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Empresas lucram com produtos apreendidos na Alfândega

Em leilões promovidos pela Receita, pessoas físicas têm acesso restrito, enquanto empresas arrematam suprimentos para revender no mercado interno

Por Ana Clara Costa
9 jun 2012, 16h22

O aumento da fiscalização de importados nos portos e aeroportos – que tem causado transtornos a empresas e cidadãos brasileiros – vem beneficiando outros participantes do mercado, além do próprio Fisco. Um conjunto de companhias especializou-se em aproveitar os leilões de mercadorias apreendidas pelo órgão (veja quadro explicativo) para comprar os produtos e revende-los no país a preços abaixo da média.

Em 2012, a Receita Federal realizou 22 certames, que resultaram numa arrecadação de 26,4 milhões de reais para o governo. Isso significa que, por exemplo, um macacão de bebê da marca Ralph Lauren que custou 20 dólares e que foi apreendido na mala de um casal que voltava de Miami pode parar num site de comércio eletrônico, onde é oferecido pelo dobro (ou triplo) do preço – e ainda assim custar menos que o valor médio praticado no país.

A empresa Ipcal, sediada no Brás, região central da capital paulista, se autointitula em sua página na Internet como a “principal cliente da Receita Federal e a maior arrematante de leilões do país”. Entre os objetos que comercializa estão máquinas destinadas a supermercados, como empacotadoras, peças automotivas e utensílios domésticos – tudo arrematado junto ao Fisco. Apesar de não fazer vendas pela Internet, a Ipcal atende seus clientes por telefone e também em sua loja física. Já a Arrematados.com, com sede no bairro Macuco, em Santos (SP), disponibiliza variados tipos de produtos – desde bijuterias e brinquedos, passando por artigos eletrônicos, até máquinas e material hospitalar – a clientes previamente cadastrados. Em seu portal, onde se apresenta como uma “empresa especializada em produtos arrematados em leilões da Receita Federal com ótimos preços”, é possível dar lances pelos produtos. Procurados pela reportagem, os responsáveis pelas companhias não retornaram o pedido de entrevista ou recusaram-se a falar.

Só para especialistas – Assim como a Ipcal e a Arrematados.com, outras firmas – muitas delas com CNPJ de companhia de importação e exportação – especializaram-se em comprar lotes em leilões da Receita e fazer a revenda no mercado interno.

A lógica do negócio exclui amadores. Os preços mínimos dos certames já embutem os impostos do comércio exterior. É preciso ser um bom negociador para levar os lotes a um preço baixo o bastante para competir em condições vantajosas no mercado interno. Além do lance, o vencedor ainda tem de arcar com o ICMS do estado onde a mercadoria foi leiloada e o frete para envio da mesma ao local de recebimento. Dados esses custos, a maioria das empresas prefere não possuir uma estrutura física para revenda, nem mesmo ter um site proprietário de e-commerce. A opção mais barata, e preferida no segmento, é efetuar a revenda através de portais de leilões, como o Mercado Livre.

“Geralmente, quem vende produtos arrematados já têm clientes específicos e sabe como funciona a burocracia dos leilões. Uma empresa que não sabe acaba se dando mal e pagando mais do que deveria”, explica o funcionário de uma empresa que participa de leilões, mas que preferiu não ser identificado.

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A elaboração dos preços mínimos dos leilões é feita pela própria Receita. A fórmula, no entanto, é uma incógnita. Segundo um auditor ouvido pela reportagem, a regra é vender pelo preço marcado na nota fiscal apreendida, acrescido do imposto de importação. Contudo, muitos produtos chegam sem nota, e aí cabe ao Fisco determinar o valor.

Pessoas físicas não têm vez – Ainda que muitos dos objetos apreendidos possam interessar ao cidadão comum, como bebidas, eletrônicos e cosméticos, o acesso a pessoas físicas é bastante restrito. De acordo com a Receita Federal, dos 36 leilões previstos para 2012, apenas três poderão ter a participação de consumidores finais. O site de VEJA apurou que a organização de um leilão destinado exclusivamente a empresas sai mais barato ao Estado e causa “menos tumulto” – vem daí a preferência do governo federal por essa modalidade.

Os lotes que, por alguma razão, não são arrematados, são doados posteriormente pelo Fisco a órgãos públicos e entidades sem fins lucrativos, ou então, dependendo do estado em que estiverem, são destruídos. De acordo com a Receita, o Centro de Referência da Saúde da Mulher e de Nutrição, Alimentação e Desenvolvimento Infantil (CRSMNADI) do Hospital Pérola Byington, em São Paulo, recebeu em 2012 quase 500 mil reais em doações de produtos hospitalares apreendidos.

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Entenda os leilões de produtos apreendidos pela Receita

A Receita libera um edital em que detalha os lotes de produtos, os valores mínimos e dá informações sobre o pregão. Na maioria dos casos, tanto em leilões de mercadorias de portos quanto de aeroportos, o certame é feito pelo E-CAC – Centro de Atendimento Virtual de Atendimento do órgão. Para participar, é preciso ter cadastro de pessoa jurídica, um certificado digital e clicar na opção ‘leilão eletrônico’.

É necessário também avaliar os produtos. A empresa interessada pode ir até o local onde as mercadorias estão armazenadas e verificar o estado de cada uma para ter certeza de que valem a pena. Muitas vezes, os produtos ficam tanto tempo nos armazéns, que quando vão a leilão já deteriorados.

Se o conteúdo dos lotes for aprovado pelo possível arrematante, o próximo passo ocorrerá apenas no dia do leilão. Em um horário pré-determinado no edital, todos os participantes devem enviar suas ofertas por meio do site, sendo que ninguém pode ter acesso à proposta do concorrente. Passa para a próxima etapa a empresa que fizer a maior oferta e todas aquelas que fizerem propostas até 10% inferiores à da maior ofertante. Segundo especialistas, esse tipo de pregão é utilizado para “afastar aventureiros”, ou seja, para que apenas pessoas que de fato entendam do mercado de um certo produto estejam aptas a participar.

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Os finalistas continuam a disputa no dia seguinte, ainda pelo site, mas por meio de um pregão tradicional, onde é possível ter acesso às ofertas da concorrência – e é dessa etapa que sai o lance vencedor. “É uma operação burocrática e cara. É preciso pagar tudo à vista, inclusive o ICMS sobre a mercadoria. Além disso, temos de contratar sempre uma empresa de frete para tirar os produtos dos armazéns da Receita. Para pessoa física, não vale a pena”, afirma o funcionário de uma empresa que participa de leilões e que garante vender seus produtos ao consumidor final a um preço, no mínimo, 20% inferior ao praticado no mercado. “Se o cliente compra muitas unidades, conseguimos dar um desconto ainda maior”, acrescenta.

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