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Hillary seria melhor para o Brasil, diz especialista da Brookings

"Ela claramente vê o comércio internacional como um dos motores da economia americana", diz o cientista político americano John Hudak

Por Duda Teixeira
Atualizado em 19 out 2016, 20h54 - Publicado em 19 out 2016, 19h28

O cientista político americano John Hudak, da Brookings Institution, tem seguido bem de perto as eleições americanas. Estudioso do poder presidencial americano e sua interferência nas questões administrativas e de campanha eleitoral, ele conversou com VEJA por telefone. 

Como seria Hillary Clinton como presidente dos Estados Unidos? Se ela entrar na Casa Branca, acho que faria um governo mais dinâmico e agressivo. Como Hillary já esteve lá com seu marido Bill Clinton por oito anos, foi senadora e secretária de Estado, ela sabe como as coisas funcionam. Entende que, mesmo que consiga dois mandatos e fique por lá oito anos, o tempo ao final passa muito rápido. Assim, penso que ela ela tentaria intensamente realizar o trabalho que pretende desde o início. Provavelmente, irá batalhar muito pelos direitos das mulheres. Também deve focar nos mesmos temas em que ela se dedicou no passado. Vai procurar aumentar os empregos de classe média e beneficiar aqueles grupos que não têm muita voz em nosso país, como as crianças, os descapacitados e as pessoas de cor. No resto do mundo, ela vai olhar mais de perto para os conflitos, principalmente na Síria e com a Rússia.

O que Hillary poderia fazer para atenuar a guerra da Síria em apenas oito anos? Nos Estados Unidos, tradicionalmente, pessoas que exerceram o cargo de secretário de Estado não fazem críticas ao trabalho do presidente em exercício. É uma questão de respeito ao cargo do presidente. Isso a coloca em uma posição difícil. Como Barack Obama ainda é presidente, ela não tem dito claramente o que pensa em política externa. Reconhece as coisas que Obama tem feito e afirma que todas elas foram para o bem. Mas, e a Síria? É muito claro que a guerra nesse país árabe foi uma das maiores falhas na sua gestão. Se pudesse falar o que pensa, Hillary provavelmente discordaria veementemente de várias decisões que ele tomou. Hoje ela não pode simplesmente aparecer e fazer críticas abertas ao comandante em chefe. Mas, uma vez na Casa Branca, ela certamente mostraria seus planos.

O que Hillary poderia fazer na Síria? A meu ver, ela seria muito mais aguerrida. Tentaria com mais vontade envolver nossos aliados no Oriente Médio e se engajaria mais em campanhas humanitárias. Nossa política externa teria uma direção diferente da atual.

Obama foi eleito pela primeira vez com a promessa de encerrar duas guerras, no Afeganistão e no Iraque. O povo vai aceitar mandar soldados para o Oriente Médio? Os americanos de fato estão cansados das guerras no Oriente Médio. Mas também não querem olhar para a Síria e ver uma crise em andamento, que precisa de uma solução. Tanto Hillary como Donald Trump sabem que não há muito espaço para intervenções militares como as do passado, mas há certamente uma grande variedade de opções na mesa.

O que Donald Trump faria no Oriente Médio? Quando ele fala no assunto, usa uma linguagem infantil. Diz sobre ser mais forte, trabalhar mais com a Rússia e conter a imigração, mas não dá detalhes do que seriam essas coisas. Ele também propõe técnicas espúrias, como a de queimar os campos de extração de petróleo, o que minarias as receitas do Iraque. Se Trump colocar suas palavras em prática como presidente, isso seria uma força desestabilizadora nessa região.

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Qual dos dois candidatos seria melhor para a América Latina? Hillary já passou muitos anos trabalhando de maneira positiva com vários governantes da região. Das duas áreas do mundo que ela mais deu destaque para gerar oportunidades econômicas, destacam-se América Latina e Ásia.

Hillary também tem criticado os tratados de livre-comércio. Em relação à Aliança Transpacífica (TPP, na sigla em inglês), ela diz que o acordo deveria ser renegociado em melhores termos. Não é uma contradição? Mesmo que tenha falado contra alguns tratados, ela tem mantido uma postura consistente ao longo dos anos em incentivar mais comércio entre as nações. Sua experiência como secretária de Estado mostrou isso. Ainda que ela tenha falado contra o TPP, foi ela quem antes foi responsável por negociar sua estrutura. Hillary claramente vê o comércio internacional como um dos motores da economia americana.

Seria ela melhor do que Trump para o Brasil? Sabemos muito mais sobre como seria o governo de Hillary Clinton porque ela descreve mais as políticas que ela pretende colocar em prática. Isso não é dizer que Trump não possa ser um bom presidente, só que sabemos muito pouco sobre quais de fato seriam suas medidas. Por outro lado, é razoável pensar que os comentários inflamatórios de Trump poderiam se transformar em medidas arriscadas. Ele realmente se portaria como presidente da mesma maneira que tem aparecido durante a campanha? Como eu acredito que sim, então é razoável pensar que poderiam haver problemas.

Como seria Trump para a América Latina? Ele tentaria renegociar todos os tratados de livre-comércio. Mas mesmo países que não possuem acordos do tipo, como o Brasil, também seriam afetados, uma vez que Trump prometeu repensar as relações comerciais de maneira ampla. Alguns virão isso como algo muito bom. Outros, como um risco.

Como seria essa mudança? Não temos ideia, porque ele se recusa a dar detalhes. Trump só fala em linhas gerais. Há muita incerteza porque ele não mostrou nenhum plano.

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Trump já demonstrou admiração pelo presidente russo Vladimir Putin. Esse encontro de almas poderia ajudar a resolver a crise na Síria? Os Estados Unidos já tiveram uma relação melhor com a Rússia no passado. Nosso país hoje setá preocupado em não deixar a Rússia fazer coisas para nos desestabilizar ao redor do mundo. Pelos relatos que temos até agora, é de se esperar que Trump, caso assuma, tenha uma negociação melhor com Putin do que Obama. Em tese, uma aproximação seria mutuamente benéfica.

Tanto Putin como Trump desprezam a Otan. O candidato afirma que os demais países membros deveriam injetar mais recursos nessa aliança militar. Faz sentido isso? Não é possível saber como isso aconteceria. O certo é que qualquer ameaça à Otan seria uma força desestabilizadora no mundo. Minha impressão é a de que Trump não quer ficar livre da Otan. Ele apenas entendeu que esse argumento sobre recursos é um eficiente slogan de campanha.

Qual dos candidatos seria melhor para a economia americana? É esse sem dúvida o principal ponto da campanha. Muitos americanos admitem que houve um sucesso incompleto nos oito anos de Barack Obama. Reconhecem que estão melhores do que antes, mas acreditam que não ganham o suficiente ou não têm seguro de saúde. Estão endividados ou procurando trabalho. Se escutarmos o que os economistas estão dizendo sobre o programa dos dois candidatos, a sensação é de que o déficit público seria menor com Hillary do que com Trump. Em relação à criação de empregos, ela poderia ser mais bem-sucedida. De novo, sabemos mais sobre as intenções dela do que de Trump.

Com múltiplos fatores envolvidos, não é ingênuo acreditar que o presidente americano tem o poder de revigorar a economia? Um presidente sozinho não consegue reverter tudo, mas pode perseguir políticas que atinjam alguns resultados econômicos. Obama facilitou a contratação de pessoas por empresas e isso foi muito positivo. Hillary Clinton falou em consertar alguns dos problemas do Obamacare, o que pode diminuir os custos de saúde para empregadores e empregados.

Hillary falou muito em aumentar os impostos dos mais ricos. Ela está sendo honesta ou só quer atrair os eleitores de Bernie Sanders, que ela venceu nas primárias republicanas? Como senadora, ela votou contra as reduções de impostos para os mais endinheirados na administração de George W. Bush. Então podemos assumir que ela levará isso adiante. Além disso, a maioria dos membros do Partido Democrata aprovam isso. Como senadora, isso estava difícil. Na cadeira de presidente, é uma medida que ela realmente poderá fazer.

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Assassinatos de negros por policiais geraram muitos protestos em cidades americanas. O que o próximo presidente poderá fazer a esse respeito? Hillary tem enfatizado o policiamento comunitário e fala muito sobre sobre copiar as melhores práticas das delegacias ao redor do país. É uma abordagem mais ampla, que também incluir uma reforma da Justiça Criminal. Trump sugeriu que uma combinação de maiores oportunidades econômicas nas comunidades que estão sofrendo com esses incidentes de violência, com um maior respeito por policiais nessas comunidades é o caminho para melhorar as relações raciais. Nenhum candidato pode dizer que irá resolver o problema das relações raciais nos Estados Unidos. Seria prometer demais. O melhor que se pode esperar é mantê-las um pouco melhor do que estão agora. Essa solução vai requerer provavelmente décadas de reformas.

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