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A exígua oposição brasileira

Movimento para criação do PSD aumenta desequilíbrio no Congresso Nacional. Fisiologismo e falta de bandeiras dos partidos tornam o cenário ainda pior

Por Gabriel Castro
29 jul 2011, 23h43

“Não é que não haja divergência de ideias. É que não há ideias”, senador Cristovam Buarque

A criação do PSD – o partido que não é de centro, de direita, nem de esquerda – deverá deixar a oposição brasileira com 16 senadores e 97 deputados. PSDB, DEM, PPS e PSOL passarão a representar apenas 19,7% do Senado e 18,9% da Câmara. O índice está entre os menores do mundo democrático. Pior: a oposição tem, hoje, menos cadeiras do que durante a maior parte do regime militar. Os números dão uma dimensão da crise dos partidos de oposição no Parlamento. Leia também: O incrível caso do país sem direita Levantamento do site de VEJA comparou o cenário brasileiro com o de outros nove países da América do Sul, América do Norte, Europa, Ásia e África. Mesmo em regimes parlamentaristas, onde não há possibilidade de a oposição ser maioria, os porcentuais são mais equilibrados. Na vizinha Argentina, a oposição controla tanto a Câmara quanto o Senado. Nos Estados Unidos, os republicanos têm maioria na Casa dos Representantes enquanto os democratas dominam o Senado. Até na África do Sul do controverso presidente Jacob Zuma os partidos de oposição mantêm cerca de um terço do Parlamento – mais do que no Brasil. Entre os outros sul-americanos, mesmo na Venezuela e na Bolívia, países em que o Executivo afronta o Legislativo, a composiçao dos Parlamentos também é mais equilibrada que a nossa. Uma das raras exceções é o Congresso da Colômbia. Lá, o presidente Juan Manuel Santos conta com mais de 80% de apoio no Congresso. A comparação com o regime militar também surpreende. Em 1970, por exemplo, o oposicionista PMDB elegeu 28% dos deputados. Quatro anos depois, tinha 44%. Em 1982, com a volta do pluripartidarismo, a oposição passou a ter 51% da Câmara. Por que a oposição brasileira teve um declínio tão rápido? A resposta vem de uma soma de fatores. Três gestões sucessivas do PT minaram, aos poucos, a força dos partidos de fora da base aliada. Especialmente porque legendas e parlamentares fisiológicos, que não sobrevivem politicamente longe do poder, passaram a engrossar as fileiras do governo. O PSD, partido que Gilberto Kassab projetou, é mais uma agremiação que busca se aproximar do Planalto. Além disso, o presidencialismo à brasileira força os partidos a venderem apoio ao Executivo, sem o qual não têm cargos, verbas e realizações para mostrar ao eleitor. Outro elemento entra na equação: ao adotar parte do programa econômico do governo Fernando Henrique Cardoso, o PT roubou um discurso da oposição, que ficou carente de bandeiras.

Imagem do infográfico sobre o tamanho da oposição brasileira
Imagem do infográfico sobre o tamanho da oposição brasileira (VEJA)

Falta de ideias – Em sua derradeira passagem pelo Senado, neste ano, Itamar Franco dizia ter encontrado mais respeito à minoria durante a ditadura do que no atual governo. Cristovam Buarque (PDT-DF), ele mesmo integrante de um partido aliado, é outro a apontar a falta de debate no Parlamento. “O Brasil tem um partido único e alguns pequenos grupos que têm o direito de espernear, como era na Tunísia, como era no Egito. A diferença entre nós hoje, na hora de votar, é menor do que a diferença entre as tendências que existiam no Partido Comunista Soviético, que era um partido único, mas com visões diferentes ali dentro”, discursou ele recentemente na tribuna da Casa. Ao site de VEJA, Cristovam afirma que o problema é mais do que numérico. “Não é que não haja divergência de ideias. É que não há ideias. É a aliança do zero, do vazio”, diz ele. Na avaliação do cientista político David Fleischer, a fragilidade dos partidos cria uma situação paradoxal: eles são cooptáveis, mas não confiáveis. “Nessas circunstâncias, uma base encorpada não se traduz imediatamente em facilidade na aprovação dos projetos. Mesmo como uma maioria acachapante o governo precisa negociar, distribuir cargos e verbas, agradar esses partidos todo mês”, diz ele.

Senador Itamar Franco, 2011
Senador Itamar Franco, 2011 (VEJA)
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Na prática, o governo não foi ameaçado no primeiro semestre no Congresso. Aprovou propostas importantes como o salário mínimo de 545 reais e o Regime Diferenciado de Contratações. A única derrota do Planalto ocorreu na votação do Código Florestal. Mas, neste caso, o resultado foi atribuído à inexperiência da presidente Dilma Rousseff em negociar com os parlamentares. Ela tentou mudar trechos da proposta em cima da hora. No Senado, a oposição pode se orgulhar de ter derrubado duas Medidas Provisórias, mas não na votação direta. Como as propostas chegaram ao plenário no último dia antes de perder o efeito, bastou prolongar a sessão até meia-noite com discursos e requerimentos. Uma análise mais detalhada mostra que, mais uma vez, o gol contra foi do próprio governo.

Reforma – Uma possível mudança nesse cenário pode surgir com a reforma política. A criação de uma cláusula de barreira que imponha um porcentual mínimo de votos para o funcionamento do partido é uma das alternativas. A medida reduziria a quantidade de legendas no país, o que, em tese, diminuiria o fisiologismo. O líder do PT no Senado, Humberto Costa (CE), é um dos que defendem a mudança nas regras para enxugar o quadro partidário (que hoje conta com 28 legendas) e reforçar a identidade dos partidos. O caminho, diz ele, é criar o voto em lista fechada, o financiamento público e de campanha e pôr fim às coligações proporcionais. Ele admite que não é fácil conviver, no mesmo bloco, com partidos que têm histórias e propostas diferentes: “Há um grau de dificuldade. É natural. No presidencialismo que temos no Brasil, essa convivência tem que acontecer”. A adoção do voto distrital – uma reforma mais profunda e a longo prazo realmente transformadora para a política brasileira – também redundaria na diminuição do número de partidos no país, pois a disputa em cada distrito, mesmo para cargos como vereador e deputado, tenderia a ocorrer entre poucos candidatos realmente competitivos e não entre as centenas de nomes que hoje disputam cadeiras nas grandes cidades. Leia também:

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