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A reforma política que pode piorar o país

PT aproveita a discussão para tentar emplacar o discurso de que o caixa dois eleitoral é a raiz de todos os males na política. E, com isso, camuflar o mensalão

Por Gabriel Castro
10 nov 2012, 15h55

Depois de meses de uma discussão arrastada e repleta de impasses, a Câmara dos Deputados pretende votar ainda neste mês alguns pontos da reforma política. O presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia (PT-RS), colocou o tema na pauta de votações do dia 20 de novembro. Para agilizar a tramitação, ele avocou para o plenário as votações que deveriam ocorrer em comissões temáticas da Casa. À primeira vista, poderia se transformar em uma oportunidade para colocar ordem no caótico sistema eleitoral brasileiro – mas o risco, entretanto, é piorá-lo.

Há entre os parlamentares consenso razoável pela aprovação de um calendário único das eleições – prefeitos e vereadores seriam eleitos simultaneamente a governadores e o presidente – e o fim das coligações em eleições para vereadores e deputados. Mas a Câmara também corre o risco de trazer novos fardos para a população brasileira: entre as propostas com chance de aprovação, estão o financiamento público de campanha e a criação de uma “janela” para a liberação do troca-troca partidário.

Diferentemente da proposta original, a reforma política vai ser analisada de modo fatiado – o que facilita a aprovação daquilo que interessa à maioria governista. No caso do PT, a prioridade é o financiamento público de campanha. O partido vê na discussão uma oportunidade para alardear o discurso de que o caixa dois eleitoral é a raiz de todos os males na política – inclusive do mensalão. A tese é falsa: o Supremo Tribunal Federal (STF) já comprovou – e condenou os responsáveis – que uma quadrilha instalada no coração do governo Lula corrompeu e comprou votos de parlamentares no Congresso Nacional para aprovar seus projetos.

Nos últimos anos, o partido tem se empenhado em aprovar o financiamento público como uma maneira de, na visão dos petistas, corrigir os “erros” que levaram José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares à condenação – e futuramente à cadeia. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegou a afirmar que essa seria sua principal missão depois de deixar o mandato. Ele coordenou reuniões com representantes de partidos aliados para tratar do tema.

Relator da reforma política na Câmara, o deputado Henrique Fontana (PT-RS) diz que o financiamento público é o principal item do debate: “O poder econômico tem influência cada vez maior sobre a decisão das eleições. As histórias de vida, os programas e os projetos representados por diferentes candidatos perdem força nesse embate com o papel do poder econômico no processo eleitoral”.

O financiamento público de campanha encontra resistências no Congresso, mas vem ganhando força porque os partidos têm dificuldades em bancar os crescentes custos das eleições. A proposta, entretanto, é duplamente nociva: sobrecarregaria ainda mais o contribuinte, obrigado a arcar com uma carga tributária já asfixiante, e não impediria a continuidade do caixa dois eleitoral, a grande mazela do submundo eleitoral.

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Mas para os líderes partidários, a prioridade é aliviar o caixa de campanha. “Cada dia mais as campanhas estão ficando inviáveis. A produção de campanhas é uma fortuna, e exige a busca por recursos privados – o que às vezes vincula quem ajuda em busca de interesses”, diz o deputado Henrique Eduardo Alves (RN), líder do PMDB na Câmara.

Janela – Parlamentares também pretendem usar a reforma política para aprovar a criação de uma “janela” que permita aos ocupantes de cargos públicos trocar de partido sem perder o mandato, como ocorre hoje. A ideia é que o troca-troca seja liberado meses antes das eleições de 2014 – e, como parlamentares fisiológicos são matéria-prima abundante na praça, a brecha serviria para aumentar ainda mais o inflado bloco governista.

O presidente da comissão criada para debater a reforma política na Câmara, Almeida Lima (PPS-SE), diz que há vontade política para aprovar a proposta: “Por que não poder mudar de partido se ele cumpriu três anos e meio de mandato?”.

Henrique Eduardo Alves também se diz favorável à instituição da janela: “Você não pode impor alguém a ficar num partido se ele não está se sentido bem e tem dificuldaes regionais, locais. Que se dê esse direito livremente, em uma oportunidade única”, diz o peemedebista. Hoje, quem troca de partido durante o exercício do mandato fica sem legenda. A regra tem causado um efeito colateral: a migração de parlamentares para siglas recém-criadas (uma das exceções em que é possível trocar de partido sem sofrer sanções).

Maia – A colocação da reforma política em pauta também tem a ver com o projeto pessoal de Marco Maia; em 2013, ele deixa a presidência da Câmara; buscando um cargo no Executivo, o petista tem pautado temas relevantes sem a aquiescência do governo para forçar o Planalto a conversar sobre, por assim dizer, seu futuro profissional. De qualquer forma, os parlamentares não pretendem perder a oportunidade de aprovar projetos de seu interesse.

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“Não trabalhamos com essa possibilidade de votar uma reforma política ampla, mas de avançar em alguns temas que são fundamentais para o Brasil e que têm ressonância com a sociedade”, disse Maia, ao anunciar a inclusão do tema em pauta.

O deputado Miro Teixeira (PDT-RJ), que tem participados das conversas sobre a reforma política, afirma que existe um consenso de que a reforma política deve entrar em pauta – mas falta um acordo sobre o mérito. “Há um desejo de mudanças no plenário. Mas não existe uma linha comum nesse desejo. E só existe uma forma de resolver: abra-se o debate”, diz ele.

Ronaldo Caiado (DEM-GO), outro parlamentar ligado à discussão sobre a reforma, vê um complicador: alguns dos principais temas em debates são Propostas de Emenda à Constituição (PECs), que exigem 3/5 de votos para aprovação: “O complicado é que não temos uma convergência em relação a um texto. Não tendo convergência, as matérias deverão ser decididas no voto. Mas como colocá-las sendo que, dos temas que foram priorizados, três deles são PECs?”, diz o deputado.

Alguns pontos debatidos no âmbito da reforma política devem ficar de fora das decisões da Câmara a curto prazo: entre eles, o fim do voto obrigatório, a cláusula de barreira e a adoção do voto em lista. A discussão sobre a reforma política ganhou força no Congresso no ano passado, no início da legislatura. Câmara e Senado criaram comissões especiais para tratar do tema. Mas, nos dois casos, a discussão travou por falta de consenso.

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