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‘Economia verde é crescimento, erradicação da pobreza e justiça social’

Comissário da União Europeia para o Meio Ambiente diz que a agenda ambiental da Europa privilegia a eficiência no uso de recursos naturais para fazer frente ao aumento do consumo e evitar o colapso global

Por Márcia Régis
Atualizado em 6 Maio 2016, 16h41 - Publicado em 24 mar 2012, 12h26

“Sem ganho de eficiência, em 2030, precisaremos de 40% a mais de água para as nossas necessidades. A população da China hoje é cem vezes maior do que a do Reino Unido durante a Revolução Industrial, e a China alcançará níveis de crescimento em 10 anos que o Reino Unido tardou 100 anos para atingir. Portanto, estamos admitindo um choque de uso de recursos que será mil vezes maior – e isso considerando apenas a classe média da China”

Jan Potocnik é comissário da União Européia para o Meio Ambiente. Responsável pela elaboração da plataforma ambiental do bloco do europeu para a conferência Rio+20, que acontecerá em junho no Rio de Janeiro, o economista esloveno defende a criação de um marco regulatório para o uso eficiente de recursos naturais, envolvendo governos e indústrias. O modelo sugerido é o praticado na Europa com relação à coleta seletiva e reciclagem de resíduos sólidos. Na semana passada, ele participou de um debate organizado pelo ministério do Meio Ambiente para um seleto grupo de 60 convidados, sobre os paradoxos da economia verde. Ao final, concedeu a seguinte entrevista ao site de VEJA:

Qual é sua visão sobre o principal tema da Rio+20, a economia verde?

Economia verde não é uma alternativa para o desenvolvimento sustentável, mas o meio de implementação. Há quem ache que quando falamos em economia verde estamos defendendo uma agenda estabelecida por países ricos que podem se dar ao luxo de considerar mais especialmente o meio ambiente porque já alcançaram alto padrão de vida. Temem que o foco numa economia verde estimulará apenas o pilar ambiental do desenvolvimento sustentável, em detrimento dos outros pilares, social e econômico. Mas economia verde não diz respeito apenas ao “verde”. Trata-se de economia, crescimento, erradicação da pobreza e justiça social também. Por isso os países europeus preferem não utilizar mais a expressão economia verde, trabalhamos hoje os preceitos da eficiência de recursos (resource efficiency).

Por que adotaram este caminho?

Estudos indicam que o mundo terá três bilhões a mais de consumidores de classe média em 2030. É uma ótima notícia. Mas precisaremos triplicar os recursos disponíveis para atendê-los – 140 bilhões de toneladas anualmente – por volta de 2050. A demanda por comida crescerá 70%. E, já hoje, 60% dos ecossistemas que nos suprem esses recursos naturais estão degradados. Sem ganho de eficiência, em 2030, precisaremos de 40% a mais de água para as nossas necessidades. A população da China hoje é cem vezes maior do que a do Reino Unido durante a Revolução Industrial, e a China alcançará níveis de crescimento em 10 anos que o Reino Unido tardou 100 anos para atingir. Portanto, estamos admitindo um choque de uso de recursos que será mil vezes maior – e isso considerando apenas a classe média da China.

Em que se baseia a lógica da eficiência de uso de recursos naturais?

Baseia-se principalmente no incentivo ao aumento da produtividade dos recursos naturais no processo industrial para fins de abertura e manutenção de mercados. Ou seja, empresas e governos teriam que se ajustar a normas de uso sustentável de recursos como água e energia, entre outros. Na universidade, há 30 anos, aprendi que água era uma commodity livre – hoje, não é mais. Nem pode ser. Nessa nova economia, também teremos que controlar as etapas do ciclo de produção industrial. Os consumidores serão estimulados a orientar a decisão de compra de modo a privilegiar produtos fabricados dentro das normas de eficiência de recursos. As empresas terão que mudar.

Teremos que adotar novas atitudes de consumo?

Sim, privilegiando a inovação das empresas e a forma como deverão pensar o design de cada produto e seu modo de produzi-los. É simples: as empresas têm que produzir com menos uso de água, menos energia etc. Os cidadãos devem ter em mente que, neste sentido, a Rio+20 é um desafio comum a todos e uma responsabilidade global.

Observando que os limites dos recursos naturais do planeta ainda não são considerados nos limites orçamentários das empresas, esta economia de transição seria viável para o setor privado?

Estimamos que, em 2050, as oportunidades de negócios globais que dependem da biodiversidade e dos ecossistemas que as sustentam poderão alcançar valores na ordem de 800 milhões de dólares a 2,3 bilhões de dólares por ano. Essa economia de transição poderá abrir novos mercados e gerar benefícios através do lançamento de tecnologias de produção inovadoras ou novos modelos de negócios.

Mas parte do sucesso dessa nova economia também dependerá do cidadão comum, do seu poder na hora da compra. Não é sonho depositar essa responsabilidade na classe média de países emergentes, que possui ainda tantas outras necessidades básicas a serem resolvidas?

Nós precisamos de uma economia de mercado. A transição é inevitável. Três bilhões de pessoas viverão em estado de pobreza em 2030, se seguirmos como estamos hoje. É sonho? Sim, é. Mas é uma necessidade que se torna realidade e temos que encarar os fatos. Não existe varinha de condão para melhorar a situação, existem medidas de mercado.

Como os países europeus estão se preparando para essa transição?

Estamos criando incentivos através de arranjos políticos claros e transparentes, e também articulando parcerias com o setor privado. Vamos criar políticas públicas fortes neste sentido, com legislação.

Os países do G-77, incluindo o Brasil, discordam da posição européia para a Rio+20. Querem acordos com metas menos ambientais e mais socialmente inclusivas, direcionadas para a erradicação da pobreza. O que diria a respeito?

Não corram na mesma direção que nós, europeus, seguimos no passado. Vocês podem repetir nossa história e acabar em um mundo falido de recursos naturais. Mas, a escolha é de vocês. Se olharmos globalmente, veremos que estamos todos no mesmo barco. É preciso inovar.

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