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Mulheres abrem mão da depilação — por gosto ou pelo feminismo

Paris Jackson apareceu no VMA 2017 com pelos nas axilas e recebeu críticas e apoio nas redes sociais

Por Da Redação Atualizado em 14 set 2017, 08h44 - Publicado em 14 set 2017, 08h01

Tradicional palco de polêmicas da música pop, o Video Music Awards (VMA) deste ano foi marcado menos por desacordos e acordes altissonantes que pela presença por inteiro de Paris Jackson, a agora crescida filha de Michael Jackson. Paris, hoje com 19 anos, é uma militante da renúncia à depilação, e deixou isso bem claro ao circular com as axilas à mostra pelo evento. Ela não é a primeira a aderir a, ou liberar, os pêlos. Britney Spears, Drew Barrymore, Beyonce, Julia Roberts, Sonia Braga, Madonna e Patti Smith são algumas famosas que já apareçam sob os holofotes sem depilação. Mas nem por isso foi menos comentada — e criticada. Uma das questões que Paris deixou no tapete vermelho da premiação da MTV americana é qual é, exatamente, a lógica da depilação: as mulheres a fazem porque desejam ou a fazem, até mesmo sem perceber, por imposição?

Para a historiadora Ana Maria Colling, o fato de a mulher “ao natural” não ser bem aceita hoje está ligada a toda a construção social do corpo feminino, que é histórica. “Desde os tempos mais remotos, os homens foram os autores do saber – médico, religioso, filosófico, jurídico etc. E o corpo feminino sempre foi objeto de interpretações, de valorações, de cuidados e de controle por parte dos homens”, explica a professora, que é autora do livro Tempos Diferentes, Discursos Iguais – A Construção Histórica do Corpo Feminino (UFGD, 114 páginas).

Segundo Ana Maria Colling, a depilação não é uma prática recente. Ao longo da história da humanidade, os pêlos assumiram papeis distintos, ora bem vistos, ora indesejados. A egípcia Cleópatra teria sido a primeira “famosa” a retirá-los em nome da beleza. Mais tarde, na era feudal, eles foram mantidos no corpo. “Na Idade Média, época das trevas e do moralismo religioso, os corpos deviam ser escondidos, cobertos, e a depilação era proibida, pois, para os moralistas de então, a prática era considerada heresia ou bruxaria”, conta a professora. Depois da chamada Noite de Mil Anos, nos séculos XVI e XVII, curiosamente, os pêlos ganharam um status sexual em algumas partes do mundo. “As mulheres consideradas decentes se depilavam para se contrapor às imorais.”

Hoje, embora sustentada por uma grande indústria, a depilação, assim como aconteceu durante o movimento hippie das décadas de 1960 e 70, é questionada por jovens que escolhem, por razões pessoais ou políticas, deixar os pêlos em partes do corpo como as pernas, axilas e sobrancelhas. Luiza Junqueira, youtuber do canal Tá, Querida é um exemplo. A jovem parou de se depilar há cerca de três anos depois de o pai reclamar que ela havia passado um tempinho longe das lâminas. “Eu fiquei bolada com aquilo. Meu pai é um cara hiperpeludo, muito mesmo, e ficou bravo porque eu não tinha me depilado”, conta, sobre o ponto de partida para a problematização sobre a liberdade e autonomia que possuía sobre o próprio corpo.

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Contar a experiência para todos, porém, não é uma escolha fácil. “É dar a cara a tapa”, admite Luiza, sobre os vídeos que postou em seu canal sobre a opção por não se depilar. “As pessoas ficam indignadas, bravas e me xingam de coisas horríveis, e eu não estou obrigando ninguém a fazer nada”, explica. Na rua, a situação também não é das mais aceitas. A jovem lembrou três ocasiões em que sofreu retaliação em público. Em uma delas, um grupo de garotos estudantes começou a tacar bolinhas de papel enquanto ela saía de um ônibus no Rio de Janeiro, cidade na qual mora. “Hoje em dia, eu não levanto nem mais um braço para segurar no transporte público se eu estou de alcinha”, conta.

Se as impressões externas podem não ser positivas, sobre as mudanças no próprio corpo a jovem conta apenas alegrias. Além de deixar para trás a alergia que as lâminas causavam, ainda relata que adora o fato de ter se livrado de mais uma obrigação. “Em relação a cheiro e higiene, que são as coisas que as pessoas mais perguntam e criticam, não senti nenhuma diferença”, diz sobre um dos pontos mais questionados por quem diz sentir nojo de mulheres que não se depilam.

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Longe das visualizações dos vídeos no Youtube, a creative researcher de 27 anos Andréia Rocha decidiu parar de se depilar com um processo um pouco menos impulsivo. “Eu sempre fui bem peluda, desde criança, o que fez com que essa questão se impusesse para mim ainda bem novinha, com 5 ou 6 anos, porque sofri um leve bullying dos meninos do condomínio onde eu morava por eles me chamarem de lobisomem”, relata Andréia. Não se encaixar no que era socialmente aceito fez com que ela entrasse logo cedo no mundo da depilação. “Doía muito, e hoje vejo o quão cruel é submeter uma criança a tal experiência.”

Depois de muitas ceras, lâminas e até sessões de depilação definitiva, Andréia começou a questionar por que deveria fazer todos esses processos rotineiramente e conheceu mulheres que não se depilavam por questões políticas. “Aquilo, aos meus 17 anos, me parecia estranho e, obviamente, transgressor da norma. Mas me levou a ter um pensamento mais crítico a respeito da minha própria forma de lidar com o corpo, que foi amadurecendo e me levou a perceber o quanto do que eu vivia no privado dizia respeito a uma questão muito maior, de caráter social.”

Hoje, a pesquisadora de tendências segue somente sua vontade, o que deveria ser a regra para todas as mulheres que devem decidir o que fazer com seus corpos sem ser alvo de críticas. “Cheguei à conclusão de que não precisava provar nada para ninguém, nem por que eu não os depilava, nem por que depois disso eu os depilei novamente”, declara Andréia. “Meu corpo, minhas regras. E como eu lido com ele não deveria em absoluto ser uma questão pública.”

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