público

Por Gabriel Castro
27 jul 2011, 08h04

O Ministério Público Federal investiga denúncia de cobrança de propina dentro da Universidade de Brasília. Uma das sete empresas que fornecem mão-de-obra terceirizada à instituição acusa um dos funcionários da universidade de exigir 100 000 reais para liberar um pagamento bloqueado. A Planalto Service fornece cerca de 650 funcionários à Universidade de Brasília para as tarefas de limpeza e apoio administrativo. A empresa pedia o pagamento de um aditivo ao contrato que mantém com a instituição de ensino. Foi aí que começaram a surgir as dificuldades. O funcionário da UnB Manoel Martins Jorge Filho, fiscal de contratos de terceirização do Decanato de Gestão de Pessoas, aplicou notificações à empresa Planalto Service.

O fiscal apontou falhas no cumprimento de horário dos terceirizados e nas condições de equipamentos fornecidos pela companhia de forma genérica, sem informar em que dia e em que setores elas tinham acontecido, o que dificultava a defesa por parte da empresa. Com o relato das supostas irregularidades, os pagamentos foram bloqueados. A companhia tinha, ao todo, 1,8 milhões de reais a receber. E diz que Manoel criou as dificuldades de forma injustificada para conseguir extorquir a Planalto posteriormente. As tentativas de extorsão ocorreram nos primeiros meses de 2011.

Manoel não está sozinho. Nem a cobrança de propina é a única irregularidade praticada na administração do reitor José Geraldo de Souza, ligado ao PT. O funcionário integra um grupo de funcionários ligados ao sindicato da categoria e apoiou José Geraldo de Souza para subir na carreira pública. Foi promovido de xerocopista a fiscal de dez milionários contratos de terceirização.

Além da propina, integrantes da universidade interferiram nas contratações feitas pela empresa terceirizada. Foram mais de 100 indicações, 50 recomendações de demissão e 60 pedidos de promoção nos últimos dois anos. A prática vai contra orientações do Tribunal de Contas da União. O próprio Manoel admite ter uma filha e um genro trabalhando na UnB por intermédio da Planalto, o que configura nepotismo.

Achaque – O material em poder do Ministério Público Federal mostra que Manoel era insistente ao cobrar propina para normalizar a situação da Planalto, o que seria fundamental para a liberação do aditivo pedido pela empresa. O primeiro achaque ocorreu durante um almoço com a funcionária da Planalto responsável pelo contrato, identificada como Deise. Depois, as cobranças se deram por telefone. Quando Deise parou de atender às ligações, ele passou a usar a internet para enviar mensagens para o celular da funcionária. Por fim, Manoel mandou três torpedos do próprio celular no dia 20 de maio. São as maiores provas da extorsão. O site de VEJA teve acesso a elas, com exclusividade.

As ameaças são diretas: “Ou me paga logo ou aumento para 150”, diz Manoel em uma das mensagens. Em outra, ele relata que outros funcionários estariam envolvidos no esquema. O terceiro torpedo diz: “O que você fez ontem e está fazendo hoje não irá fazer de novo. Ou me paga logo ou cancelo seu contrato. Você ainda não entendeu que quem manda sou eu?”. O recado foi mandado justamente quando a funcionária ia se queixar dos problemas ao Decanato de Gestão de Pessoas, responsável pelo contrato.

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A dona da Planalto Service, Cássia de Souza, relatou a situação ao reitor da UnB, José Geraldo de Souza. Ele limpou a ficha da Planalto e retomou os pagamentos. Depois da denúncia, o contrato da empresa saiu das mãos da decana de Gestão de Pessoas, Gilca Starling, e passou a ser comandado pelo Decanato de Planejamento. Manoel Filho voltou à sua função original: cuidar das fotocópias no Instituto de Letras. A UnB tentou manter o caso em sigilo.

Manoel nega as acusações. Diz que foi vítima de uma armação porque nunca aceitou fazer vista grossa aos problemas da Planalto. O funcionário não sabe dizer, entretanto, como as mensagens foram aparecer no celular da funcionária da Planalto. “Eles é que provem que eu mandei aquilo. O ônus da prova cabe a eles”, afirma.

Carreira – Manoel integra um grupo de funcionários ligados ao sindicato da categoria. Apoiou a campanha do reitor José Geraldo de Souza com a perspectiva de conseguir um cargo melhor na universidade. Conseguiu. Depois de 32 anos como xerocopista, foi promovido a fiscal. A cúpula da Universidade de Brasília, ligada ao PT, privilegia acordos políticos na gestão de pessoal em detrimento do mérito.

Outra personagem dessa história está ligada à partidarização da universidade – crítica feita na UnB tanto por docentes de esquerda quanto de direita. A decana Gilca Starling, ligada ao deputado federal petista Gilmar Machado (PT-MG), foi “importada” de Uberlândia. Confrontada com os fatos, acusou a empresa e se manteve ao lado de Manoel, a quem chamou de “homem de confiança”.

Nomeações – As indicações feitas por funcionários da UnB de pessoas contratadas pela Planalto envolvem até mesmo o procurador jurídico da UnB, Davi Diniz.. A confissão foi feita pela decana Gilca Starling, em uma conversa gravada: “Esse daqui realmente foi um pedido de nosso procurador”, disse ela, ao apresentar uma indicação de Diniz.

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A Secretaria de Comunicação da UnB nega a existência das indicações e disse ter tomado as providências adequadas no caso de tentativa de extorsão: comunicou o fato à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal – que também havia recebido uma denúncia de funcionários da universidade. A universidade diz ainda que a Planalto foi autuada dez vezes por falhas na prestação do serviço. Abriu também uma sindicância interna cujos trabalhos são mantidos em sigilo. E relata que não foram detectadas suspeitas semelhantes em outros contratos.

Surge daí uma pergunta óbvia: o caso é mesmo uma triste exceção ou só veio à tona porque a Planalto foi a única empresa a romper o silêncio? Independementente da resposta, os fatos mostram que o ambiente da universidade não está imune aos desmandos tão frequentes em outros órgãos federais.

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