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A China agora crê em Deus?

Apesar de a regulamentação do cristianismo e outras religiões na China estarem mais frouxas do que nunca, ainda existem restrições

Por BBC
8 set 2010, 21h46

O governo chinês espera que as religiões possam promover a harmonia que defendem e contribuam para a construção de uma sociedade mais harmoniosa

Se alguém pensa em religião na China, provavelmente pensa em budismo ou taoísmo. Mas o cristianismo está no auge, como nunca antes. Muitas das restrições à liberdade de culto que se originaram na Revolução Cultural dos anos 60 foram descartas, abrindo caminho a um grau surpreendente de abertura e liberdade religiosa.

Tanto as igrejas católicas como as protestantes autorizadas pelo estado experimentaram níveis de crescimento que poucos poderiam prever na década de 80. A igreja protestante chinesa faz alarde de 20 milhões de fieis. Os chineses católicos chegam a 10 milhões. De qualquer forma, estão no meio de 1,5 bilhão de habitantes. Ou seja, uma gota no oceano.

O fato é que, apesar de a regulamentação do cristianismo e outras religiões na China estarem mais frouxas do que nunca, ainda existem restrições. Em uma rara concessão, Wang Zuo An, diretor-geral da Administração Estatal de Assuntos Religiosos, falou à BBC e demarcou as linhas que não devem ser cruzadas.

“Em termos de relação entre o estado e a fé, na China se pratica a separação: o estado protege a liberdade de culto e não interfere em assuntos internos dos grupos religiosos; da mesma forma, as religiões têm que manter-se dentro dos marcos constitucionais, da lei e da ordem, e não devem interferir em assuntos do estado, como a administração, educação e justiça”, esclareceu Wang.

“Nosso governo quer que as religiões se desenvolvam na China e estamos dispostos a prover toda a ajuda necessária”, disse o comissário. Assistência que inclui apoio financeiro considerável. Mas, o quê o estado comunista ganha com esse investimento?

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Apoio justificado – “Junto com o progresso trazido pela reforma da China e seu de abertura, temos visto surgir alguns problemas sociais. O governo chinês espera que as religiões possam promover a harmonia que defendem e contribuam para a construção de uma sociedade mais harmoniosa”, afirma Wang.

A mensagem às comunidades religiosas parece ser que se quiserem ajudar a promover a coesão social, o governo comunista não colocará obstáculos, sempre e quando se atenham às regras e não questionem o status quo político.

Em um asilo de idosos mantido por um grupo católico, a BBC encontrou em uma cadeira de rodas uma senhora muito velha que – de rosário e crucifixo no pescoço – canta uma música de boas-vindas. O padre J.B. Lang explica que, quando chegou ao centro, a mulher não falava. Muito menos cantava.

De acordo com o sacerdote, a política chinesa de um só filho deixou muitos idosos completamente abandonados. “Depois de um tratamento essa senhora voltou a falar. Inclusive descobriu a fé. Servir aos outros com amor, esse é o princípio cristão. Alguns funcionários do governo dizem que nós fazemos pela sociedade o que eles não podem fazer. E opinam que a igreja faz bom trabalho, apreciado por eles.”

No mesmo centro, um ancião que parecia um mendigo também queria cantar. Orgulhoso, o padre o anima. Mas de sua boca brota uma melodia discordante: o que entoa é uma canção de sua juventude comunista.

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“Tenho muito a agradecer a Mao. Sem a revolução não teria aprendido a ler, nem teria terra para lavrar. Foi depois, quando já não pude trabalhar, que tive de pedir esmolas”, explica e, em seguida, canta um hino católico. Os empregados sorriem aliviados pela demonstração de amor à religião, depois da que deu ao comunismo: essas são as lealdades duplas que têm de aceitar.

Alguém com memórias muito menos doces da Revolução Cultural é o bispo da diocese de Xangai: Abysius Jin, que passou 27 anos na prisão por ser padre quando Mao Tse Tung comandava o país. Com seus 94 anos, não duvida em criticar a igreja a que se manteve fiel por tanto tempo.

“Se não se utilizassem métodos contraceptivos na China haveria uma explosão populacional que não seria boa para ninguém”, disse ele, sentado ao lado de uma foto do papa, que não estaria muito de acordo com sua opinião. “Ele é muito conservador. É alemão. Preferia que fosse mais progressista.”

Tendências – Na Academia Chinesa de Ciências Sociais, entretanto, os intelectuais se dedicam a analisar a fé de outra perspectiva. Além de investir no desenvolvimento da religião, o governo também financia o estudo dela como fenômeno social. O professor Xhuo Xinping lidera uma equipe de mais de cem pesquisadores que estão estudando se há um vínculo na história ocidental entre a prosperidade econômica e o protestantismo, e como a China pode se beneficiar disso.

“Nossos economistas mantém discussões muito interessantes sobre a ética protestante e o espírito calvinista. É muito importante revelar o segredo do desenvolvimento social de uma cultura.”

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Desse ponto de vista, a religião poderia contribuir para o desenvolvimento econômico da China – uma hipótese que se examina nesse centro de estudos comunista, sem sinais de que exista alguma contradição entre os postulados. Mas e o compromisso do comunismo com o ateísmo? “Respeito a pergunta sobre a existência de Deus. O Partido Comunista crê que não”, esclarece Wang.

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