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Massacre de Orlando foi terrorismo ou homofobia? Os dois

À luz da história e dos fatos, a perseguição aos homossexuais é uma constante que faz parte de toda ideologia totalitária

Por Diego Braga Norte 17 jun 2016, 16h51

Omar Mateen, americano de origens afegãs, entrou armado em uma boate de Orlando e assassinou fria e covardemente 49 pessoas. O massacre teria sido pior se a polícia não tivesse interferido e aniquilado Mateen. Dois fatos prontamente se destacaram no episódio: o juramento de lealdade ao Estado Islâmico (EI) feito por Mateen e a escolha precisa de suas vítimas, frequentadores da casa noturna LGBT. No calor dos acontecimentos, as informações foram suficientes para que políticos, aproveitadores e parte do público se envolverem em uma discussão inócua e inútil sobre os motivos do atirador; foi um ato de terrorismo islâmico ou de homofobia? A resposta clara é: ambos, pois uma coisa não exclui a outra.

Se o atirador tivesse entrado em uma sinagoga, seria terrorismo antissemita. Se ele tivesse atirado contra negros em uma igreja gospel, seria terrorismo racista. Frequentador da boate, usuário de aplicativos para encontros gays e, segundo sua primeira mulher, homossexual reprimido, a escolha das vítimas feita por Mateen não foi aleatória, tampouco foi ocasional seu juramento aos jihadistas do EI. Sua investida contra a boate Pulse foi um ato de terrorismo homofóbico. A interpretação extremista do Islã serviu para Mateen justificar seu ódio aos homossexuais, uma muleta ideológica para apoiar seu ódio irracional. O EI saudou o atentado e proclamou Omar Mateen como um “soldado do califado”. A pressa do grupo terrorista em propagar sua ligação – até agora não provada pelos EUA – com o massacre resultou em uma ironia: Omar Mateen é o primeiro mártir gay reconhecido pelo EI, que tanto persegue e assassina homossexuais.

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Aliás, o preconceito e a intolerância não são exclusividade do islamismo jihadista. Momentos depois do atentado, a Igreja Batista Westboro, no Kansas, infame e persistente em sua retórica contra os gays nos EUA, postou em seu Twitter: “Deus mandou o atirador para Pulse em Orlando!”. Seria difícil esperar outra postura de uma igreja cujo website é godhatesfags.com (deusodeiabichas.com). Em Sacramento, capital da Califórnia, o pastor Roger Jimenez, da Igreja Batista da Verdade, disse em seu sermão: “Vocês estão tristes porque 50 pedófilos foram mortos hoje? Eu acho que foi fantástico! Eu acho que isso ajuda a sociedade. Eu acho que Orlando, Flórida, está um pouco mais segura hoje”.

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À luz da história e dos fatos, a perseguição aos homossexuais é uma constante que faz parte de toda ideologia totalitária. O nazismo matou gays nos campos de concentração; o comunismo matou homossexuais na Rússia, China, Cuba e em outros países onde foi implantado. As três religiões monoteístas majoritárias – judaísmo, cristianismo e islamismo – também têm pouco de que se orgulhar e todas já perseguiram ou ainda perseguem os homossexuais. Quando não é a própria religião que condena o homossexualismo, são os homens e governos que utilizam a “palavra divina” para propagar e justificar seus atos. “O perigo da fé religiosa é que ela permite a seres humanos normais colher os frutos da loucura e considerá-los sagrados”, escreve o biólogo e ensaísta Richard Dawkins em seu livro “Deus, um Delírio”.

As partes interessadas em colher seus próprios dividendos da tragédia se entrincheiraram em argumentos pueris, platitudes intencionalmente ingênuas. O próprio pai do atirador, Seddique Mateen, foi um dos primeiros a afastar o componente religioso do atentado e afirmar se tratar de um ato homofóbico. Ex-apresentador de um programa de TV local, onde já defendeu os talibãs, figura com relativa influência política entre os afegãos residentes nos Estados Unidos, Seddique coroou seus 15 minutos de estrelato com uma declaração desastrosa: “cabe a Deus punir os homossexuais”.

No outro extremo da cegueira intencional, fechando os olhos para o caráter homofóbico do massacre, o virtual candidato republicano à Presidência Donald Trump foi rápido em tentar fazer com que a tragédia o ajudasse em sua campanha. O magnata acertou ao classificar a matança como terrorismo, mas errou em todo o restante das suas declarações sobre o assunto, que omitiram propositalmente o perfil homofóbico do terrorista para capitalizar um dos motes de sua campanha: o combate implacável contra o terrorismo islâmico.

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O atentando de Orlando não é apenas uma história de um homem desequilibrado, com fácil acesso a armas de guerra, atirando contra frequentadores de uma boate LBGT. É a história de um homem que nutriu seu ódio contra homossexuais com uma leitura radical e violenta do Islã. Isso torna a compreensão do fato muito mais complexa. Qualquer interpretação que negar um dos lados da história é ingenuidade ou má fé.

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