Os rebeldes shebab continuam opondo resistência ao regresso das entidades humanitárias expulsas da Somália em 2009. Mesmo assim, cerca de 20 organizações não governamentais (ONGs) internacionais prosseguem trabalhando no país com relativa eficácia, sem a presença de exilados e sob estrito controle dos islamitas.
“Conseguimos trabalhar, mesmo que às vezes seja frustrante”, resume Yves Van Loo, porta-voz em Nairóbi do Comitê Internacional da Cruz Vermelha, presente de forma permanente na Somália desde 1991.
Contra a fome que, de acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), afeta o centro-sul do país, região controlada pelos shebabs, a Cruz Vemelha conseguiu distribuir no final de semana cerca de 400 toneladas de alimentos à população “com total transparência” e exercendo “o controle de A a Z de toda a operação”.
Desde a expulsão de várias ONGs – em especial anglo-saxônicas – por “espionagem e proselitismo cristão”, as que ainda restaram no país mantêm como podem suas ações no coração dos territórios islâmicos. Sem conseguir uma distribuição maciça de ajuda alimentar à população, que agora rejeita os shebabs.
Ao lado da Cruz Vermelha estão profissionais do programa Médicos Sem Fronteiras, do Ação Contra a Fome, da instituição italiana Cooppi, do Solidariedade Internacional e dos Conselhos de Refugiados dinamarquês e norueguês.
Em dois anos, estas ONGs, que não empregam ocidentais no território somali, colocaram em prática vários programas.
“Os exilados analisam os projetos desde Nairóbi’, explica Emmanuel Rinck, diretor do NSP, um programa de apoio às ONGs que trabalham na Somália.
Os expatriados se ocupam das decisões estratégicas, relativas à gestão de projetos, assinatura de contratos, recrutamentos e transferências de fundos. Os somalis colocam em prática as operações.
“Nosso pessoal provém e trabalha com as comunidades locais. Temos uma compreensão total da situação e suficiente competência para exercer nossas atividades”, assegura Jens Oppermann, diretor do Ação Contra a Fome para a Somália.
“Aplicada no ano passado na Somália, Chechênia e Afeganistão, esta metodologia de gestão nunca se desenrolara em escala semelhante”, acrescentou.
Inevitavelmente surge o problema de possíveis desvios de equipamentos e ajuda. “Em dois anos, as ONGs desenvolveram uma série de estratégias para minimizar os riscos”, afirma Rick, enumerando-as em seguida: acompanhamento, contatos diários com o território, utilização de foto/vídeo, pesquisas nas comunidades e auditorias externas realizadas por analistas somalis, entre outras.
Tudo se desenvolve sob a pressão contínua dos shebab, que suspeitam de toda e qualquer organização estrangeira.
As ONGs realizam diariamente delicadas negociações com a administração e com os comandantes shebab locais, lidando sobretudo com a comunidades e chefes de clãs contrários às atividades.
Algumas instituições tentam ainda uma discussão em nível nacional, passando pelos líderes menos extremistas do movimento, ou pelo “Escritório de Vigilância das Agências Estrangeiras” dos shebab, encarregada desde Mogadíscio da gestão da ajuda.
“O sistema funciona com diferenças de uma região a outra”, considera Rinck, para quem, no entanto, “a ajuda segue sendo quantitativamente limitada”.
Na sexta-feira, ao mesmo tempo em que rechaçaram a volta das organizações expulsas em 2009, os shebabs confirmaram que as ainda presentes no centro-sul da Somália poderiam seguir trabalhando.
Para a NSP, a decisão é uma “brisa de oportunidade” para gerir a crise atual, dando condições para que a comunidade internacional e as ONGs envolvidas tenham maior margem de manobra para gerenciar um afluxo massivo de ajuda.