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Caio Blat entre política e drogas, em ‘Uma Longa Viagem’

Dirigido por Lúcia Murat e com participação do ator global, o documentário narra as duas voltas ao mundo dadas por Heitor, irmão da diretora enviado a Londres para não ser preso pela ditadura. O filme estreia nesta sexta-feira

Por Raissa Pascoal
Atualizado em 10 dez 2018, 10h33 - Publicado em 11 Maio 2012, 13h22

Há três anos, a morte de Miguel, o mais velho dos três filhos rebeldes de uma família da classe média carioca, levou a diretora Lúcia Murat a remexer em correspondências guardadas por três décadas. Nelas, Heitor, o mais novo dos irmãos, contava à mãe, com as devidas censuras, suas andanças pelo mundo nos agitados anos 1970. A versão completa dessas viagens seria mais tarde narrada pelo próprio Heitor a Lúcia, que após a perda de Miguel se empenharia em preservar a memória e a identidade dos Murat. O que começou como um simples registro familiar se transformou em Uma Longa Viagem, misto de drama e documentário que venceu o último Festival de Gramado e chega agora aos cinemas apresentando a intimidade de uma família mesclada às turbulências de um período histórico intenso.

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Reunidas em três volumes, as correspondências de Heitor reconstroem a trajetória de um jovem brasileiro enviado a Londres pelos pais em 1969, para que não se envolvesse na luta contra a ditadura militar e terminasse como sua irmã, presa em 1971 e torturada pelo DOI-Codi por quase quatro anos. O menino, então com 18 anos, não encontrou calmaria na capital inglesa, porém. A cidade estava em plena efervescência cultural, e Heitor mergulhou nas drogas antes de sair em viagem como hippie, dando duas voltas ao mundo somente com um cortador de unha e um lenço, segundo conta.

“No momento em que comecei a trabalhar no roteiro das entrevistas com o Heitor, vi que era um material tão singular que pensei em fazer um filme”, diz Lúcia.

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O drama e a realidade – É antiga a relação de Lúcia Murat com a realidade. A iniciação cinematográfica da diretora, que tem no currículo ficções inspiradas em fatos como Quase Dois Irmãos (2004), foi com o gênero documentário. Primeiro, em 1984, com o curta O Pequeno Exército Louco. E depois em 1988, com o longa Quero te Ver Viva, que reúne depoimentos reais de oito ex-presas políticas torturadas pelos militares, além da dramatização da atriz Irene Ravache, com delírios e fantasias de uma personagem anônima.

O formato é semelhante ao usado em Uma Longa Viagem, feito de entrevistas de Heitor à irmã e dramatizações de suas cartas pelo ator Caio Blat. “Eu não queria fazer algo tipo Discovery Channel, com Heitor ou um ator lendo as cartas e um monte de imagem colada. Queria representar aquele rapaz ingênuo que chegou a Londres e o arco dramático que ele percorreu por dez anos, até se ver angustiado na Índia. Para isso, eu precisava de um ator”, diz Lúcia.

“Eu tinha obrigação de reproduzir literalmente os textos, mas também de recriar o clima intimista de um filho falando com a mãe. Foi um trabalho em cima de um documento, mas permeado por toda uma rede de afetos, lembranças e subjetividades”, diz Blat, que conversou com Heitor e leu todas as cartas para se preparar. No documentário, o ator não interage com nenhum personagem, apenas com o conteúdo das cartas e as projeções – incluindo o videoarte feito pelo poeta carioca Chacal em Londres. A interpretação lhe rendeu o prêmio de melhor ator no Festival de Gramado de 2011.

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Narrativas paralelas – Junto à leitura das cartas, uma narração em off, feita pela própria diretora, de textos seus, fazem o filme ir e voltar na história da família, que o documentário aborda a partir da morte de Miguel. Inicialmente, o tom familiar do filme se mistura aos acontecimentos da época da ditadura, incluindo a prisão de Lúcia depois do decreto do AI-5 (Ato Institucional nº 5) por seu envolvimento com o movimento estudantil. Ao longo da narrativa, no entanto, o interesse pelas histórias contadas por Heitor e gravadas durante um ano e meio por irmã suplantam o conteúdo histórico.

Mais velho e sem vergonha de falar sobre os excessos com as drogas, as prisões e ilegalidades, Heitor conta tudo aquilo que não escreveu para a mãe. A partir de seus depoimentos, o duplo sentido do título Uma Longa Viagem se justifica e ele deixa de ser apenas uma referência à distância geográfica percorrida, mas a sua busca pela espiritualidade com as experiências, novas culturas e sua consequente internação em uma casa de saúde pela Embaixada Brasileira na Índia, de onde voltou para o Brasil para ser tratado no Rio de Janeiro.

Apesar da relação da família com os acontecimentos que marcaram o país à época da ditadura, no longa não se deve esperar que os militares sejam mais que um pano de fundo. A graça do filme é a forma como a história de Heitor é resgatada, primeiro com o tom sóbrio das cartas e as omissões que um jovem de 18 anos faz à mãe e, depois, com os depoimentos desinibidos de um senhor que nada mais quer do que assentar – de vez – no Rio de Janeiro. Vale a pena para quem não espera um documentário de época.

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