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‘Avisamos que exigir empresa nacional no pré-sal não funcionaria’

Magda Chambriard, que deixa o comando da Agência nesta sexta, diz que governo foi alertado sobre possível fracasso da política usada no pré-sal

Por Da redação
Atualizado em 2 nov 2016, 10h33 - Publicado em 2 nov 2016, 10h11

Magda Chambriard deixa a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) nesta sexta-feira, após quatro anos como diretora-geral e mais oito em outras funções. Funcionária de carreira da Petrobras, Magda teve papel ativo na descoberta de grandes áreas do pré-sal e travou embates severos com grandes petroleiras, como a Petrobras. “Eu falo baixo, mas com firmeza, exigindo respeito ao país”, diz.

Na sua opinião, o Brasil não conta hoje com um aparato regulatório que permita extinguir o sistema de multa por descumprimento da política de conteúdo local, como pretende a indústria. Mas conta, ao mesmo tempo, que desde 2009 indica ao governo que algumas petroleiras se comprometeram com porcentuais irreais de aquisição interna. A seguir, trechos da entrevista.

Na sua gestão, houve reclamação de que a ANP teria aplicado multas bilionárias às petroleiras. A crítica é realista? Não houve nenhuma multa bilionária. Elas são da ordem de menos de 500 milhões de reais. Há menos de 400 milhões de reais pagos. Eu diria que parte das multas está no limite de não ser coercitiva. Esse assunto é de extrema importância, porque a indústria fornecedora emprega muito mais do que as petroleiras. A gente pode escolher não ligar para isso ou pode ver que tipo de benefício pode tirar. Eu não tenho dúvida de que exageramos na mão para mais (sobre a capacidade da indústria nacional de atender à demanda das petroleiras). Mas se uma empresa disser que não quer fazer nada no Brasil, talvez a gente esteja exagerando na mão para menos.

Qual o papel da agência no atual ambiente de crise? Costumo dizer para as empresas: ‘Entendo as suas dificuldades. Mas pretendo que a sociedade seja beneficiada num momento de preços altos’. Quando as empresas ganharem muito dinheiro, qual será o benefício para a sociedade? Essa via tem de ser de mão dupla.

É possível adotar um sistema de incentivos no lugar das penalidades, como é proposto pelas companhias petroleiras, sem afundar a indústria fornecedora nacional? Vou deixar esse desafio para o meu sucessor. O que posso fazer é trazer essa discussão para o âmbito do TCU (Tribunal de Contas da União), um órgão de controle. Já ouvi no governo dizerem: ‘TCU, não recomende, determine. Se você recomendar, eu não cumpro’. Será que penalidade zero resolve, se há posturas desse tipo, passíveis de acontecer até pela conjuntura legal do país? Se a gente tem um aparato regulatório que não permite gerar incentivos, como motivaríamos as empresas sem gerar penalidades? Se não propusemos, é porque ainda não descobrimos isso e a própria indústria ainda não nos trouxe uma solução diferente.

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O quanto dessa discussão está impregnado de interesses empresariais e políticos? Não discutimos política. O que fazemos aqui é implementação de política e cumprimento de contrato. Se não fizéssemos isso teria um nome: prevaricação. A gente não está de brincadeira nem querendo atrapalhar a vida de ninguém.

Há má-fé no pedido da revisão completa do compromisso de conteúdo local feito pela Petrobras e sócias para a área de Libra, no pré-sal da Bacia de Santos? Fizemos um pedido de esclarecimento e estamos analisando. Mas nem tanto ao mar nem tanto à terra. Para conversar com a ANP, precisa vir com argumentos elaborados. Agora, que poderia contratar tudo no Brasil não foi a ANP que disse. Ao contrário, dissemos (ao governo) desde o primeiro momento que não seria possível.

Você gostaria de ter feito mais leilões? Fizemos quatro leilões em cinco anos e recomendamos o quinto. A ideia da regularidade dos leilões é ótima, endossamos, entendemos que pagamos o preço de cinco anos sem leilões, mas quando fizemos o 12º leilão, em 2013, sentimos o esgotamento do mercado. Em 2014, não tínhamos mais o que ofertar, mas desenhamos um leilão. Em 2015, com os preços baixos, fizemos novo leilão, mas as empresas não se interessaram. Para um período de quatro anos e meio como diretora-geral, quatro leilões e recomendação de um quinto, além das rodadinhas (de áreas marginais), foi de bom tamanho. Agora, cinco anos antes sem leilão… Realmente.

Qual foi sua marca na ANP? Minha marca foi sempre procurar ser justa, mas exigir que tecnicamente as coisas fossem feitas da melhor forma, como aprendi na Petrobras. Não poderia cobrar dessa empresa menos do que ela me ensinou.

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Em algum momento houve embate entre Petrobras e ANP? A agência teve de ocupar um espaço na indústria. Não vou personalizar em uma empresa. Quando houve o acidente com a Chevron (derramamento de óleo), eu também fui acusada de ter sido dura demais. Cobramos o que uma indústria de grande porte, intensiva em capital e com todo acesso à melhor tecnologia do mundo tem para oferecer ao setor e à sociedade.

Quais feitos da sua gestão destacaria? Uma coisa da qual me orgulho muito foi o protagonismo que a agência teve na melhoria da segurança operacional no Brasil. Tivemos também uma atuação que chamou muita atenção que foi a negociação da cessão onerosa (discussão sobre o quanto a Petrobras deveria ressarcir à União por áreas cedidas no pré-sal). Outro momento importante foi a definição da perfuração de poços que geraram as descobertas de Franco e Libra (áreas de pré-sal). Com essa descoberta, obtivemos um bônus de assinatura de 15 bilhões de reais em 2013. Para ter ideia do que foi isso, tivemos de alterar a Guia de Recolhimento da União (GRU), que não permitia pagamento de bilhão. Foi a primeira vez que licitamos ativo de pré-sal.

(Com Estadão Conteúdo)

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