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Artigo: Brasil doente 2 – 13,5 milhões de desempregados

O escritor Augusto Cury escreve sobre a angústia do desemprego

Por Augusto Cury
18 abr 2017, 12h09

Em meu primeiro artigo para VEJA, “Um Brasil doente”, abordei sinteticamente que o país está doente pelas necessidades neuróticas de muitas lideranças políticas e empresariais de ter o poder pelo poder, pela falta de projetos sustentáveis de médio e longo prazo, pelo número estratosférico de desempregados, 13,5 milhões. Agora quero dar algumas ferramentas para quem perdeu seu emprego ou passa pelos vales dos estresses. Como transformar crises em oportunidades? Como trabalhar perdas em ganhos ou usar os dias dramáticos para escrever os melhores textos de nossa história? Não existem fórmulas mágicas, mas existem ferramentas inteligentes de gestão da emoção para otimizar a capacidade do eu, que representa a consciência crítica e a capacidade de escolha, para autor da sua própria história.

Em primeiro lugar temos de entender o funcionamento básico da mente humana. Embora sejamos a única espécie que pensa e tem consciência que pensa em meio a mais de 10 milhões de espécies, temos mecanismos instintivos, animalescos, que entram em cena nos focos de tensão e nos fazem reagir sem pensar, pautados no mecanismo de “luta e fuga”, no binômio “predador e vítima”. Se nos posicionarmos como vítima, não nos reciclamos e nem nos reinventamos! Se nos posicionarmos como predadores, ferimos as pessoas, inclusive quem mais amamos. Sem gestão da emoção, pais asfixiam a personalidade dos filhos, casais se digladiam, executivos tornam-se algozes dos seus colaboradores.

Brilhantes pensadores como Freud, Skinner, Piaget, Hegel, Kant, Sartre, Descartes, usaram o pensamento para produzir suas notáveis teorias, mas não tiveram a oportunidade de estudar sistematicamente o próprio pensamento, sua natureza, tipos, processo de registro e gerenciamento dos pensamentos e da emoção. Não estudaram que não apenas o Eu lê a memória, mas há outros fenômenos inconscientes que o fazem e que podem perder sua função e nos encarcerar no único lugar que deveríamos ser livres, dentro de nós mesmos. O Eu tem quatro copilotos inconscientes que o ajudam a pilotar a aeronave mental.

Exemplo: quando uma pessoa é estressada, por exemplo pela perda de emprego, ofensa, exclusão social, o Gatilho mental (1º fenômeno) dispara no córtex cerebral e encontra um arquivo traumático ou janela Killer (2º fenômeno). Imediatamente, o volume de tensão que emana dessa janela é tão grande que faz com que a Âncora (3º fenômeno) fecha o circuito da memória, impedindo o Eu de ter acesso a milhares de arquivos com milhões de dados. Aqui mora o primeiro perigo. Neste momento deixamos de ser Homo sapiens, pensantes, e nos tornamos Homo bios ou instintivo. Por isso, nos primeiros segundos de tensão ferimos quem mais amamos. Palavras que pais nunca deveriam dizer para seus filhos, atitudes que parceiros jamais deveriam expressar um para o outro, são produzidas nesse cálido momento. Em seguida o Autofluxo (4º fenômeno inconsciente) começa a ler e reler a memória sem controle. Aqui mora o segundo perigo. O Eu deixa de pilotar a mente humana, fica aprisionado, e começamos a ter altíssimos índices GEEI (gasto de energia emocional inútil), através das preocupações, reclamações, autopunições, crises de ansiedade. A consequência? Esgotamento cerebral: acordar cansado, dores de cabeça, baixo limiar para suportar contrariedades, impaciência, dificuldade de conviver com pessoas lentas.

Vocês nunca ficaram assombrados porque nossa história é manchada por guerras, conflitos religiosos, discriminação, exclusão de minorias, homicídios, suicídios. Ao longo de mais de trinta anos estudei e escrevi sobre os quatro fenômenos inconscientes acima. Fico assombrado em como é fácil sair da condição de ser Homo sapiens, pensante, para ser Homo bios, animal. Por isso, a educação mundial precisa ser reciclada, sair da era do racionalismo cartesiano para a era da gestão da emoção. Sem educação socioemocional nossa espécie é quase inviável.

É surpreendente como o Eu se aprisiona em armadilhas mentais nos focos de estresse e deixa que os mecanismos instintos prevaleçam sobre ele. O binômio luta e fuga, predador e vítima, pode ser útil numa savana africana quando estamos diante de uma fera, ou na floresta amazônica quando estamos diante de uma serpente, mas não na “floresta social”, onde as relações são complexas e as soluções são sofisticadas, ele pode aumentar o índice GEEI e ser destrutivo e autodestrutivo. Precisamos usar nossa inteligência para nos superar, reinventar, tornamo-nos protagonistas de nossa história, diretores do nosso script. Vejamos algumas dessas armadilhas mentais.

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RECLAMAR

Reclamar é uma forma notável de gastar energia mental inutilmente. Quem reclama com frequência fecha o circuito da sua memória, asfixia sua intelectualidade, bloqueia sua capacidade de pensar em outras possibilidades. Um Eu que reclama muito não é líder de si mesmo, patina em cima de seus problemas, não sai do lugar, não constrói sua resiliência, fragmenta sua capacidade de trabalhar suas dores, perdas e frustrações. Quem reclama em excesso não assume sua responsabilidade, deixa nas mãos do outro seu destino, sem saber que “o destino é frequentemente uma questão de escolha e não uma inevitabilidade”. Por isso, no silêncio mental deveríamos todos os dias impugnar cada reclamação, discordar da necessidade neurótica de encontrar culpados pelo nosso drama e corajosamente nos reinventar.

RUMINAR O PASSADO

Ninguém teria coragem de entrar numa casa e, ao invés de contemplar seus móveis, quadros e jardins, ir até sua cozinha ou banheiro e enfiar a cabeça na lata de lixo. Mas metaforicamente falando fazemos isso com a grande casa chamada mente humana. Nosso Eu, por não treinado na educação cartesiana para gerir nossa mente, tem tendência a ruminar o lixo do passado, se fixar nos arquivos traumáticos ou janelas Killer que contém a perda de emprego, injustiças, mágoas, ofensas. Quem se fixa no passado não apenas esgota seu cérebro, mas torna-se carrasco de si mesmo. Deveríamos fazer a higiene mental diariamente, duvidar controle do passado, criticar nosso sentimento de incapacidade e sair do cárcere do conformismo. Quem vela seu passado não oxigena seu presente.

SOFRER PELO FUTURO

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A mente humana é de uma complexidade tão grandiosa que você não precisa de assistir um filme de terror para se amedrontar, basta seu Eu não gerenciar seus pensamentos que você mesmo o criará. A maioria das pessoas sofre por antecipação, torna-se um cineasta de terror que exibe na tela de sua mente cenas que destroem sua esperança, asfixia sua motivação, nutre o humor depressivo e coloca combustível na ansiedade.  Deveríamos pensar no futuro apenas para desenvolver estratégias, nos inspirar, motivar, sonhar. Deveríamos todos os dias não apenas duvidar de tudo que nos controla, mas também criticar cada pensamento perturbador, reação fóbica, ideia fixa, humor depressivo. Quando o Eu, no silencio mental, recicla o seu lixo psíquico, ele o transforma em adubo para nutrir sua coragem, segurança, liderança.

COBRAR DEMAIS DE SI E DOS OUTROS

Como digo no livro “O Homem mais Inteligente da História” quem cobra demais de si e dos outros está apto para trabalhar numa financeira, mas não para ter uma bela história de amor com sua saúde emocional e com as pessoas que o rodeiam. Quem cobra demais dos seus filhos, alunos, parceira (o), torna-se um predador deles, um engenheiro de janelas Killer nos solos de sua mente, asfixiando sua liberdade, inventividade e prazer de viver. Quem cobra excessivamente de si, torna-se seu próprio predador, pune-se com frequência, amordaça sua ousadia, capacidade de empreender.

Uma mente inteligente usa suas perdas para conquistar seus sonhos, suas lágrimas para irrigar a sabedoria, suas vaias para construir seu sucesso. Uma mente inventiva usa suas angústias e crises para se construir e não se destruir. Uma mente resiliente tem índice GEEI baixo, reclama pouco e ousa mais, rumina pouco o passado e sofre pouco pelo futuro pois cria muito no presente, dá sempre uma nova chance para si e para quem ama, portanto cobra pouco. Sabe que esperar a oportunidade depende dos outros, mas cria-las depende de si mesmo! Bem-vindos as ferramentas de Gestão da emoção que estão ao alcance de todos nós!

*O psiquiatra Augusto Cury é o escritor mais lido da década no Brasil e tem livros publicados em mais de 70 países.

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