Assine VEJA por R$2,00/semana
Continua após publicidade

Ensino médio brasileiro precisa entrar no século XXI

Especialistas pregam expansão e reforma do ensino técnico e flexibilização da grade curricular para contornar fracasso do ciclo

Por Lecticia Maggi
26 ago 2012, 08h16

“O ensino médio brasileiro é muito chato, uma colcha de retalhos que não leva conhecimento a quem deveria. O professor se sente impotente para ensinar e o aluno, para aprender.” O julgamento da professora Maria Inês Fini, doutora em educação e idealizadora do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), é corroborado pelas mais variadas aferições. De cada cem estudantes que ingressaram no ciclo em 2008, 35 não chegaram a seu fim três anos: repetiram ou deixaram a escola. Entre os bravos que ficam, poucos aprendem o esperado, como comprovaram recentemente os resultados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Pelo indicador, o ensino médio obteve em 2011 média de 3,7 em uma escala de 0 a 10. Pior: além ser ruim, ele praticamente não melhorou em relação à medição anterior. Se faltavam indícios de doença, pode-se atestar agora enfermidade gravíssima. O MEC esboçou uma resposta aos maus resultados. Entre outras medidas, sugeriu o agrupamento das 13 disciplinas do ciclo em quatro áreas de conhecimento. Educadores ouvidos por VEJA.com dizem que isso não é suficiente para manter os jovens na escola e formá-los apropriadamente. Eles propõem a massificação do ensino técnico, a possibilidade de os estudantes escolherem a ênfase de seus cursos e a eleição das disciplinas de português e matemática como pilares do ciclo – confira as principais propostas no quadro abaixo.

Leia também:

Reinaldo Azevedo: ‘Mercadante decide maquiar ensino médio’

Continua após a publicidade

MEC vai usar Enem para calcular Ideb do ensino médio

Continua após a publicidade

Novo currículo do ensino médio deve ser inspirado no Enem

Ideb cai em nove estados no ensino médio

37% das cidades não atingem metas do Ideb 2011

Continua após a publicidade

Na visão dos especialistas, o ensino médio brasileiro é, em suma, uma invenção do século XX que ainda teima em sobreviver nos nossos dias. Falta “identidade” ao ciclo, dizem os estudiosos. Por lei, o estudante deveria sair dessa etapa do ensino preparado para o ingresso tanto no mercado de trabalho como na universidade. Mas, a exemplo do ciclo fundamental (em especial, o de escolas públicas), que não ensina a ler nem a fazer contas elementares, o médio não fornece ferramentas profissionais e intelectuais a contento a jovens expostos a um mundo cada vez mais competitivo e exigente. O cientista político Simon Schwartzman, ex-presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e autoridade em educação, afirma que o conteúdo apresentado hoje aos estudantes do ensino médio é calcado essencialmente naquilo que é cobrado pelo Enem e pelos vestibulares. “Isso, é claro, é prejudicial para aqueles que não pretendem seguir para o ensino superior”, diz Schwartzman.

Uma grade curricular “engessada, rígida e antiquada” é outra receita infalível de fracasso. O formato desmotiva os estudantes, que, por volta dos 15 anos, já sentem florescer competências, preferências e sonhos – além, é claro, de incompatibilidades, aversões e pesadelos. Assim, apesar de cultivarem interesse por áreas específicas do conhecimento, ainda são obrigados a enfrentar um curso sem variações, cujo currículo é igualmente aplicado a todos. “São muitas áreas, e todas abordadas superficialmente. O aluno, então, aprende à base de memorização, repetindo o que o professor fala”, diz Schwartzman. “Não surpreende que tantos desistam. É preciso oferecer algo que pareça e de fato seja útil a esse jovem.” Continue a ler a reportagem

O ensino médio para o séxulo XXI
O ensino médio para o séxulo XXI (VEJA)
Continua após a publicidade

A amplitude da grade curricular citada por Schwartzman parece intimamente ligada à má qualidade de sua aplicação. Nas palavras de Ricardo Henriques, professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) e superintendente executivo do Instituto Unibanco, a “quantidade de matérias obrigatórias culminou, ironicamente, na limitação do aprendizado”. “Ao impedir que o aluno se aprofunde em uma área de seu interesse, restringe-se o horizonte dele”, diz. “Vê-se que o ensino ainda está no século XIX.”

O ensino técnico é uma estrada a ser alargada e estendida por todo o Brasil. É o consenso entre os especialistas. Mas a modalidade também precisa de mudanças, ou melhor, de atualização. Hoje, caso opte por essa modalidade, o estudante tem de cumprir toda a carga horária do ensino médio regular, além da mínima obrigatória da carreira escolhida. Na prática, significa que ele ficará ao menos um ano a mais na escola. É um desestímulo para os jovens, em particular, e para a economia, em geral. “As duas modalidades, regular e técnica, deveriam ter a mesma duração. Se o jovem que opta pelo técnico tem um curso mais longo, essa deixa de ser uma alternativa”, diz o colunista de VEJA Cláudio de Moura Castro, Ph.D em economia e referência no estudo do cenário educacional brasileiro. O resultado disso muitas vezes é que o jovem se lança ao mercado de trabalho sem a desejada qualificação técnica, com perdas evidentes para ele próprio e para o país.

O Brasil não vai reinventar a roda se promover as mudanças sugeridas no ensino médio. Na Grã-Bretanha, os estudantes do ciclo equivalente ao ensino médio brasileiro devem escolher no máximo cinco disciplinas, que já podem ser voltadas à área para a qual os alunos pretendem se dedicar na universidade. Na Alemanha já a partir do sexto ano do ensino fundamental, os alunos devem optar por um de três modelos de escola. A decisão é tomada em conjunto por pais e professores, levando-se em conta também a trajetória escolar e as notas do aluno. Há instituições que oferecem formação profissionalizante e outras voltadas à progressão acadêmica.

Continua após a publicidade

A proposta do governo de agrupar as disciplinas em quatro grandes áreas (linguagens, ciências da natureza, ciências humanas e matemática) não é considerado de toda ruim pelos especialisas. Tampouco é nova. Uma resolução de 26 de junho de 1998 já previa tal organização, mas a reforma nunca saiu do papel. E isso não ocorre à toa. “Teoricamente, é uma boa ideia, mas cuja aplicação é difícil”, diz Maria Helena de Castro, ex-presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e membro da Academia Brasileira de Educação. “O professor polivalente pode ser uma solução, mas antes é preciso discutir como prepará-lo adequadamente.” Lapidar mestres, portanto, é fundamental. Mas ainda não apareceu nos planos do governo para colocar o ensino médio no século XXI.

Leia também:

Reinaldo Azevedo: ‘Mercadante decide maquiar ensino médio’

MEC vai usar Enem para calcular Ideb do ensino médio

Novo currículo do ensino médio deve ser inspirado no Enem

Ideb cai em nove estados no ensino médio

37% das cidades não atingem metas do Ideb 2011

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.