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Estupro, machismo: ‘Nada Será Como Antes’ é o ontem hoje

Com sutil ironia, série discute o machismo nosso de todo dia – o dos anos 1960 e o de hoje, que parecem ser o mesmo, cinquenta anos depois

Por Maria Carolina Maia Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 14 dez 2016, 10h05 - Publicado em 7 dez 2016, 10h47

No começo, parecia uma escolha empobrecedora a de se contar a chegada da TV ao país por meio de uma ficção que fugia de fatos e personagens reais. Aos poucos, porém, a decisão de Guel Arraes e Jorge Furtado se mostraria acertada. A distância permitiu à dupla criadora de Nada Será Como Antes, série de época que a Globo exibe nas noites de terça-feira, abordar temas controversos com uma ironia provocadora – do teste do sofá à negociata entre os dirigentes de emissoras e o mundo político, quase nada escapa à série. Outro tema que pulsa na história de Arraes e Furtado é o machismo, principalmente na trama de Verônica (Debora Falabella) e Saulo (Murilo Benício), o homem que traz a televisão ao Brasil, no programa, e que, apesar da generosidade já demonstrada em diversas situações, é incapaz de aceitar que a ex-mulher tenta tido um filho durante um hiato no casamento. Na noite desta terça-feira, Saulo, que arrancou a criança de Verônica por ciúme, chegou ao ponto de tentar estuprá-la.

Beira o deboche a maneira como o machismo é retratado em Nada Será Como Antes. Há diálogos em que personagens se queixam do preconceito – também há racismo, representado pelo ator negro que tem bastante trabalho no rádio, mas na TV só obtém papeis pequenos como o de escravo – e parecem falar dos dias de hoje. A trajetória de Verônica na série poderia ser a de uma mulher nos tempos atuais. Foi Saulo quem a deixou, convencido de que a faria infeliz por ser estéril e não poder dar a ela o filho que desejava. Saulo se arrependeria e voltaria à atriz, com quem tinha um casamento feliz, mas, nesse intervalo, ela havia saído com um ator americano que estava de passagem pelo país e engravidado. Ao descobrir que Verônica espera um filho de outro homem, Saulo se sente traído, embora não tenha sido. Começa aí o calvário da atriz. Além de sair de casa, ela perde o espaço de estrela da TV Guanabara, afinal, pega mal empregar uma mulher que é mãe solteira. O empresário dá uma ajuda enviesada, contudo: volta a empregar Verônica em sua rádio – com um pseudônimo.

Tudo vai mais ou menos bem até ela abrigar em sua casa um amigo que acaba de se separar da esposa. Ele dorme na sala, mas basta Saulo descobrir para imaginar que Verônica está com outro homem – apesar de abandonada e solteira, ela parece não ter esse direito, de que o ex-marido, aliás, acaba de desfrutar com uma ninfeta. Como havia, em outro ato generoso, aceitado assumir a paternidade do filho da ex no papel, para ajudá-la a matricular o menino em uma creche, Saulo, cego pelo ciúme, vai à Justiça para tirar a guarda do garoto da mãe. A guerra chega aos jornais – e Verônica tem o filme ainda mais queimado.

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Depois de muita desavença, os dois têm um rápido momento de paz no aniversário do menino, que comemoram juntos, e é então que Saulo tenta tomá-la à força. Ele primeiro é gentil, faz uma oferta para que ela volte à TV e para que retomem o casamento. Aí, diz ele, devolveria a guarda de Tiago. Verônica o xinga e o acusa de usar o garoto para chantageá-la. Os dois trocam tapas e Saulo a agarra e a joga sobre o sofá. A atriz é salva pelo filho, que entra sem avisar na sala (veja aqui a cena toda). Desconsiderada a batalha judicial – modernizada, a legislação de agora não permitiria que uma mãe só visse o filho aos fins de semana por ter saído com outro homem enquanto dava um tempo no casamento, nem mesmo se tivesse traído –, a história parece muito atual. A tentativa de estupro, exibida na noite desta terça-feira, vem para corroborar essa impressão. Pauta de uma recente campanha que procurava tirar da vítima a culpa pela violência sexual e de outra em que usuárias expunham nas redes sociais casos de assédio que sofreram, ele parece um mal longe da extinção.

Do teste do sofá ao racismo e ao machismo, Nada Será Como Antes mostra que, infelizmente, evoluímos muito pouco.

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