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Brasileiros na Segunda Guerra são tema de documentário

Produção ‘O Caminho dos Heróis’, dirigida pelo músico João Barone, refaz a trilha dos soldados na Itália e analisa a importância do Brasil no conflito

Por Raquel Carneiro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 30 jul 2014, 13h31

Com os olhos cheios de lágrimas, um idoso italiano relembra a época da Segunda Guerra Mundial, quando ele e sua mulher grávida passavam fome em Porretta Terme, vilarejo ao norte do país. As lágrimas, contudo, são mais de emoção do que de tristeza, e correm enquanto ele conta como o exército brasileiro chegou ao local e passou a dividir a comida com os nativos.

Este é um dos episódios narrados no documentário O Caminho dos Heróis, dirigido e apresentado pelo músico João Barone, baterista da banda Os Paralamas do Sucesso, que chega ao canal History nesta quinta-feira, dia 31, às 23h.

A produção nacional refaz a rota dos pracinhas brasileiros, enviados à Itália, em 1944, com dois jipes restaurados e caracterizados com as insígnias da Força Expedicionária Brasileira (FEB). Barone, acompanhado de outros entusiastas do tema, explora os locais onde os brasileiros atuaram, narra seus principais combates e faz homenagens aos mortos.

Barone, autor do livro 1942 – O Brasil e Sua Guerra Quase Desconhecida, lançado em 2013 pela editora Nova Fronteira, possui um afeto especial pelo tema. Seu pai foi um dos brasileiros convocados para a Guerra e, quando voltou, não falava sobre o assunto com a família. “O fato de ele não falar só acendeu o meu imaginário sobre o meu pai como aquele herói valente da Guerra. O efeito foi exatamente o contrário”, conta em entrevista ao site de VEJA.

A trilha acompanhada pelo documentário passa em cidades da Itália, onde a FEB atuou. Qual a importância destes lugares na Segunda Guerra? O Brasil começou as operações de guerra aos arredores da Toscana, e depois subiu para Emilia-Romagna. Estas são regiões com cidades pequenas, que faziam parte de um roteiro estratégico para desalojar os alemães e conseguir chegar até Bolonha, outra cidade importante neste eixo – por onde entravam os recursos para os alemães continuarem a lutar -, coisa que os aliados não conseguiram fazer até o final de 1944. Tem também este célebre morro, o Monte Castello, que os brasileiros conseguiram tomar em fevereiro de 1945, depois de quatro investidas. Outro lugar importante é Fornovo di Taro, onde os brasileiros cercaram e renderam uma divisão alemã inteira, com mais de 14.000 homens.

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Quais foram os números que mais te impressionaram em relação aos brasileiros na Guerra? Nossa participação na Guerra fica um pouco à mercê das estatísticas gigantescas de outras forças aliadas, que contabiliza mortos na casa dos milhões. Do Brasil, foram enviados 25.000 homens, destes, cerca de 14.000 entraram efetivamente em combate e, durante os nove meses de ação do nosso país na Guerra, cerca de 470 brasileiros morreram. Aí muitos falam: “Mas morreram só 470 brasileiros?”. Pensando assim, desvalorizamos a importância que estes homens tiveram em combate. O sacrifício feito por eles. Ao longo destes nove meses, uma média de dois brasileiros morreu por dia.

No documentário, o senhor destaca a diferença da tropa brasileira, por seu famoso “jeitinho”, dos demais aliados. Como isso influenciou a ação do Brasil na batalha? A guerra é uma coisa monótona, são horas e horas de tédio, pontuadas por minutos de altíssima tensão. A gente tem um ideal um pouco romanceado do que significa estar em combate, por conta de filmes. Eu acho que os brasileiros chegaram lá, assim como todas as outras nações que não estavam preparadas para encarar uma Guerra. Apesar do treino, somente em campos de batalha você ganha expertise. Acho que os brasileiros também foram um caso de “chegar até lá”. Todos achavam que a Guerra ia até o final de 1944, mas não acabou, foi até a primavera de 1945. Os brasileiros chegaram desacreditados, ganharam experiência em campo e cumpriram sua missão.

O envolvimento das tropas com a população nativa também é um dos destaques de sua pesquisa. Sim. Os brasileiros tinham uma interface muito diferenciada com a população italiana, por causa da natureza latina e da proximidade do idioma, o que não acontecia com os soldados de outras nacionalidades. Os ingleses não se relacionavam com a população, eram tidos como arrogantes e pouco cordiais. Quando levantavam acampamento, eles cavavam um buraco e jogavam tudo dentro, comida, remédio, cobertor, queimavam e tampavam. Já os americanos davam as sobras para a população. Quando chegou a vez dos brasileiros, eles dividiam a comida deles com a população, que vivia um tempo de dificuldade. Até hoje os italianos destas cidades tem um carinho especial pelos brasileiros por atitudes como esta.

Divulgação/VEJA

João Barone em cena do documentário 'O Caminho dos Heróis'
João Barone em cena do documentário ‘O Caminho dos Heróis’ (VEJA)
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Seu pai participou da Guerra. O que pode contar sobre a experiência dele no combate? Meu pai não falava muito sobre a Guerra. Ele não era militar, foi um dos muitos brasileiros que teve que largar sua vida normal para ir pra Europa lutar. Como ele não falava muito sobre essa experiência, nós nunca descobrimos se ele matou algum soldado ou não. Mas sabemos que ele participou do último ataque ao Monte Castello, em fevereiro de 1945, então ele teve uma experiência na frente de combate.

Foi por causa dele que surgiu seu interesse pelo assunto? Sim, exatamente, acho que tínhamos essa presença com o tema em casa, mesmo sem ele incentivar a conversa. Então, o fato de meu pai não falar muito, que é um comportamento comum dos ex-combatentes, só fez acender o meu imaginário sobre o meu pai como aquele herói valente da Guerra. O efeito foi exatamente o contrário.

Qual o legado que a Guerra deixou para as pessoas que vivem nestes lugares agora, setenta anos depois? A Guerra nessa região da Itália é uma lembrança bem longínqua. O que chama mais a minha atenção é o respeito que eles têm pelo que aconteceu. Você não consegue ver o cenário de Guerra ali porque já mudou tudo, na época os morros eram todos carecas, porque os alemães cortaram todas as árvores e os bombardeios arrasaram o cenário, era uma planície lunar. Hoje o cenário é outro. Ao pé do Monte Castello, o campo fica forrado de dente-de-leão, em uma mistura de verde e amarelo. Quem passa ali fala: “Parece que é em homenagem aos brasileiros que morreram aqui”. Lá em Monte Castello tem uma praça com um monumento em honra aos brasileiros.

Tem planos para outra produção com o tema? Eu e meu irmão temos um núcleo voltado para projetos que envolvem essas histórias do Brasil na Guerra. Temos outra série documental preparada e também preparamos uma minissérie, chamada Terra de Ninguém, que é um drama fictício. Esperamos poder carimbar estes projetos.

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