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“A Unicamp deve promover internacionalização para baixo”

Novo reitor da Unicamp defende que a instituição lidere universidades "piores" e que amplie programas de inclusão social para elevar a 50% o porcentual de aprovados oriundos da rede pública

Por Lecticia Maggi
6 Maio 2013, 09h26

O engenheiro de alimentos José Tadeu Jorge, de 60 anos, assumiu em 19 abril, pela segunda vez, a reitoria da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O fato é inédito nos 46 de história da instituição. Reitor entre 2005 e 2009, Tadeu Jorge deixou o posto para dar lugar ao médico Fernando Ferreira Costa. Quatro anos depois, foi escolhido pelo governador Geraldo Alckmin para voltar ao cargo. Com a nomeação, o governador atendeu a um desejo da comunidade acadêmica – Tadeu Jorge foi o mais votado em uma lista tríplice enviada pelo conselho universitário da instituição a Alckmin, a quem cabia a decisão final. No comando da universidade que responde por 15% da produção acadêmica brasileira, o reitor tem o desafio de gerir um orçamento de 2,4 bilhões de reais (referente a 2013) e administrar três campi, que englobam 22 unidades de ensino e pesquisa. Além disso, Tadeu Jorge quer fazer com que a Unicamp – considerada em 2012 uma das 50 melhores instituições de ensino do mundo com menos de 50 anos – lidere universidades de outros países. O objetivo: trazer ao Brasil pesquisadores que enxerguem no país uma oportunidade de aprendizado – o que garantirá à instituição mais mão de obra para pesquisa. É o que ele chama de “internacionalização para baixo”.

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Em conversa com o site de VEJA, Tadeu Jorge explica o conceito e defende que a instituição amplie programas de inclusão para que metade de seu quadro discente seja composto por alunos egressos da rede pública. No último vestibular, estudantes oriundos da rede pública representaram 33,3% do total de aprovados. Confira a seguir os principais trechos da entrevista:

Hoje, a instituição responde por expressivos 15% de toda a produção acadêmica do país. O que fazer para ampliar esse índice? Primeiramente, precisamos manter nosso parque de equipamentos atualizado. As tecnologias evoluem rapidamente e temos que estar atentos para não perder a oportunidade de estarmos na ponta do conhecimento. Depois, precisamos ampliar os cursos de pós-graduação e iniciação científica. Uma das prioridades é aumentar o programa de pós-doutorado, já que eles atraem pessoas com independência acadêmica, capazes de catalisar outros pesquisadores e dar visibilidade aos estudos realizados.

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É possível falar em metas de ampliação da pós-graduação da Unicamp durante a gestão do senhor? É um aspecto difícil porque abrir novos campos de pesquisa não é uma ação da gestão. O papel da reitoria é definir a questão como prioridade e induzir a ampliação, mas precisamos conversar com os institutos e profissionais envolvidos para conhecer as tendências, fraquezas e necessidades de cada área. Acredito que vou levar mais quatro meses para fazer um levantamento quantitativo e então poder trabalhar com metas.

A USP divulgou recentemente a abertura de três escritórios fora do país (Londres, Boston e Singapura). A Unicamp pretende seguir o mesmo caminho? O que deve ser feito para promover a internacionalização da universidade? A internacionalização é inerente ao trabalho de qualquer universidade, pois precisamos estar sempre em sintonia com o que é desenvolvido no mundo. Mas isso não significa necessariamente ter sede em outros países. Sem criticar a decisão da USP, acho que esse posicionamento físico não nos ajudaria. O fundamental é promovermos o contato entre pesquisadores, estimulando eventos, workshops, seminários e aulas. Vale esclarecer que, quando se fala em internacionalização, já pensamos em internacionalização para cima – quando pesquisadores de instituições de ponta vem ao país compartilhar seus conhecimentos -, mas devemos lembrar também da importância da internacionalização para baixo.

O que é internacionalização para baixo? Internacionalização para baixo significa a Unicamp liderar universidades que estão em níveis inferiores do conhecimento e enxergam na nossa instituição uma oportunidade de aprendizado. Temos qualidade suficiente para nos propormos a fazer isso. As universidades que estão no topo dos rankings de qualidade sempre procuram liderar as que estão abaixo, atraindo pessoas para o seu corpo de pesquisadores. Ao olharmos a base de pesquisa de grandes universidades americanas, veremos mais asiáticos e peruanos, por exemplo, do que americanos.

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Os benefícios para os pesquisadores de outros países parecem claros: eles aplicarão em sua terra-natal as técnicas que aprenderem com os profissionais daqui. Mas, para a Unicamp, quais as vantagens desse tipo de internacionalização? Além de se tornar referência nos países de origem dos pesquisadores e ficar cada vez mais conhecida, a instituição consegue obter mais mão de obra. Pesquisa exige uma infraestrutura de pessoal enorme e, ao pensarmos somente em internacionalização para cima, diminuímos a base de sustentação dos nossos projetos e, com isso, a eficiência. Por exemplo: a capacidade de um professor-orientador de fazer pesquisa sozinho, por mais renomado que ele seja, é limitada. Mas, se seis pós-graduandos se juntarem a ele, essa capacidade será ampliada. Podemos incentivar a vinda de pesquisadores do Peru, Chile, Moçambique, Rússia… Isso aumentaria enormemente a nossa possibilidade de desenvolver novos projetos e obter resultados inéditos.

A Unicamp ofereceu, para o ano letivo de 2013, 3.320 vagas em cursos de graduação. O senhor tem a intenção de ampliar esse número? Sim, é um objetivo. No campus principal, em Campinas, a capacidade de ampliação é muito limitada. Poderíamos até construir mais algumas salas de aula, mas a logística do campus está saturada. Por isso, nosso foco se volta ao campus de Limeira, que foi projetado para ter 1.000 vagas, mas desde a sua inauguração, em 2009, preencheu 480 vagas. Hoje, o campus oferece oito cursos: ciências do esporte, engenharia de manufatura, engenharia de produção, nutrição, gestão de agronegócio, gestão do comércio internacional, gestão de empresas e gestão de políticas públicas. Há outros oito que já foram aprovados – ciências da natureza, biologia, química, física, matemática, produção cultural, patrimônio e restauro e fisioterapia – e estariam em condições administrativas e burocráticas de serem iniciados, precisaríamos apenas complementar a infraestrutura e contratar professores. A meta até o fim da gestão é essa: chegar a 1.000 vagas no campus de Limeira.

A ampliação de vagas na Unicamp deve vir acompanhada de programas de inclusão? Sim. A Unicamp foi a primeira universidade brasileira a criar um programa de inclusão: o Programa de Ação Afirmativa e Inclusão Social (Paais), em 2004, que garante 30 pontos extras na nota final do vestibular a alunos oriundos de escolas públicas e 40 pontos a negros, pardos e indígenas. Acho este o método mais eficiente de inclusão já que mantém a competividade e seleção, fazendo apenas um nivelamento dos alunos pela oportunidade de aprendizado que tiveram. A Unicamp estuda aumentar a pontuação que é concedida a esses grupos, mas desde que isso não comprometa a qualidade dos ingressantes. Outra maneira de se fazer inclusão é por meio do Programa de Formação Interdisciplinar Superior (Profis), curso de formação básica de dois anos, voltado exclusivamente a alunos da rede pública e que substitui o vestibular tradicional. A lei das cotas federal, que determina que, até 2016, as instituições federais de ensino superior reservem 50% de suas vagas a alunos oriundos de escolas públicas, virou um indicador. Acho que é interessante a Unicamp chegar a este índice também.

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Em 2013, estudantes egressos da rede pública representaram 33,3% dos ingressantes na Unicamp. Há, portanto, um longo caminho até que eles representem metade dos calouros. O Programa de Inclusão com Mérito no Ensino Superior Paulista (Pimesp) deve ser adotado para se chegar a esse patamar? O Conselho Universitário ainda não se posicionou sobre o assunto, acredito que o processo de substituição de reitores acabou atrasando um pouco a discussão nas unidades. Entendo o programa como mais uma alternativa de inclusão que a universidade poderia utilizar se as ações anteriores não chegarem ao valor que consideramos que devem chegar. O Pimesp seria uma 3ª via de inclusão, não a única.

Uma das maiores críticas ao Pimesp é a criação de um curso semipresencial de dois anos que substituiria o vestibular tradicional. Esse curso será uma espécie de reforço escolar? O que acontecerá com o aluno que, por ventura, desistir de cursar uma das três universidades estaduais paulistas – USP, Unesp ou Unicamp – ao término do curso? É um pouco mais do que reforço. Do ponto de vista formal, o curso sequencial pode emitir ao aluno um certificado de estudos ou um diploma. Pelo que entendemos da proposta, o Instituto Comunitário de Ensino Superior (Ices) [órgão que atuará em parceria com a Universidade Virtual do Estado de São Paulo no fornecimento dos cursos] irá entregar àqueles que concluírem os dois anos de estudos e obtiverem média acima de sete um diploma de curso sequencial de ensino superior. Agora, não sei dizer qual valor o mercado de trabalho dará um diploma dessa natureza. A crítica é a mesma que se pode fazer a outros cursos de nível superior de dois anos: alguns deles o mercado valoriza e outros, não. Só podemos fazer especulações quanto à validade desse diploma e o que vai melhorar na empregabilidade de um aluno que decidir não cursar ensino superior.

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