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Qual é o legado da gestão Barack Obama?

O primeiro presidente negro dos estados Unidos pode reivindicar progressos reais, mas um sonho se perdeu pelo caminho: o de uma América reconciliada

Por Diego Braga Norte Atualizado em 19 jan 2017, 21h38 - Publicado em 18 jan 2017, 13h55

Ao chegar à Casa Branca sob o lema “Yes, we can”, Barack Obama sabia que o seu lugar nos livros de história seria sempre medido pelas excessivas expectativas que sua eleição provocou nos Estados Unidos e em outros lugares. Além do largo sorriso, calma e elegância no exercício do poder, o que restará dos dois mandatos deste presidente democrata de trajeto peculiar, nascido de um pai queniano e que viveu sua infância no Havaí e na Indonésia?

Da queda acentuada do desemprego à morte de Osama bin Laden, passando pelo restabelecimento das relações com Cuba, o acordo nuclear iraniano e o global sobre o clima, o 44º presidente americano, o primeiro negro da história dos Estados Unidos, pode reivindicar progressos reais. Mas um sonho se perdeu pelo caminho: o de uma América reconciliada.

Os anos de bloqueios irresponsáveis no Congresso e a eleição de Donald Trump depois de uma campanha agressiva sem precedentes, mostram como o país segue atravessado por profundas cisões. Divisões políticas, com dois blocos, republicanos e democratas, que se recusam a dialogar, mas também divisões raciais, que vieram à tona com um vigor imaginável. Ansioso para não ser taxado de “o presidente dos negros”, Barack Obama talvez não tenha sido, paradoxalmente, a melhor pessoa para amenizar as hostilidades.

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O saldo é amargo para aquele que afirmava em 2004, durante um discurso, que não haveria “uma América progressista e uma América conservadora”, “uma América negra e uma América branca”. O presidente tranquilo e razoável, um pouco acadêmico e professoral demais para os seus críticos, não se deu conta do temor desta “outra América”, a de uma classe média branca alarmada com o turbilhão da globalização, processo que não entendem (ou não lhes foi devidamente explicado).

Pacote econômico e Obamacare — Ao assumir o cargo tinha 47 anos de idade e admite que subestimou a inércia de Washington. Só pôde lamentar o tiroteio sistemático dos republicanos do Congresso, mesmo que, incontestavelmente, tenha lhe faltado flexibilidade e habilidade em suas relações com o Capitólio. Confrontado em sua chegada à Casa Branca a um caos econômico, financeiro e imobiliário — setores inteiros da indústria respiravam por aparelhos — fez passar um pacote de estímulo de 800 bilhões de dólares (mais de 2,5 trilhões de reais).

Obama pegou nas mãos um país com uma economia estrangulada pela maior crise financeira desde o crash da bolsa em 1929; e saiu-se bem. Vai entregar um país melhor ao seu sucessor. Quando assumiu, em 2009, a taxa de desemprego estava em quase 10%. Hoje, é de apenas 4,7%. O PIB do país era de 14,4 trilhões dólares; em 2016 será de 17,7 trilhões de dólares, de acordo com a projeção do Federal Reserve (Fed, o Banco Central americano).

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Na área social, conseguiu aprovar, depois de uma batalha parlamentar homérica, a reforma do sistema do seguro de saúde. A Lei de Acesso à Saúde (conhecida como Obamacare) elevou em 20 milhões de adultos e 3 milhões de crianças o número de americanos que contam com cobertura de saúde. “Os custos da saúde também vêm crescendo muito mais devagar, desde que a lei entrou em vigor, se comparados às tendências americanas anteriores à sua aprovação”, escreve o colunista do Financial Times, Martin Wolf. E é justamente o Obamacare que Donald Trump prometeu se livrar, mas ainda sem oferecer uma alternativa às milhões de pessoas que ficarão sem cobertura de saúde.

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Caos sírio —No front das relações exteriores, seu balanço foi misto. Neste sentido, o Prêmio Nobel da Paz em 2009 foi quase um presente envenenado. O comitê do Nobel destacou seus “extraordinários esforços para fortalecer a diplomacia internacional e a cooperação”, trazendo um sopro de esperança onde muitos “gigantes da história”, em suas palavras, fracassaram.

O ex-senador de Illinois pode, legitimamente, reivindicar uma ruptura clara com os anos Bush. Ele orquestrou a retirada das tropas americanas do Iraque e do Afeganistão (diminuindo de 180.000 a 15.000), e proibiu o uso da tortura, prática amplamente utilizada após os ataques de 11 de setembro pela CIA em interrogatórios. Também reintegrou o Irã, grande rival xiita da Arábia Saudita, no jogo diplomático, alegando que os Estados Unidos tinham outras prioridades — Ásia e África na liderança — que apenas o Oriente Médio, tentando redistribuir as cartas.

Mas sua prudência e passividade na guerra na Síria, que tem provocado a pior tragédia humanitária desde a II Guerra Mundial, coloca uma sombra sobre seus anos na Casa Branca. Rejeitando as críticas, ele finalmente admitiu uma forma de impotência. “Eu me pergunto regularmente: havia uma iniciativa que nós não pensamos? Havia um caminho, para além dos que foram apresentados a mim, que Churchill e Eisenhower teriam imaginado?”.

Méritos no combate ao aquecimento global — Da grande decepção da cúpula de Copenhague em 2009, aprendeu uma lição óbvia: nada se faz sem um eixo comum Washington/Pequim. Foi sobre esta base que se construiu em grande parte o sucesso do acordo de Paris, no final de 2015. Trump também prometeu que sob sua gestão, o acordo não será cumprido. No entanto, ele já deu declarações de que pode rever suas opiniões sobre o clima.

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Falhas de Obama — Em outros temas, como no conflito entre Israel e Palestina e no fechamento da prisão de Guantánamo, ele claramente falhou. Obama manteve uma relação tensa com o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu e não avançou em sua proposta de legitimar um Estado Palestino. Já sobre a prisão em Cuba que desafia o direito internacional, dois dias depois de tomar posse, Obama assinou um decreto para fechá-la dentro de um ano. Oito anos mais tarde, o cárcere de reputação sinistra abriga menos detentos, mas ainda existe.

‘Ziguezagues da história’ — Em Chicago, terra de seu aprendizado político, ele tentou em seu último discurso fazer um último apelo, como aquele que o levou ao poder, uma noite de novembro de 2008: “Peço que vocês acreditem na sua capacidade de serem agentes da mudança”. Ciente de que seu balanço poderia, em grande medida, ser rapidamente dilapidado por seu sucessor, Barack Obama manteve até o fim um otimismo feroz, sua marca registrada, elogiada por alguns, ridicularizada por outros. Após o choque da vitória Trump, pediu que as pessoas aceitassem os “ziguezagues” da história e seguissem em frente, ressaltando ser inútil “enrolar-se na posição fetal.”

Popularidade em alta — Barack Obama deixa o Salão Oval aos 55 anos com uma enorme popularidade, semelhante às aprovações de Bill Clinton e Ronald Reagan na mesma fase. Ele termina o mandato com 60% de aprovação, segundo as últimas pesquisas divulgadas pela imprensa americana.

(Com agência France-Presse)

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