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“Nunca imaginei que tivesse fãs no Brasil”, diz Cher

Em São Paulo para receber um prêmio, o ícone pop conta que já foi até agredida por causa do figurino extravagante e acredita que a sorte a ajudou a se transformar em uma estrela

Por Mario Mendes
10 abr 2015, 15h25

Cher finalmente veio ao Brasil. Mas ainda não para se apresentar em um show como gostariam seus inúmeros fãs no país – ela diz nunca ter incluído o país em uma de suas várias turnês por não imaginar que havia um público fiel por aqui a sua espera. Nesta sexta-feira, em São Paulo, a atriz a cantora é a convidada de honra do jantar anual de gala da associação americana amfAR (Fundação para as Pesquisas da AIDS) – o quinto realizado na cidade – e recebe o prêmio Inspiration, por seu engajamento na luta pelos direitos da comunidade LGBT e no combate a aids. Sim, a noite da amfAR também conta com um show musical, mas as atrações são a australiana Kyle Minogue e a brasileira Alcione.

Aos 68 anos, a americana Cher é uma verdadeira instituição pop. Conhecida sobretudo pelos figurinos extravagantes, pela coleção de cirurgias plásticas e pela voz grave, a cantora e atriz está completando 50 anos de uma carreira que inclui 25 álbuns, quinze filmes (e um Oscar, por O Feitiço da Lua, em 1989) e sete turnês internacionais. Seus primeiros sucessos foram na década de 60, época da dupla Sonny e Cher, que formava com o primeiro marido, Sonny Bono, com quem teve uma filha, Chastity – hoje um homem, Chaz Bono, desde que se submeteu a uma cirurgia de adequação de gênero, em 2008. Divorciada de Sonny em 1975, ela também é mãe de Elijah Allman, filho de seu segundo casamento com o também músico Greg Allman. No ano passado, devido a um infecção viral, Cher teve de interromper a turnê Dressed to Kill, que ela pretende retomar no próximo mês, quando espera estar novamente apta para por o pé na estrada.

De Los Angeles, Cher falou a VEJA sobre seu envolvimento na causa LGBT, a influência decisiva da mãe – hoje com 87 anos -, a ousadia dos figurinos e o fator sorte que a ajudou a se transformar no ícone que é hoje.

A senhora vem ao Brasil especialmente para receber o prêmio da amfAR (Fundação Para as Pesquisas da AIDS) por sua colaboração na luta pelos direitos LGBT e em particular nas campanhas contra a aids. Como começou o seu engajamento nessa área? Estou envolvida com várias causas humanitárias, mas o combate à aids sempre foi algo muito próximo de mim, tanto por causa dos meus fãs gays como pelos meus amigos gays. Quando a doença ainda não tinha nem um nome e eu estava fazendo um grande show em Las Vegas, subitamente os bailarinos e as drag queens do espetáculo começaram a adoecer. Em pouco tempo, apenas um dos bailarinos havia sobrevivido. E nós simplesmente não sabíamos o que estava acontecendo. Desde então comecei a me envolver, pois levou algum tempo até que os médicos e cientistas descobrissem a doença e mais tempo ainda até que o governo começasse a tomar providências. Fui a primeira artista a levantar 1 milhão de dólares para o tratamento e combate da aids infantil no início dos anos 80.

Abraçar causas políticas e sociais é um traço muito forte da sua geração, a dos anos 60. E hoje vivemos um momento em que esses assuntos estão de volta na agenda, com as pessoas discutindo problemas e levantando bandeiras. A senhora acha que o mundo ainda não aprendeu as lições que deveria? Acho que nos Estados Unidos as pessoas demoraram muito para protestarem contra problemas terríveis como nosso envolvimento nos conflitos do Iraque e do Afeganistão, ao contrário do que ocorreu no tempo da Guerra do Vietnã. Nos anos 60, nós éramos jovens que acreditavam na força da união para mudar o mundo. Aliás, nós americanos temos uma tradição de nos manifestar quando sentimos que alguma coisa está errada e que o povo precisa ser ouvido, mas desta vez as pessoas pareciam estar apáticas e lentas. Ao mesmo tempo, sinto que há certo retrocesso em nosso país, com alguns estados aprovando leis que nos devolvem a um passado de preconceito e intolerância em relação aos direitos humanos.

A senhora se refere ao que ocorreu recentemente em Indiana, com as leis que asseguravam o direito de certos estabelecimentos comerciais barrarem o acesso de gays devido a questões religiosas? Sim, em Indiana e no Arkansas. Mas houve uma verdadeira explosão de protestos nas redes sociais no país inteiro porque a nova geração tem se revelado mais radical e politicamente ativa do que os seus pais. Por causa dessa reação, os dois estados foram obrigados a mudar essas leis discriminatórias. Acho um absurdo ter que discutir essas questões ainda hoje quando todos os cidadãos deveriam ter direitos e oportunidades iguais. Homens, mulheres, gays, negros, enfim todo mundo. Falo especificamente do meu país, mas vejo isso acontecendo em toda parte. Hoje mesmo conversava com amigos sobre essa intolerância religiosa monstruosa que estamos presenciando. Meu pai era descendente de armênios e este ano é o centenário do massacre dos armênios pelos turcos. Lembro de meu avô contando para a família essa história e eu querendo saber o porquê de tanta violência. Ele simplesmente me dizia que era uma luta religiosa: turcos muçulmanos de um lado e armênios cristãos do outro. Para mim isso não faz o menor sentido. É apenas uma insanidade do ser humano.

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A senhora é religiosa? Não, sou uma pessoa espiritualizada. Sigo a filosofia budista e não tenho religião nenhuma. Respeito todas as religiões e sei da importância de uma crença na vida das pessoas. Eu escolhi o caminho do budismo por se tratar de uma filosofia liberal.

Como artista, a senhora criou uma personalidade única, com um visual forte, ousado e impactante. Como é ver hoje artistas da nova geração repetindo coisas que a senhora já apresentou há muito tempo e sendo considerados ultra criativos e originais? Acho muito engraçado. Como em todas as épocas, eu segui o caminho aberto por artistas que vieram antes de mim. Mas é preciso dizer que paguei um alto preço por certas coisas que fiz. Sonny e eu chegamos a ser expulsos de hotéis, de restaurantes e até sofremos agressões físicas por causa da nossa maneira de vestir. Por exemplo, Sonny tinha o cabelo tão comprido quanto o meu e muita gente não gostava porque parecíamos diferentes de todo mundo. OK, você pode dizer que estávamos nos anos 60 e havia uma revolução de costumes em marcha e por isso pode parecer exagero meu. Mas eu diria que Sonny e eu nos adiantamos um pouco.

Essa aparência extravagante era um ato de protesto ou vocês simplesmente achavam que era assim que um artista deveria se apresentar? Bem no início da minha carreira com Sonny, nós nos apresentávamos de maneira muito comportada. No palco, éramos um casal como outro qualquer. Era no dia a dia que ousávamos: cintos com fivelas grandes, sapatos de plataforma, pantalonas com bocas imensas. Um dia fomos nos apresentar em Oakland e nossas malas com os figurinos de cena foram extraviadas, então tivemos que subir no palco com nossas roupas de todo dia. As pessoas simplesmente enlouqueceram e graças a essa apresentação fomos parar na televisão. Mas não porque nos admirassem – muito pelo contrário, as pessoas nos odiavam por causa do nosso look. Só quando nos apresentamos em Londres, algum tempo depois, é que sentimos pela primeira vez uma plateia realmente receptiva, que gostava de nós, da nossa música e das nossas roupas. Depois de Londres tudo ficou mais fácil.

Quais foram as suas influências artísticas? É curioso, mas não fui influenciada por cantoras. Marlene Dietrich talvez tenha sido minha maior influência, porque ela ampliou as fronteiras na maneira como um artista se apresenta, na atitude, no modo de vestir, misturando roupas masculinas e femininas. Fui influenciada, sobretudo, pelas atrizes de Hollywood, porque era o mundo de fantasia onde eu queria viver. Tirando minha mãe e suas amigas, que eram divertidas e liberais, a vida real para mim era muito chata. Cresci em um ambiente muito conservador e preconceituoso, porque minha avó materna era do sul dos Estados Unidos e simplesmente não admitia nada muito avançado. Quando eu tinha dez anos, uma amiga de mamãe começou a namorar um rapaz negro e, antes de sair para visitar vovó, minha mãe me fazia jurar que não ia tocar nesse assunto perto dela. Inclusive porque poderia colocar nossa amiga e seu namorado em sérios problemas. Acredito que sou liberal por ter descoberto muito cedo o que significava preconceito.

Sua mãe ainda é viva, não? Viva demais. E ainda fervendo, aos 87 anos.

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Como a senhora se define hoje como artista? Mais cantora ou mais atriz? Digo que sou cantora, porque adoro cantar. E sou atriz porque adoro estar diante de uma plateia. Se me perguntarem em que momento eu descobri que sou atriz, respondo que ainda não descobri. Mas sei que posso atuar.

A senhora é conhecida por ter ao menos uma canção em primeiro lugar nas paradas para cada uma das suas cinco décadas de carreira, além de um Oscar (por O Feitiço da Lua, em 1988). Houve algum momento em que o sucesso lhe escapou? Acredito muito na sorte. Com certeza existem artistas infinitamente mais talentosos do que eu, mas que não tiveram tanta sorte. Por exemplo: no final dos anos 90 minha carreira ia muito mal. De repente meu agente me abandonou, a gravadora me despediu e as propostas de trabalho pararam de chegar. Até que Rob Dickins, um executivo de gravadora inglês, me convidou para gravar um álbum em Londres. Fui, gravei e foi um fracasso. Ele não desistiu e me propôs fazer algo no gênero disco. Achei que era alguma espécie de piada, mas ele insistiu, apresentou várias músicas e me deixou totalmente a vontade para escolher. Uma delas era Believe. Foi um tremendo golpe de sorte, que me levou de volta às paradas de sucesso.

Qual o seu próximo passo? Mais uma turnê, álbum, filme ou série de tevê? Ainda estou me recuperando, depois da infecção viral que me deixou de cama no hospital e me fez interromper minha turnê Dressed to Kill. Assim que estiver completamente recuperada retomo os shows. Mas meu novo projeto só será anunciado no meu aniversário, dia 20 de maio. Até lá não posso revelar nada. Apenas digo que será algo muito excitante.

Por que a senhora nunca incluiu o Brasil em nenhuma turnê? Porque que nunca imaginei que tivesse fãs no Brasil. Cometi o mesmo erro com o México, que corrigi finalmente na minha penúltima turnê, e foi um sucesso. Mas realmente ninguém na minha produção nunca me disse para incluirmos a América Latina nas turnês. Prometo que não cometo mais esse erro e pretendo, em breve, me divertir muito fazendo um show no Brasil.

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